Para o Chief Operating Office (COO) da CIMPOR, a previsibilidade é fundamental para as empresas, pelo que a instabilidade governativa não pode ser encarada como positiva. Ainda assim, Ignácio Goméz explica ao CONSTRUIR a estratégia da empresa para uma operação mais sustentável e que passa por um investimento estimado em 1,4 mil milhões de euros, a aplicar na modernização das fábricas do grupo e na eficiência das operações
A CIMPOR acaba de assinalar 130 anos. Muito se conhece a propósito do passado da empresa em Portugal. E o futuro? Por onde passa o futuro?
O futuro da CIMPOR está alicerçado em três grandes pilares: inovação, sustentabilidade e transformação digital. No próximo ano, a CIMPOR celebra 50 anos de existência, enquanto o seu Centro de Produção de Alhandra assinalou recentemente 130 anos, sendo a fábrica de cimento mais antiga do mundo a operar continuamente no mesmo local. Com tantos anos de história, a empresa continua a dar passos decisivos para consolidar a sua liderança no sector cimenteiro, com investimentos em tecnologia e modernização. A rede privada 5G Standalone instalada nas nossas fábricas permite uma digitalização das operações, tornando os processos mais ágeis e eficientes. Ao mesmo tempo, apostamos em soluções inovadoras para aumentar a competitividade e optimizar a utilização dos recursos.
A CIMPOR está também a modernizar as suas fábricas de Alhandra, Souselas e Loulé com projectos que envolvem um investimento total de 360 milhões de euros em tecnologias de eficiência operacional e energética para responder aos desafios do sector. A CIMPOR, portanto, projecta o futuro com a mesma visão de sempre: inovar para crescer, com um forte compromisso com a criação de valor para as comunidades e para o mercado.
A CIMPOR prevê investir 1,4 mil milhões de euros em Portugal até 2030. Quais vão ser as prioridades deste investimento e, no plano prático, como é que o mercado vai percepcionar os resultados desse investimento?
O nosso investimento de 1,4 mil milhões de euros em Portugal até 2030, que já está em curso desde a aquisição da CIMPOR por parte da TCC Group Holdings em Março do ano passado, espelha o compromisso da CIMPOR com a inovação e o reforço da sua competitividade no sector. A grande prioridade deste investimento é a modernização das infraestruturas e a implementação de novas tecnologias, garantindo operações mais eficientes e preparadas para o futuro. Parte significativa desse montante será alocada à modernização das infraestruturas, ao desenvolvimento de novas tecnologias e à introdução de novos produtos que não só atendem aos requisitos ambientais mais exigentes, mas também asseguram a nossa competitividade no mercado global.
Além disso, a aposta na digitalização e na automação permitirá ganhos significativos de eficiência e tornará as operações mais ágeis e competitivas. A modernização das fábricas, a implementação de novas soluções tecnológicas e o reforço da capacidade produtiva vão traduzir-se numa oferta mais diferenciada e numa resposta mais eficaz às necessidades dos clientes.
O mercado vai perceber os resultados desse investimento através de uma maior eficiência na produção, de produtos mais inovadores e da capacidade da CIMPOR em antecipar tendências e responder aos desafios da indústria, garantindo a sua posição de referência no sector cimenteiro.
Disse, em Dezembro último, que “o investimento é grande e se o Governo não está no mesmo ritmo, teremos um problema no futuro”. A instabilidade que se tem vivido em Portugal, do ponto de vista político, pode comportar riscos para a iniciativa privada? Em que medida?
A instabilidade política nunca é positiva para a iniciativa privada, pois significa que processos ficam parados e que decisões estratégicas podem sofrer atrasos. Para empresas como a CIMPOR, que fazem investimentos de grande escala e longo prazo, a previsibilidade é fundamental. Sempre que há incerteza no panorama político, existe o risco de desaceleração nos projectos e nos investimentos planeados. É importante que, independentemente do contexto político, os processos administrativos e regulatórios continuem a avançar a um ritmo que permita às empresas concretizar os seus planos sem entraves desnecessários.
Muito se discute em torno da sustentabilidade e da pegada carbónica na indústria da Construção de um modo transversal. De que modo está a CIMPOR a responder aos desafios que existem pela frente neste domínio e o que está a ser feito para ir ao encontro do que se espera que seja a neutralidade carbónica?
A abordagem da CIMPOR, no que diz respeito à sustentabilidade e à redução da pegada carbónica, é clara e proactiva, especialmente porque reconhecemos o impacto que a nossa indústria tem nas emissões de CO2. Estamos totalmente comprometidos com a transição para uma economia de baixo carbono e a net zero, um objectivo que nos orienta e que estabelece o horizonte de 2050.
No presente, temos em curso um plano estratégico de descarbonização que envolve várias iniciativas e investimentos. Estas incluem, por exemplo, a substituição de combustíveis fósseis por alternativas mais ecológicas, ou o investimento em infraestruturas de energias renováveis, como as UPACs (Unidades de Produção para Autoconsumo) que já estão operacionais. Estamos também a trabalhar em tecnologias de recuperação de calor residual que visam converter o calor gerado no processo de produção de clínquer em energia eléctrica.
Outra grande aposta da CIMPOR é a produção de materiais com menor pegada de carbono, como as argilas calcinadas, que podem substituir parcialmente o clínquer. Além disso, estamos a investir na inovação e no desenvolvimento de novos produtos que atendam às exigências ambientais do mercado, como o cimento de baixo carbono, e estamos a trabalhar em estreita colaboração com as autoridades e as comunidades locais para garantir que todos os processos de descarbonização sejam implementados de forma eficaz e inclusiva.
A CIMPOR compromete-se a alcançar emissões líquidas zero de gases com efeito de estufa ao longo de toda a cadeia de valor até 2050. Como vai ser feito este percurso até à meta traçada?
A CIMPOR tem um compromisso firme de alcançar a net zero até 2050, e este objectivo, que foi validado pela Science Based Targets initiative (SBTi), será alcançado através de uma combinação de iniciativas estratégicas, investimentos em tecnologias inovadoras e colaboração estreita com toda a nossa cadeia de fornecimento.
A descarbonização da produção é uma das nossas prioridades, com investimentos na substituição de combustíveis fósseis por alternativas mais sustentáveis e na eficiência energética das nossas fábricas. Também estamos a desenvolver produtos de menor pegada carbónica, como os cimentos com materiais alternativos, garantindo soluções mais sustentáveis para o sector da construção, sem comprometer a performance dos nossos materiais.
A transição energética será outro factor essencial, com um aumento significativo da incorporação de energia renovável e de combustíveis alternativos, reduzindo as nossas emissões ao longo da próxima década. Ao longo do percurso, também estamos a trabalhar de forma activa com os nossos fornecedores e parceiros para garantir que toda a nossa cadeia de valor contribua para a meta estipulada. A colaboração com os nossos clientes também será um pilar importante, com o desenvolvimento de soluções de construção sustentáveis que permitam a redução das emissões ao longo do ciclo de vida dos edifícios.
Anunciaram, recentemente, uma parceria com a FIZIX, empresa especializada em soluções que combinam sensores inteligentes e software baseado em inteligência artificial, para a adopção de um sistema de monitorização apoiado em IA que possibilitará detectar falhas nas instalações de produção de cimento antes que estas ocorram. Que necessidades identificaram para avançar com esta parceria? Na prática o que vai ser feito?
A parceria com a FIZIX surge como parte da nossa estratégia contínua de inovação e melhoria das nossas operações. A necessidade que identificámos para avançar com esta colaboração está directamente relacionada com o nosso compromisso em aumentar a eficiência operacional, reduzir o risco de falhas inesperadas nas nossas instalações e, consequentemente, optimizar a produção de cimento de forma mais eficiente.
As nossas fábricas estão sujeitas a uma complexa rede de processos e equipamentos que, se não monitorizados de forma contínua e eficaz, podem levar a interrupções ou falhas que impactam a produção. Sabemos que a manutenção preventiva e a detecção precoce de falhas são cruciais para garantir a continuidade da produção e a redução de custos operacionais. Foi neste contexto que identificámos a FIZIX como um parceiro estratégico, dada a sua expertise em soluções baseadas em inteligência artificial (IA) e sensores inteligentes.
Na prática, o que vamos fazer é implementar um sistema de monitorização avançado que utiliza sensores inteligentes para monitorizar em tempo real o desempenho das nossas instalações e equipamentos. Este sistema, alimentado por IA, será capaz de analisar grandes volumes de dados de forma eficiente, identificar padrões e, o mais importante, prever falhas antes que estas ocorram. Em vez de depender apenas da manutenção reactiva, que é mais custosa e disruptiva, passamos a contar com uma abordagem proactiva, que permite antecipar problemas e agir antes que afectem a produção.
Com esta parceria, vamos equipar as nossas instalações com sensores que irão medir variáveis críticas, como temperatura, pressão e vibração dos equipamentos, e enviar esses dados para uma plataforma centralizada. A inteligência artificial será responsável por analisar esses dados em tempo real, identificando potenciais falhas e notificando os responsáveis antes que estas se tornem um problema sério. Isso não só vai aumentar a confiabilidade dos nossos processos, mas também contribuirá para uma gestão mais eficiente da manutenção, permitindo que as equipas operacionais tomem decisões informadas com base em dados em tempo real.
Este sistema não se limita apenas à detecção de falhas, mas também permitirá uma optimização contínua dos processos. Ao perceber melhor o comportamento dos equipamentos, podemos identificar áreas de melhoria e ajustar os parâmetros operacionais para aumentar a eficiência e reduzir o desperdício.
Além disso, a integração de IA na nossa operação permitirá que a CIMPOR se mantenha na vanguarda da transformação digital na indústria cimenteira, alinhando-se com as melhores práticas de Indústria 4.0, onde a automação, a análise de dados e a inteligência artificial desempenham um papel central.
Uma empresa marcadamente cimenteira, como olha para a industrialização dos processos construtivos e para a “desejada” evolução dos processos de fabrico mais tradicionais?
A CIMPOR olha para a industrialização dos processos construtivos com grande interesse e atenção, pois acreditamos que esta tendência representa uma oportunidade significativa para o sector da construção e para a indústria cimenteira como um todo. A industrialização, nomeadamente a utilização de tecnologias avançadas e a automação, pode trazer uma série de benefícios, como a melhoria da eficiência, redução dos custos de produção e, acima de tudo, a garantia de maior qualidade e previsibilidade nos projectos de construção.
No entanto, para a CIMPOR, a industrialização não é apenas uma tendência passageira, mas uma realidade que já está a moldar o futuro da construção. A utilização de métodos mais modernos de fabrico, como a impressão 3D, o pré-fabricado e a construção modular, está a ser cada vez mais adoptada no sector da construção e irá, sem dúvida, transformar a forma como as obras são realizadas, criando novas exigências para os materiais e soluções que oferecemos. O cimento, como matéria-prima central na construção, precisa de acompanhar esta evolução, com produtos inovadores e mais adaptados aos novos métodos de construção.
A “desejada” evolução dos processos de fabrico mais tradicionais não significa que vamos abandonar a produção de cimento convencional, mas sim que devemos integrar novas tecnologias e processos mais eficientes, como os que estamos a implementar no âmbito da digitalização e da descarbonização. Este processo de evolução passa, por exemplo, pela melhoria das técnicas de produção, pela optimização da utilização de recursos e pela aposta na inovação, como já estamos a fazer.
Além disso, os avanços nos processos construtivos industriais exigem uma estreita colaboração entre a indústria do cimento e o sector da construção, pois as soluções mais inovadoras precisam de ser pensadas e adaptadas em conjunto. A CIMPOR, com a sua longa experiência e presença no mercado, tem um papel fundamental em fornecer produtos e soluções mais adaptáveis às necessidades da indústria da construção no futuro.
Do ponto de vista da industrialização, o cimento continuará a ser a base para as grandes obras de infraestrutura, mas com o avanço das novas tecnologias, estamos a trabalhar para que o cimento também seja mais eficiente e mais bem adaptado às exigências dos métodos de construção mais modernos. O nosso compromisso com a inovação vai ao encontro dessa necessidade de adaptação dos processos construtivos, tornando-os mais industriais e mais eficientes.
Olhamos para a industrialização dos processos construtivos não como uma ameaça, mas como uma evolução natural do sector, na qual a CIMPOR está activamente envolvida, com o objectivo de estar alinhada com as novas necessidades da indústria da construção.