Números do Archi Summit voltam a crescer
O evento que decorreu a 12 e 13 de Julho em Lisboa recebeu mais de 1600 visitantes. Para a organização, o evento está “instalado” na agenda cultural
Ana Rita Sevilha
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Mais de 1600 visitantes em dois dias, 82% dos quais arquitectos e um fluxo superior a 75% de ocupação média nas conferências. Estes são os grandes números da 4ª edição do Archi Summit, que decorreu nos dias 12 e 13 de Julho, no LX Factory, em Lisboa, e que volta a crescer pelo quarto ano consecutivo.
Segundo dados oficiais a que o CONSTRUIR teve acesso, o japonês Junya Ishigami foi o orador que mais curiosidade despertou – o número de pessoas presentes na sua conferência excedia em 35% a capacidade do auditório de cerca de 400 lugares -, mas os debates das manhãs, que tiveram como protagonistas grandes nomes da arquitectura nacional, como Paulo Martins Barata (Promontorio), João Luís Carrilho da Graça ou Tiago Mota Saraiva (ateliermob), também contaram com plateia cheia.
Recorde-se que o evento contou ainda com o lançamento do livro “Architecture of Leisure” do gabinete Promontorio, apresentado por Luís Tavares Pereira no dia 12 de Julho, que, sublinha a organização,” foi outro ponto alto com o auditório completamente cheio mais uma vez”.
Ao CONSTRUIR, a organização sublinha também as entidades do tecido empresarial e do domínio público, como Câmaras Municipais (Lisboa, Vila Nova de Gaia, Figueira da Foz, entre outras), Ordem dos Arquitectos e instituições de ensino, como FAUP e ISCTE, que passaram por o Archi Summit.
Bruno Moreira, responsável por a organização do evento, acredita que o Archi Summit está instalado na agenda cultural. “Chegámos à 4ª edição do Archi Summit com a responsabilidade de trazer conteúdo e experiência para os arquitectos. Tínhamos também o objectivo de fazer passar por o nosso evento mais de 1.500 pessoas para fazer frente às 1.300 do ano passado. Felizmente conseguimos e o espaço do Archi Summit na agenda cultural está instalado! Foi uma organização bem sucedida, num espaço fantástico, que nos deixa muito satisfeitos e com os olhos postos no futuro”.
João Veiga Gomes, arquitecto e participante no evento, destacou “a presença das marcas e
a sua originalidade”, bem como “a forma como interagem com os arquitectos e tornam o evento mais completo. Com as conferências e as restantes, faz com que este seja um evento de referência na arquitectura nacional”.
“Participação pública tem transformado Lisboa”
O diálogo sobre o espaço público, entre a autarquia e as populações, tem transformado a cidade de Lisboa. A ideia foi defendida por Carrilho da Graça na manhã de abertura do Archi Summit, na “mesa redonda” sobre o tema “Ordenamento e Espaço Público”, que contou com Pedro Dinis, director do Departamento de Espaço Público da Câmara Municipal de Lisboa e a moderação de Paula Melâneo.
“É muito interessante a aposta deliberada da Câmara Municipal de Lisboa (CML) na valorização do espaço público”, afirmou Carrilho da Graça, destacando o trabalho que a autarquia tem feito, bem como o interesse e a adesão das pessoas na discussão do tema, nomeadamente o grande número de participantes no debate do Archi Summit.
Carrilho da Graça, responsável pelo projeto de requalificação do Campo das Cebolas e da criação do novo Terminal de Cruzeiros de Lisboa, salientou a importância de conhecer profundamente o local onde se vai intervir, de forma a não desvirtuar a sua história e sua identidade própria. O arquiteto revelou que o maior valor destes projectos “é evidenciar o que já existe, que é fantástico”, sublinhando que “o que mais me agrada no edifício do Terminal é a vista da cobertura quer para Alfama, quer para o Mar da Palha”.
Na sua intervenção, Carrilho da Graça destacou ainda o trabalho de urbanistas e arquitectos paisagistas, que “muito têm contribuído para a cidade”.
Na manhã em que arquitectos e representantes dos órgãos de poder e decisão se juntaram para discutir a cidade, Pedro Dinis, director do Departamento de Espaço Público da Câmara Municipal de Lisboa (CML), salientou que “o espaço público é a nossa sala de estar no exterior”, portanto, confirmou que “faz sentido ouvir quem habita e frequenta os espaços, que é quem sabe o que lá quer ver. Trabalhar o espaço público da cidade é um processo complexo e demorado, mas, de facto, a cidade está diferente”. O responsável deu como exemplo o projecto “Uma praça em cada bairro”, que a CML tem desenvolvido com a e que tem permitido requalificar vários espaços públicos da cidade de Lisboa, partindo da auscultação de associações locais e juntas de freguesia, através da dinamização de sessões abertas aos munícipes, presenciais e online.
Pedro Dinis sublinhou ainda que “a cidade não vive completamente do espaço público, vive também do espaço criado por privados que têm utilização pública”, dando o exemplo das praças, terraços, atravessamentos, etc. “O fazemos é trabalhar com o privado para perceber como é que espaços semipúblicos podem ser integrados com a rede de espaços públicos”, referiu o arquitecto. Uma ideia partilhada por Carrilho da Graça que lembrou que as próprias fachadas dos novos edifícios acabam por modificar o espaço público.
Respondendo a perguntas vindas de uma audiência participativa e atenta ao tema em discussão, Pedro Dinis revelou ainda que 90% das intervenções levadas a cabo pela CML são requalificações de espaço já existente, e, dos restantes 10%, correspondentes a construções novas, várias passam por a transformação de “não espaços” em espaço público, como a praça do Fonte Nova, um projecto da autoria do gabinete de José Adrião, que partiu da “redução do parque de estacionamento, onde havia grande afluência de pessoas”.
O problema e os desafios da habitação
No segundo dia do evento, o afastamento dos habitantes do centro da cidade motivados por a pressão imobiliária, dominaram as atenções da manhã. Paulo Martins Barata (Promontorio) e Tiago Mota Saraiva (ateliermob), moderados por Catarina Almada Negreiros, concluíram que Portugal não tem sabido promover o mercado de arrendamento, que no País é baixíssimo, comparado com o mercado de proprietários.
Focando a cidade de Lisboa e os motivos para o afastamento de habitantes no centro da cidade, como a escalada do valor da propriedade – “67% na última década, 37% só no último ano”, avança a organização do evento -, Paulo Martins Barata realçou que o mercado de arrendamento em Portugal é muito baixo, enquanto existe uma elevada “ownership”. Para o arquitecto, “a legislação não é favorável, e não tem sido ajudada por alterações que não são adequadas à realidade”. Contudo, Paulo Martins Barata defende que “este não é um problema exclusivo de Lisboa, é comum a várias cidades no mundo – o congelamento das rendas acontecia também no Bronx, por exemplo, em Nova Iorque –, mas muitas delas souberam identificar os problemas e estão a lidar com eles há mais tempo, conseguindo evoluir de forma mais sustentada”. Para Paulo Martins Barata, “estamos a fazer em 4 anos o que deveríamos ter feito em 20, por falta de coragem política”.
Já Tiago Mota Saraiva defendeu que ao longo de muitos anos o Estado incentivou o endividamento das famílias, através do recurso à banca para aquisição de habitação, desvalorizando-se assim o arrendamento. “Entre 1987 e 2011, 75% dos gastos do Estado em habitação foram em bonificação de créditos bancários, o que bem demonstra a direcção das políticas de habitação. Esta foi, de facto, a sustentação dos bancos durante muitos anos”, referiu Tiago Mota Saraiva, lembrando que, “para quem queria uma casa, arrendar ficava muito mais caro”.
Para o arquitecto, “afastar as pessoas da cidade em benefício de negócios mais proveitosos tem sido comum”. Tiago Mota Saraiva lembrou que “é possível para um proprietário em período de renegociação de contrato cessar um compromisso quando tem um novo inquilino que paga mais, e isso limita o direito das pessoas à habitação e, neste caso, à habitação no centro da cidade, e a habitação é um direito fundamental”. Paulo Martins Barata, por seu lado, defende que o direito à propriedade tem de ser respeitado, já que um proprietário tem de poder gerir o seu património como um investimento, que lhe dê o rendimento que pretende, só assim “poderemos ser um país amigo do investimento e dos investidores”. O direito à propriedade pode chocar com o direito à habitação? Sim, mas aí há que fazer escolhas, defendem, e essas escolhas passam por decisões ao nível das políticas de habitação.
A aquisição de propriedades para arrendar e com isso ter rendimento é uma política antiga, seguida por muitos investidores já desde o início do século passado, por exemplo com a construção de grandes edifícios que ocupavam quarteirões inteiros nas Avenidas Novas, em Lisboa. Durante muitos anos foram os portugueses que fizeram o mercado assim, construindo para vender, e não para arrendar, recordou Tiago Mota Saraiva, por isso, constatou, estamos muito atrás de outras cidades em relação às políticas de habitação, e de arrendamento em concreto. No caso de Lisboa, o arquitecto salienta três factores que conduziram à actual situação: a Lei do Alojamento, a Lei das Rendas de 2012 e o PDM de Lisboa.
Sublinhando que o discurso não é contra o turismo, os arquitectos explicam que os próprios turistas portugueses procuram nas outras cidades o que turistas estrangeiros procuram aqui: ficar no centro das cidades, viver e experienciar as cidades. Por isso, salienta Tiago Mota Saraiva, “quando se pensa a organização da oferta turística, deve tentar promover-se a deslocalização de turistas para outras artérias, criando novos espaços turísticos, como museus, etc., noutras zonas da cidade, que não apenas nos centros históricos”.
Paulo Martins Barata, Tiago Mota Saraiva e Catarina Almada Negreiros. Concordaram que se trata de um processo cíclico. “As pessoas vão e vêm, e se agora construímos hotéis, no futuro poderemos estar a fazer a reconversão de hotéis em habitação”. Concluiu Tiago Mota Saraiva.