Os “millennials” vão mudar os espaços laborais até 2020
Em entrevista ao CONSTRUIR, Pedro Branco Ló, presidente da APFM e, também ele, um Facility Manager, dá-nos conta dos principais desafios: uma gestão inteligente e sustentável através do recurso à Internet of Things, mas também mais humanizada. 2018 deverá trazer também a primeira certificação profissional de FM
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Criada em 2006, a Associação Portuguesa de Facility Management (APFM) surgiu com o objectivo de divulgar as melhores práticas ao nível da gestão integrada de edifícios e das organizações. Até 2020 mais de 50% da força de trabalho deverão ser “millennials”, ou seja, nativos do digital, o que irá implicar grandes mudanças em termos dos espaços laborais. Neste sentido, o Facility Management terá uma grande responsabilidade na optimização destes espaços.
O que é o Facility Management?
A função do Facility Management (FM) tem como propósito servir as pessoas e os processos de negócio (core business) nas organizações. O FM tem a sua ação centrada na gestão de edifícios e instalações, na sua condução e exploração, enquanto suporte das atividades “core”, em condições funcionais e sustentáveis, surgindo assim como uma disciplina importantíssima no âmbito da gestão empresarial e uma área estratégica no seio das organizações.
A evolução dos negócios a nível internacional e a emergência das novas formas de trabalho, vai no sentido de organizar o espaço e ambientes de trabalho tendo em vista a optimização do uso, a racionalização de custos associados e o aumento da produtividade dos colaboradores.
As organizações devem, hoje mais do que nunca, questionar onde podem ser aplicadas melhorias e procurar os profissionais certos para as ajudar nesse diagnóstico. Este profissional tem de ser um bom “ouvinte” e um bom comunicador, ou seja, “a people ´s person”.
Os espaços e ambientes de trabalho estão a mudar e os colaboradores estão cada vez mais exigentes. Neste cenário, os empregadores não podem descurar a ocupação do espaço e devem procurar ajuda profissional para corresponder aos requisitos da força de trabalho.
Os Facility Managers (FMers) têm ainda de ter a sensibilidade para as questões tecnológicas e procurar as soluções que lhes permitam implementar processos de controlo, medir variáveis e criar indicadores de performance para monitorar e avaliar níveis de serviço contratados para a garantir a funcionalidade do espaço e das instalações.
Há quantos anos existe a Associação?
A APFM foi fundada em 2006, por um pequeno grupo de FMers, do qual me orgulho de fazer parte, que sentiu a necessidade de tornar a profissão reconhecida de divulgar as melhores práticas da actividade em articulação com a Euro FM a organização europeia que congrega as associações nacionais, as instituições académicas e os profissionais de FM. A Associação, por sua vez, integra empresas e profissionais de diferentes áreas, desde fabricantes de elevadores, a empresas de telecomunicações e de energia, passando pelo mobiliário de escritórios e pela gestão de serviços, por exemplo.
Sendo todas tão diversas, pode-se perguntar o que as une sob a “umbrela” do Facility Management e como é que a associação as ajuda na criação de sinergias?
Exactamente pela diversidade dentro da associação é que há muito a ganhar e muitas sinergias a serem feitas. O que une os profissionais é o facto de todos serem Facility Managers, uns trabalham para organizações ocupantes, outros para prestadores, outros são consultores, uns têm funções mais executivas outros funções mais operativas. Todos têm experiências e desafios diferentes e a Associação procura colocá-los o máximo possível em contacto entre si, seja em “workshops”, seja em conferências, seja em momentos de “networking”.
Mas é também onde ainda sentimos que temos muito por fazer, na criação de redes de profissionais que possam colaborar por projectos. Mesmo as grandes empresas prestadoras de serviços por vezes sentem a necessidade de colaborar com um profissional especializado na medida em que existem domínios de conhecimento muito específicos e valorosos.
Também na criação de sinergias entre o mundo académico e as empresas é uma área onde estamos a dedicar um grande esforço para que haja mais investigação aplicada no FM e se converta mais conhecimento em oportunidades e em riqueza para a economia, em geral.
Sendo um pouco mais objectivo direi que as vantagens em reunir todos os agentes no mesmo Fórum do FM se justifica por várias vertentes: pela contratação de serviços com base em níveis de serviço acordados, SLA’s, controlados por meio de indicadores, KPI’s, melhorados continuamente; pela integração de serviços de “Facilities”, garantindo o funcionamento, conforto e segurança no trabalho; pela conjugação do processo de contratação com o processo de avaliação de desempenho dos prestadores; e pela garantia de conformidade com referenciais de qualidade, níveis de serviço e racionalização de custos – “benchmarking”.
Para gerir a contratação de todos os serviços e monitorar o desempenho dos prestadores, é assim indispensável a figura do FMer que assegura o adequado controlo dos serviços e a funcionalidade das instalações. É também o FMer que tem a responsabilidade de traduzir a estratégia de FM das organizações em KPI’s.
Estão também presentes no Brasil e em Angola. De que forma?
Nos anos mais recentes temos desenvolvido laços no sentido de criar pontes intercontinentais, para o Brasil e Angola, através de actividades partilhadas de informação e divulgação do FM, A APFM tem desenvolvido parcerias com as congéneres de países de língua portuguesa, de Angola, AAMGA (Associação Angolana de Manutenção e Gestão de Activos), promovendo a divulgação e a formação em FM, com a ABRAFAC (Associação Brasileira de Facilities), usando as plataformas digitais para distribuição de conteúdo e de formação através de “webinares” que atravessam o Atlântico e são transmitidos simultaneamente em Portugal e no Brasil. Relativamente a Angola já firmámos um Acordo de Cooperação com a AAMGA para a divulgação da Gestão da Manutenção e do FM, como fatores decisivos para o aumento da produtividade e competitividade das empresas, promovendo a partilha de conhecimento e de boas práticas entre os respectivos associados, profissionais e empresas. Temos planeado também a realização de eventos de organização conjunta e a formação profissional, em parceria com estas organizações congéneres, em Angola e no Brasil.
Apostam na formação e conferências o que acaba também por ser uma forma de “educar” as empresas. O que mudou nos últimos anos?
O que está em mudança? Muita coisa. Primeiro: as mentalidades. Acreditamos que finalmente existe um movimento global que coloca as pessoas no centro da questão, o que faz ‘nascer’ espaços mais humanizados e eficientes, onde os colaboradores podem ser mais felizes, mais produtivos e mais “engaged”. O foco passa a estar na experiência do utilizador (trabalhador) e o impacto do espaço nas actividades, e não apenas na qualidade da solução, ou mesmo no seu custo. Essas são questões que só devem ser endereçadas no momento seguinte de execução.
Segundo: a tecnologia. Não só o “Space Planning” passa a estar integrado na cadeia de valor de gestão do edifício, como é agora simulado logo no momento em que se está a conceber e desenhar, ou a reabilitar o espaço. Isto permite identificar e eliminar anomalias que antes apenas eram detectadas quando o edifício era ocupado e começava a ser utilizado, sendo depois já tarde demais e/ou demasiado caro se corrigir.
Ainda relativamente à tecnologia, importa também referir que hoje é possível comunicar com os edifícios em tempo real, retirar de vários sistemas e sensores imensos dados que, quando bem tratados, permitem informar tanto os gestores dos edifícios como os seus utilizadores. Dando aos primeiros a capacidade de tomar decisões mais fundamentadas em benefício do conforto dos segundos e, ao mesmo tempo, identificar desperdícios e ineficiências que apenas provocam gastos desnecessários.
Quais os atuais desafios?
A Associação tem um percurso de dez anos ao longo dos quais ultrapassou muitas barreiras para divulgar a atividade e promover o reconhecimento dos seus profissionais. Neste caminho podemos focar a área da Formação, que é já uma realidade com cursos de formação de nível académico e de especialização profissional, com destaque para a 3.ª edição da Pós-graduação no ISEL.
Numa visão que pretende abranger não só a dinamização, como também a uniformização do conhecimento do FM em Portugal, em 2017, a Associação orgulha-se de ter lançado a Academia FM, uma “escola” para profissionais do Facility Management. Além dos cursos que já estão em actividade, a APFM aproveita desta forma para lançar um curso modular específico, abordando cada área/disciplina do corpo de conhecimento comum da formação em FM.
Na área dos serviços de valor acrescentado aos associados, publicou-se a segunda edição do estudo sobre o mercado do FM em Portugal – FM Intelligence 2017 – no qual se divulgam os custos das maiores empresas consumidoras de “Fornecimentos e Serviços Externos” e o valor do mercado de FM em Portugal, estando em preparação o FM Intelligence 2018.
Em Outubro de 2017 concluímos um protocolo com o IPQ, assumindo a responsabilidade de organismo de normalização sectorial. Estamos também representados nas comissões técnicas de normalização Europeia e Internacional que elaboram as normas da actividade. As EN 15.221 são a referência do FM, e a partir deste ano contamos com as ISO 41.0xx, que nos guiam na contratação estratégica de serviços, estando em fase de conclusão o FM System Standard, que irá projetar o FM para o reconhecimento internacional da atividade.
“Facility Management – Facilities Management – FM – organizational function which integrates people, place and process within the built environment with the purpose of improving the quality of life of people and the productivity of the core business (ISO41011:2017)”
É certo que o Facility Management dá um salto qualitativo na percepção dos intervenientes no FM ao passar a ter uma norma ISO e onde – inequivocamente – se coloca a tónica na sua vertente estratégica.
Mas mais importante, é colocar-se a “quality of life” e a “productivity of the core business” como o propósito do FM, aumentando assim o valor acrescentado da profissão de Facility Manager.
Deste modo podemos olhar para 2018 como um novo ano de iniciativas e dar o próximo passo, na criação da primeira certificação profissional de FM, ainda para o primeiro semestre de 2018, para que os profissionais formados obtenham um reconhecimento válido a nível nacional e internacional. Este é o caminho do FM em Portugal!
De que forma a “Internet of Things” (IoT) pode ajudar?
Num mundo altamente tecnológico, espera-se, acima de tudo, maior simplicidade, eficácia e automatismos. Neste sentido, espera-se que o FM integre em si próprio uma série de serviços que permita a utilização adequada e optimizada do espaço e instalações. O FM ainda está numa fase onde os processos não são integrados, muitas das informações ainda estão em papel e as equipas ainda são pouco qualificadas. O caminho, num futuro próximo, passa pela integração de processos otimizados, “sensorização/IoT”, “smart tagging” e ainda utilização da inteligência artificial em benefício dos utilizadores finais dos serviços. Assim, serão necessários profissionais mais qualificados para executar tarefas de elevado valor acrescentado, por sua vez, mais disponíveis para a gestão e optimização de recursos e activos, estando menos preocupados com a justificação da falha e mais com a produção de informação de qualidade. A verdadeira humanização do FM passa por decisores que potenciem o conhecimento e a inteligência que têm, colocando-as ao serviço das organizações com vista à gestão inteligente do espaço, instalações e recursos.
Principais tendências para os próximos anos?
Como já referi atrás, o FM caminha no sentido da focalização no serviço ao utilizador/ ocupante do Espaço – “Employee Centered” -, que se traduz na experiência total do cliente e na satisfação das condições necessárias em cada momento, no seu dia-a-dia.
Continuamos a ver as Organizações, públicas e privadas, a tomar decisões de mudança e de centralização de serviços, em regime de emergência, sem o fundamental planeamento, com prazos risíveis, que conduzem à construção de espaços “bonitos” mas inadequados para as atividades e disfuncionais, que contrariam os princípios da produtividade e de eficiência de exploração.
As Organizações que estão a pensar o Espaço para a próxima década têm em linha de conta que 50% dos seus colaboradores serão “millennials”, ou seja, nativos digitais. Em 2020 estes representarão 50% da força de trabalho no mundo inteiro, e os nativos digitais povoarão o mercado de forma incontestável. Este desafio que tem as pessoas como principal catalisador será um dos principais agentes transformadores dos espaços laborais.
Pode-se assim dizer que há uma nova cultura organizacional que está a emergir.
Em particular para o sector da construção e do imobiliário como pode aplicar-se?
Da necessidade de eficiência das organizações surge a procura de informação clara e concisa sobre os custos de exploração dos edifícios e de indicadores de referência da performance das instalações e dos serviços associados.
Começaria por dizer que estamos a viver um período de grande mudança no setor imobiliário de escritórios, sendo difícil de prever a sua evolução nos anos mais próximos, em Portugal. Os gestores de ativos, na determinação das rendas em função das variáveis de mercado, olham para a componente da avaliação imobiliária mas não devem esquecer-se de que o custo dos serviços associados aos edifícios são decisivos para se conseguir arrendar, ou não, um determinado Espaço.
Também por esta razão a APFM promoveu a tradução do guia de referência do mercado internacional para a contabilização dos Custos de Ocupação das empresas – Global Estate Measurement Code for Occupiers, conhecido como GEM Code – Código Global de Medição do Desempenho de Imóveis, para ocupantes. Esta ferramenta permite a otimização dos indicadores de uma Organização, que assim se pode comparar com as organizações congéneres, nacionais e internacionais, e fazer o adequado Benchmarking.
Que ganhos pode uma empresa ter com uma melhor gestão do seu edifício?
Em termos de contexto na realidade do país, verifica-se que no atual período recessivo que se iniciou em 2009, os empresários procuraram melhorias efetivas e rápidas nos resultados operacionais. Isto levou a que as práticas de contratação de serviços de Facilities fossem normalmente lideradas pelo critério preço e todos os outros fatores de âmbito e qualidade fossem completamente secundarizados. Isto foi prejudicial tanto para quem presta serviços como para o Cliente. Em relação aos prestadores coloca-os a todos no mesmo “cesto”, independentemente da eficiência ou qualidade do serviço entregue, e em particular quando não há indicadores que evidenciem as diferenças de desempenho entre si. As análises são feitas de forma pontual no momento da compra, esquecendo-se o impacto nas instalações, bem como, nos ocupantes. Em consequência da falta de critérios, a deterioração acelerada dos ativos ou a fuga de colaboradores-chave é algo frequente, quando o Espaço, o conforto e segurança dos utilizadores não recebem a atenção devida e se coloca o foco em aparentes reduções de curto prazo.
É da análise dos interesses combinados do binómio Ocupante-Proprietário, que se potencia a gestão de edifícios de forma profissionalizada, na procura de resultados operacionais e de poupanças duradouras nos custos de exploração dos imóveis – custos com rendas e serviços associados à ocupação.
Podemos dar o exemplo da área utilizável por colaborador – m2 por colaborador – quanto maior é este rácio, mais cara se torna a operação. Se lhe disser que o custo de um posto de trabalho pode variar entre os 3.000 e mais de 6.000 euros anuais, tem-se uma ideia do nível de poupança que é possível alcançar com a função de FM bem organizada, medida e controlada continuamente.
Quais os sectores que mais recorrem a este tipo de serviços?
Os FMers são normalmente contratados pelas entidades que utilizam os espaços para fazer desenvolver o seu negócio: as empresas de serviços, os bancos, as empresas de telecomunicações, os hotéis, os hospitais, os aeroportos, etc. Mas a forma como as empresas gerem os seus ativos faz como que possam existir outros modelos: desde a subcontratação do FMer ao nível da gestão até empresas que autonomizam os seus departamentos de FM e lhes criam contas de resultados.
No primeiro caso, é normal um único colaborador gerir ativos em dezenas de países, com equipas e gestores de FM subcontratados em cada geografia. No segundo caso, esses departamentos são inclusivamente responsáveis por cobrar rendas às diversas unidades de negócio do próprio grupo, ou mesmo a empresas externas que eventualmente ocupem espaços ou edifícios do portfolio dessa empresa. Ou seja, o modelo de contratação pode variar muito em função das políticas de subcontratação e de gestão dos ativo que um determinado conselho de administração.
Hoje a gestão de topo está sensibilizada para os Custos de Ocupação e para a eficiência do uso dos espaços, fator que tem contribuído para reconhecer o valor que o FM pode acrescentar às Organizações, a nível técnico, económico e estratégico, na definição das políticas de FM.
O que o FM trouxe de novo foi a consciência de que o Espaço e ambientes de trabalho tinham de ser vistos de forma integrada entre as pessoas e os processos, e não como silos onde os vários serviços são geridos de forma estanque. Aliás, esta visão holística de integração é como que uma filosofia de vida para o FMer, assegurando a ligação entre os edifícios e os seus ocupantes.