Rita Gomes, vencedora do Prémio Europeu de Energia Sustentável ‘ 24
“Seenergy” cria mobiliário que dá energia
A “Seenergy” utiliza células solares sensibilizadas por corantes que imitam o processo de fotossíntese nas planas, convertendo a luz em electricidade. A tecnologia, não sendo nova, é agora usada em mobiliário. Ainda em fase de protótipo, o objectivo é chegar ao mercado dentro de um ano, assim as parcerias com a indústria se concretizem
Manuela Sousa Guerreiro
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A jovem arquitecta portuguesa Rita Gomes venceu o Prémio Europeu de Energia Sustentável 2024, na categoria de “Mulher na Energia” com o trabalho desenvolvido pela “sua” Seenergy. Criada há cerca de um ano a start-up assumiu o desafio de desenvolver, em conjunto com outros parceiros, entre eles a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, (FEUP) uma gama de mobiliário, económico e ecológico, com capacidade para fazer o aproveitamento e o armazenamento da energia solar.
A investigação tem por base as “Dye-Sensitized Solar Cells”, células solares sensibilizadas por corantes artificiais, uma tecnologia proposta pela primeira vez em 1991, pelo químico suíço Michael Grätzel, e que, desde então, tem vindo a ser desenvolvida por vários investidores um pouco por todo o mundo, incluindo Portugal. Ao longo da última década uma equipa de investigação da FAUP, em conjunto com vários grupos empresariais, tem vindo a trabalhar nestas células, resolvendo alguns dos seus problemas associados a uma maior utilização pela indústria – como o tempo de vida e os custos. Deste trabalho resulta mais de uma mão cheia de patentes já desenvolvidas.
A linha de investigação proposta pela Seenergy pretende agora trazer esta tecnologia para “dentro de casa”, com a sua incorporação em peças de mobiliário que dão “energia”.
“Como arquitecta sempre procurei integrar soluções de energia renovável no dia a dia, no quotidiano, não apenas funcionalmente, mas também com esta versão estética que traz o design. A criação da “Seenergy” representa o culminar desta minha experiência e o compromisso em criar estas soluções de design sustentável que integram um sistema de energia renovável em mobiliário decorativo e em peças de arte”
Que percurso leva a arquitecta a enveredar para um projecto de investigação desta natureza?
A minha área é arquitectura e no trabalho que tenho desenvolvido quer individualmente que em colaboração. Esta crescente preocupação com a construção sustentável aliada às políticas ambientais levou-me a explorar mais o potencial das energias renováveis fora dos limites tradicionais. Como arquitecta sempre procurei integrar soluções de energia renovável no dia a dia, no quotidiano, não apenas funcionalmente, mas também com esta versão estética que traz o design. A criação da “Seenergy” representa o culminar desta minha experiência e o compromisso em criar estas soluções de design sustentável que integram um sistema de energia renovável em mobiliário decorativo e em peças de arte.
Qual a tecnologia que é aqui usada?
Comecei por explorar a tecnologia das células solares sensibilizadas por corante, que ao contrário dos vulgares painéis solares são umas células que ao nível de produção são mais sustentáveis, permitem a utilização da cor e permitem criar um layout e uma imagem personalizável. Ou seja, os painéis podem assumir qualquer forma. Esta tecnologia funciona como o processo da fotossíntese das plantas, ou seja, absorve a luz solar, que é convertida em energia para uma bateria que está integrada na peça de mobiliário e esta energia pode ser revertida a electricidade.
Os painéis solares funcionam com luz solar, mas o mobiliário está dentro de casa…
Esta tecnologia tem a capacidade de ser eficiente também com incidência indirecta solar, a luz que entra pela janela de casa, para além de absorver também a luz artificial e a converter em electricidade, ou seja, há aqui um ciclo quase de renovação e aproveitamento da energia que temos dentro de casa.
Esta tecnologia já existe e já está a ser utilizada?
A tecnologia existe, foi desenvolvida Michael Grätzel e eu cruzei-me com ela na Suíça, porque vi a sua utilização na fachada de um edifício. Pesquisei o seu potencial, porque gostei muito da questão apelativa do design, percebi que ela também funciona dentro de casa. E a ideia aqui era tentar que a energia e a sustentabilidade fossem acessíveis a qualquer pessoa. Daí começar por peças pequenas que qualquer pessoa pode comprar e ter em casa e sentir que está a contribuir para reduzir a camada de carbono.
Próximo passo: Chegar ao mercado
Que peças é que já fazem parte do seu portfólio?
Esta tecnologia existe, mas ainda não é comercializada. Trabalho em colaboração com uma equipa de investigação da Universidade do Porto, engenheiros electrotécnicos da FEUP, e eles desenvolvem a tecnologia e eu desenho as peças de mobiliário e encontramos aqui uma simbiose de conseguir incluir a tecnologia dentro do mobiliário.
A empresa foi criada o ano passado neste momento estamos em fase de protótipos, estamos a criar uma mesa de cabeceira que tem a capacidade para carregar um relógio digital pela superfície. Estamos a estudar a questão dos custos e a fazer os testes de eficiência, e acreditamos que para o ano já vamos conseguir entrar no mercado e a ideia é depois termos secretárias para escritório, que como a superfície do painel será maior terá capacidade para carregar um telemóvel ou o próprio computador. Estamos ainda em fase de protótipo, mas acreditamos que vamos entrar no mercado no próximo ano.
“Trabalho em colaboração com uma equipa de investigação da Universidade do Porto, engenheiros electrotécnicos da FEUP, e eles desenvolvem a tecnologia e eu desenho as peças de mobiliário e encontramos aqui uma simbiose de conseguir incluir a tecnologia dentro do mobiliário. A empresa foi criada o ano passado neste momento estamos em fase de protótipos, estamos a criar uma mesa de cabeceira que tem a capacidade para carregar um relógio digital pela superfície”
Qual o próximo passo?
Estamos a contactar empresas de mobiliário que consigam produzir e fabricar estas peças. Quanto mais estandardizada for a produção mais acessíveis as peças serão. Acreditamos que esta tecnologia tem muito potencial, basta pensar na sua utilização em quadros, peças de arte ou outro mobiliário que temos em casa. Estamos também a desenvolver contactos com autarquias que estão interessadas na incorporação desta tecnologia no mobiliário urbano.
A atribuição do Prémio Europeu de Energia pode acelerar as próximas etapas? O que é que ele representa para si?
Este prémio veio validar que estamos no caminho certo. Combina criatividade sustentabilidade e inclusão que são três pontos que a União Europeia defende muito e valoriza. Simultaneamente como o prémio atribuído foi na categoria “Mulheres na Energia” tem o benefício de apoiar a igualdade de oportunidades no sector e no meio empresarial. Ou seja, tem um papel transformador face aos estereótipos existentes em relação ao papel da mulher e ao contributo que estas trazem: maior empatia, têm outra forma crítica, outra forma de pensar estes temas e acho que este prémio vai apoiar essa igualdade de oportunidades. Para além de criar, pela sua visibilidade, novas possibilidades de atrair investimento e pessoas que se interessam por estes temas, podendo dar lugar a novas parcerias, que é a fase em que estamos.