João Duarte, director executivo da APEB
Como lidar com o fim das cinzas volantes no betão
O Governo fixou a data de 2030 para terminar com o uso de carvão para a produção de energia e é muito provável que as centrais termoelétricas sejam convertidas antes […]
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O Governo fixou a data de 2030 para terminar com o uso de carvão para a produção de energia e é muito provável que as centrais termoelétricas sejam convertidas antes da data limite. Do ponto de vista ambiental é bom e Portugal entende esta como uma das medidas que permitirão atingir as metas de redução das emissões de gases com efeito de estufa definidas em Paris. Porém, a decisão representa um revés importante: com o fim da energia a partir do carvão, termina a disponibilidade de cinzas volantes e a indústria do betão pronto perde este resíduo para o seu processo produtivo.
O acordo de Paris, celebrado no seio da ONU, em 12 de dezembro de 2015, visa alcançar a descarbonização das economias mundiais e limitar o aumento da temperatura média global em menos de 2° C até 2050. Para atingir as metas aprovadas é necessário adotar medidas, tais como aumentar o investimento em energias renováveis e acabar com a produção de energia com base no carvão.
As cinzas volantes foram consideradas durante muito tempo como um resíduo industrial das centrais termoelétricas à base de carvão. A sua valorização só se verificou na última década do século XX enquanto material constituinte do betão. Desde então, a incorporação de cinzas volantes no betão tornou-se essencial para melhorar a durabilidade das estruturas de betão armado sob determinadas ações ambientais, nomeadamente os ambientes com cloretos, que atacam as armaduras, ou com compostos químicos que atacam o betão. A incorporação de cinzas volantes permite ainda reduzir o calor de hidratação do betão, fundamental em obras com grandes volumes de betão, tais como as barragens.
A utilização das cinzas volantes em Portugal, como adição do betão, está atualmente regulada pela especificação E 464 do LNEC. Esta especificação permite combinar as cinzas volantes com um cimento tipo CEM I ou CEM II/A para constituir o ligante. O resultado prático é a substituição de parte do cimento pelas cinzas volantes. Adicionalmente, para as classes de exposição ambiental XS (ataque por cloretos com origem no mar), XD (ataque por cloretos de outras origens) ou XA (ataque químico), a especificação E 464 permite reduzir a dosagem mínima de ligante.
Classes de exposição | Sem cinzas volantes | Com cinzas volantes | |||||
Mínima dosagem de ligante | Mínima classe de resistência | Mínima dosagem de ligante | Mínima classe de resistência | ||||
Ataque por cloretos | XS1, XD1, XS2 e XD2 | 360 kg/m3 | C40/50 | 320 kg/m3 | C30/37 | ||
XS3 e XD3 | 380 kg/m3 | C50/60 | 340 kg/m3 | C35/45 | |||
Ataque químico | XA1 | 340 kg/m3 | C35/45 | 320 kg/m3 | C30/37 | ||
XA2 | 360 kg/m3 | C40/50 | 340 kg/m3 | C35/45 | |||
XA3 | 380 kg/m3 | C40/50 | 360 kg/m3 | C35/45 | |||
Nota: Prescrições da Especificação E 464 para estruturas com uma vida útil de 50 anos.
Com o fim das cinzas volantes o setor do betão pronto vai mudar uma vez que não há atualmente um produto substituto para as cinzas volantes. Por isso, o betão vai ter de ser fabricado apenas com um dos tipos de cimentos disponíveis: CEM I ou CEM II/A. Isso vai refletir-se num aumento do custo de fabrico do betão, uma vez que o ligante passa a ser constituído apenas pelo cimento e é necessária uma maior quantidade.
As empresas de betão pronto e os seus clientes vão ter de se habituar a dar mais relevância à classe de exposição ambiental do que à classe de resistência do betão. Contudo, o impacto mais importante é para os projetistas de betão armado. Ao considerar uma classe de resistência superior no dimensionamento estrutural, o projetista assegura não só a estabilidade e a durabilidade, como também a economia da estrutura de betão armado.
O que fazer enquanto os novos projetos não aparecem?
Atualmente, já se sente a carência das cinzas volantes no mercado. Neste ano, Portugal registou um período recorde de 19 dias consecutivos sem energia produzida a partir do carvão. Só a central termoelétrica de Sines esteve parada 33 dias consecutivos. Em termos ambientais, é muito bom. Contudo, reflete-se diretamente na (in)disponibilidade de cinzas volantes para o betão.
Nos dias em que não há cinzas volantes no mercado, há determinados betões que as empresas de betão pronto deixam de poder fabricar, principalmente nas obras em que a estrutura vai estar sujeita ao ataque por cloretos ou ao ataque químico. Isto porque as estruturas que agora estão em execução foram, na sua maioria, projetadas há já algum tempo, num momento em que ainda não se sentia a falta das cinzas volantes. Por esta razão, o dimensionamento partiu de uma classe de resistência mais baixa.
Vejamos o exemplo de um edifício em construção na orla costeira. A estrutura vai estar sujeita a um ambiente em que o ar contém sais marinhos, o que corresponde à classe de exposição XS1. A classe de resistência especificada para o betão é C30/37, o que é apenas possível caso o betão incorpore cinzas volantes. Uma vez iniciada, a obra não pode parar por causa da falta de cinzas volantes. Porém, para que os trabalhos prossigam, é necessário utilizar um betão fabricado só com cimento e com uma classe de resistência superior – C40/50 – para garantir a durabilidade pretendida para a estrutura. Contudo, como o projeto não teve em conta o incremento na resistência do betão, perde-se o potencial ganho económico.
As empresas de betão pronto não podem garantir o fornecimento de betão com cinzas volantes quando não têm controlo sobre a disponibilidade de cinzas volantes no mercado. No entanto, podem encontrar soluções para que as obras possam continuar. As empresas de betão pronto têm capacidade para entregar betão sem cinzas volantes que garante a estabilidade e a durabilidade das obras, qualquer que seja a classe de exposição ambiental aplicável. Contudo, a opção por continuar ou parar com a obra permanece na empresa de construção.
NOTA: O CONSTRUIR manteve a grafia original do artigo