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    Opinião

    Depois do Título Único Ambiental, para quando um Título Único da Energia?

    “Não é justificável que, em 2024, uma parte significativa da informação (…) ocorra ainda fora de um sistema centralizado de informação digital. O resultado prático desta inércia do legislador é arcaico, com muitas das licenças (…) a serem disponibilizadas sob a forma de cópias ou digitalizações

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    Depois do Título Único Ambiental, para quando um Título Único da Energia?

    “Não é justificável que, em 2024, uma parte significativa da informação (…) ocorra ainda fora de um sistema centralizado de informação digital. O resultado prático desta inércia do legislador é arcaico, com muitas das licenças (…) a serem disponibilizadas sob a forma de cópias ou digitalizações

    Sobre o autor
    Paulo Simões Ramos

    Há cerca de 10 anos, o Governo anunciava a criação do Licenciamento Único Ambiental e o consequente Título Único Ambiental (TUA), tomando um importante passo rumo à digitalização das interações entre a Administração Pública e os particulares. O objetivo era simples e prometedor: integrar, num único documento, as obrigações resultantes dos dez regimes jurídicos mais relevantes em matéria ambiental, permitindo assim o mapeamento do quadro regulatório ambiental de um determinado estabelecimento, operação ou projeto.

    Cerca de uma década depois, são várias as ilações que tanto operadores privados como entidades públicas podem retirar da experiência com os TUA. Por facilidade, destacamos duas. Por um lado, a consolidação de informação num único título traz óbvias vantagens tanto para o seu detentor como para quem o fiscaliza. A segurança jurídica associada à desburocratização assume particular relevância no compliance ambiental, atenta a densidade e complexidade do normativo que lhe está associado. Por outro, o TUA não pode ser encarado como um mero repositório de informação. Não são raras as situações nas quais os TUA se tornam instrumentos de difícil navegação porque a informação que deles consta é excessivamente técnica e sem aparente critério, o que derrota o propósito da sua existência.

    É precisamente com base nestas lessons learned que se impõe o alargamento dos títulos únicos a outros setores regulados, particularmente àqueles que têm sido, nos últimos anos, forte aposta do poder político na atração de investimento. O setor energético é, pela sua natureza, o candidato preeminente. A visibilidade que Portugal tem ganho como país na vanguarda da produção de energia renovável deve necessariamente ser acompanhada pela implementação de mecanismos que proporcionem aos investidores a confiança necessária para a realização dos seus investimentos. A meu ver, são três os argumentos que concorrem para este imperativo: Primeiro, a intrincada complexidade da moldura jurídica relativa à produção de energia renovável em Portugal, que, desde a sua criação no final da década de 80, foi sofrendo sucessivas alterações que tornam a sua interpretação uma tarefa quase hercúlea. Porque à DGEG é amiúde atribuído o infeliz papel de tradutor do legislador, é frequente que muito se perca na tradução, o que leva a uma acrescida e desnecessária dependência da prolação de orientações administrativas para clarificar o que deveria ter sido claro desde o início. Segundo, não é justificável que, em 2024, uma parte significativa da informação relativa a unidades de produção de energia, particularmente licenças, ocorra ainda fora de um sistema centralizado de informação digital. O resultado prático desta inércia do legislador é arcaico: muitas das licenças de estabelecimento ou de exploração dos projetos de produção de energia renovável, bem como a respetiva documentação associada (PPAs, autos de ligação, pareceres de entidades coordenadoras, etc.), são ainda disponibilizadas sob a forma de cópias ou digitalizações, o que dificulta o trato sucessivo do regulatório dos projetos. Terceiro e por último, o mesmo racional que presidiu à criação dos TUA poderá facilmente ser exportado para um título único energético, podendo as estruturas públicas aproveitar os modelos de alimentação de informação e aprofundar a sua articulação interadministrativa, o que se afigura particularmente relevante, atenta a confluência de agentes administrativos na concretização de projetos de energias renováveis.

    Nesta senda, o legislador poderá aproveitar para refinar alguns aspetos dos TUA, determinando às entidades públicas a criação de manuais internos para gestão da informação dos títulos únicos e, deste modo, evitar replicar nos títulos únicos energéticos os erros cometidos no passado. Tendo a digitalização no âmbito da transição energética sido assumida pelo atual Executivo como uma prioridade no seu programa para o próximo quadriénio, a criação de um Título Único Energético é mais que um próximo passo lógico – é uma consequência natural desse processo.

     

    NOTA: O Autor escreve segundo o Novo Acordo Ortográfico

    Sobre o autorPaulo Simões Ramos

    Paulo Simões Ramos

    Advogado, associado de Público da Cuatrecasas
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