O primeiro Barómetro do Observatório do Risco Geopolítico para Empresas da Porto Business School revela que os ciberataques de grande dimensão e uma possível crise financeira global são as maiores preocupações das empresas portuguesas no actual cenário geopolítico.
Os dados recolhidos revelam que a crise financeira global severa surge como o segundo risco mais relevante no curto prazo (66%), sendo considerado por 60% da amostra como o principal no médio e longo prazo. Segundo a análise, esta percepção poderá estar influenciada pela memória de crises financeiras e pela familiaridade corporativa com este tipo de contexto, o que pode levar a uma sobrevalorização da sua probabilidade de ocorrência, tal como refere Jorge Rodrigues, coordenador do Observatório do Risco Geopolítico para Empresas da Porto Business School. “As empresas demonstram uma preocupação evidente de que a crescente competição geopolítica possa desencadear uma nova crise financeira, semelhante à de 2008, que continua a ser uma referência negativa marcante no ambiente económico”, sublinha o investigador.
Já os ciberataques a infraestruturas críticas ou empresas são considerados o maior risco no curto prazo (67%) e o segundo no médio e longo prazo (58%). O Observatório verifica que, apesar da sua relevância, este risco não é percepcionado como elevado por empresas da indústria transformadora ou importadoras/ exportadoras, destacando-se sobretudo entre organizações do sector dos serviços, que apresentam maior dependência de redes digitais.
Os conflitos comerciais de elevada intensidade entre os EUA, a China e a União Europeia surgem como o terceiro maior risco tanto no curto (66%) como no médio e longo prazo (55%). Estes dados sugerem uma percepção empresarial de que o actual ambiente internacional continuará a ser marcado por rivalidades comerciais significativas.
A ameaça de disrupção das cadeias de abastecimento globais revela-se apenas em oitavo lugar no curto prazo (54%), mas sobe para a quarta posição no médio e longo prazo (55%). A análise indica que esta avaliação poderá subestimar o potencial impacto deste risco, especialmente numa economia aberta como a portuguesa.
Outros riscos destacados incluem novos conflitos na Europa ou o agravamento dos actuais (quarto no curto prazo, 61%; sétimo no médio/longo prazo, 49%) e novos conflitos globais (quinto tanto no curto como no médio/longo prazo, com 60% e 52%, respectivamente). Estes dados apontam para uma preocupação latente das empresas com a estabilidade geopolítica, em particular no contexto europeu e na relação entre China e EUA. “A percepção de risco relativamente aos conflitos intraeuropeus ou globais da actualidade diminui para o médio/longo prazo, mas, em sentido contrário, verificamos o crescimento da preocupação com as suas consequências e com a competição geopolítica”, explica Jorge Rodrigues.
Riscos para a indústria transformadora, exportação e importação
A análise revela, ainda, a percepção dos riscos e nas estratégias de mitigação ao nível sectorial. Na indústria transformadora, o risco mais relevante a curto prazo incide nos conflitos comerciais entre os EUA, China e União Europeia (84%). No médio e longo prazo, destaca-se a crise financeira global grave (78%).
Os conflitos comerciais são também apontados como o principal risco a curto prazo tanto por empresas exportadoras (69%) como importadoras (75%). Já a disrupção das cadeias de abastecimento é a maior preocupação no médio e longo prazo, com impacto semelhante nas exportadoras (68%) e importadoras (74%).”
O Barómetro revela a distinta dependência de cada sector do comércio internacional e da estabilidade geopolítica. “Os conflitos e a competição geopolítica ocupam uma posição de destaque nas atenções das empresas, com um nível de risco percepcionado maioritariamente acima dos 70%”, sublinha Jorge Rodrigues.
Ferramentas para mitigar riscos geopolíticos
O estudo identifica quatro estratégias consideradas fundamentais pelas empresas para mitigar riscos. “As questões geopolíticas são definitivamente prioritárias para as empresas portuguesas. Há uma evidente sensibilidade dos executivos para a influência do ambiente geopolítico na estratégia e no desempenho das empresas”, afirma Jorge Rodrigues.
A primeira estratégia destacada é a investigação e desenvolvimento de novos produtos ou serviços (55%), que se revela uma solução essencial para lidar com desafios e oportunidades geopolíticas. Seguem-se as estratégias empresariais ao nível das cadeias de abastecimento (53%), vistas como fundamentais para reduzir vulnerabilidades e garantir uma maior resiliência.
Os tratados ou acordos de âmbito global (49%) são apontados como instrumentos desejáveis, mas difíceis de concretizar no atual contexto internacional. Por fim, o reforço do conhecimento sobre risco geopolítico (45%) surge como um elemento-chave para uma gestão estratégica eficaz dos desafios identificados. “A resposta das empresas está orientada para a capacidade interna, através de investimento em I&D, e para parcerias estratégicas, com melhoria da preparação geopolítica. Já o apoio estatal não se revela uma prioridade”, acrescenta Jorge Rodrigues.
Segundo a análise, a crise financeira é percepcionada como um risco elevado. No entanto, observa-se falta de confiança por parte das empresas nos instrumentos financeiros disponíveis, indiciando uma possível desconfiança ou descrença em relação ao sector financeiro.
O Observatório do Risco Geopolítico para Empresas é uma iniciativa da Porto Business School, desenvolvida com o Instituto da Defesa Nacional (IDN), enquanto parceiro institucional, e com a Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP), como parceiro académico. O objectivo deste Barómetro é capacitar as empresas portuguesas para navegar num ambiente geopolítico em constante mudança, através da recolha e análise de informação, desenvolvimento de estudos e promoção de boas práticas na gestão e mitigação do risco.