Imobiliário

Habitat Invest vê na reabilitação mercado para várias décadas

O core business da Habitat Invest é, essencialmente, a reabilitação para utilização turística, mas para 2018 a promotora prevê avançar com alguns projectos de nova construção e para primeira habitação. No seu todo, a empresa estima um investimento na ordem dos 85 milhões de euros

Cidália Lopes
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Habitat Invest vê na reabilitação mercado para várias décadas

O core business da Habitat Invest é, essencialmente, a reabilitação para utilização turística, mas para 2018 a promotora prevê avançar com alguns projectos de nova construção e para primeira habitação. No seu todo, a empresa estima um investimento na ordem dos 85 milhões de euros

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Foi em 2014 que ficaram concluídos os primeiros projectos da Habitat Invest, nomeadamente a reabilitação de edifícios no centro histórico de Lisboa. O 8 Building, junto ao mercado da Ribeira, no Cais do Sodré, em Lisboa, recebeu, recentemente, o prémio de Melhor Edifício Residencial na 10ª edição dos Prémios Construir.

O core business da Habitat Invest é, essencialmente, a reabilitação mas têm também projectos para construção nova. Como se posicionam no mercado neste sentido?

A partir de 2018, a Habitat começará a desenvolver projectos de construção nova, residenciais, em Lisboa, Cascais, Estoril, Parede e Porto. Destinam-se desde a gama média até à mais alta.

Tendo em conta a marca Lisbon Five Stars, os vossos projectos são para primeira habitação ou com interesse em termos de exploração turística?

A FiveStars explora turisticamente os Projectos criados após reabilitação de prédios em Lisboa. A Habitat desenvolverá a partir de 2018 projectos que se destinam a habitação.

Ponderam investir noutros segmentos?

Neste momento estamos a analisar investimentos em todos os segmentos.

Até ao momento qual o montante investido nos projectos que já desenvolveram?

Até ao momento já investimos 60 milhões de euros nos projectos já desenvolvidos.

Qual o orçamento previsto para 2018?

Tendo em conta os novos projectos, prevemos um investimento na ordem dos 85 milhões de euros.

Quais os projectos que têm actualmente em desenvolvimento?

Temos em curso, actualmente, o projecto do Duque 70, Marquês de Abrantes, Berlim, Ribeira 11, Palácio dos Correios (Porto), Pharmacia (Porto), Estoril, Parede, Qta. Marinha, Largo do Mastro.

Como analisam actualmente o mercado imobiliário tendo em conta o boom de reabilitação que tem surgido?

Consideramos que o mercado imobiliário se encontra em franco crescimento, devido à elevada procura que se verifica.

Como vêem o sector da reabilitação nos próximos anos?

Consideramos que a reabilitação tem ainda muito espaço para crescer. A reabilitação, a este ritmo, pode ter trabalho para as próximas décadas.

Além dos centros históricos de Lisboa e Porto, há alguma outra cidade onde pretendam investir?

Investimos já em outros locais de Lisboa e Porto, fora dos centros históricos. Além destas duas cidades, temos também projectos em Cascais, Estoril e Parede.

Em relação aos projectos de construção nova para habitação para Cascais, Estoril, Parede e Porto é possível adiantar mais alguns pormenores?

Todos os projectos vão iniciar a sua construção em 2018. O projecto na Quinta da Marinha, em Cascais, da Promontório Arquitectos tem já o Plano de Informação Prévia (PIP) aprovado, à semelhança do novo projecto para o Porto, o Palácio dos Correios, este com assinatura do arquitecto Ginestal Machado e cuja parte destinada à reabilitação será a primeira a avançar. O arquitecto António Nunes da Silva assina o projecto para o Estoril, que já se encontra na Câmara Municipal de Cascais e Samuel Torres de Carvalho é o responsável pelo da Parede, que se encontra em fase final de projecto.

PROJECTOS EM DESENVOLVIMENTO

MARQUES DE ABRANTES 115

Com arquitectura de Ricardo Carvalho e Joana Vilhena, o edifício conta com 12 apartamentos e a sua conclusão está prevista para 2019..

DUQUE 70

O Duque 70 é o resultado da reabilitação de quatro edifícios históricos de traça tradicional, com assinatura do gabinete Santa Rita Arquitectos. Deverá está construído em 2019.

LARGO DO MASTRO

Este projecto resulta da reabilitação integral de um edifício que se encontrava extremamente degradado. Embora já esteja comercializado na totalidade, a sua construção deverá estar concluída ainda este ano. O projecto tem a assinatura do gabinete Santa Rita Arquitectos.

BERLIM

Projecto já entregue na Câmara Municipal de Lisboa, do gabinete Saraiva Associados. Entra em construção em 2018.

RIBEIRA 11

Com projecto do arquitecto Ricardo Carvalho. Obra já iniciada.

PHARMARCIA

Aproveitando o edifício da antiga Faculdade de Farmácia do Porto, Pharmacia é um projecto de reabilitação do gabinete Nuclarq. A construção deverá estar concluída em 2019.

Sobre o autorCidália Lopes

Cidália Lopes

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“The Concave” é um exercício de adaptação [c/galeria de imagens]

O gabinete de arquitectura do Porto, OODA, apresentou o seu novo projecto na Albânia. Desta vez a OODA saí de Tirana, a capital, para a Riviera Albanesa é lá que o “The Concave”, um hotel boutique, ganha formas num exercício pleno de adaptação e imersão com a natureza e topografia locais

“The Concave”, com assinatura do Oporto Office for Design and Architecture, OODA, é o novo projecto concebido pelo gabinete de arquitectura portuguesa para a Albânia. Desta vez, a OODA saí de Tirana, a capital, para “explorar” a bela costa albanesa. É lá, mais precisamente na praia de Llamani, um conhecido, mas pouco explorado, destino turístico, que nasce “The Concave”, um projecto para um hotel boutique premium, assim baptizado pela sua forma concava, que respeita os contornos da escarpa rochosa que abriga a praia. Neste projecto a abordagem primeira da arquitectura foi assumidamente a de se adaptar e não se impor à natureza e topografia do local.

Implantado num terreno de 56.000 m², o empreendimento abrange 10.835 m² e contará com 63 quartos, um centro de bem-estar de 460 m², piscinas, coberta e ao ar livre, áreas de lazer, restaurantes e bares, além de estacionamento interno privativo com espaços externos adicionais para acesso à praia. Um programa intenso que obrigou ao que o gabinete chama de “exercício de precisão”, onde “forma, sombra e materialidade respondem ao ambiente, absorvendo e reflectindo a paisagem circundante”, ao mesmo tempo que garante um “diálogo fluído entre os elementos construídos e naturais”.

“Como parte de um plano director mais amplo, a intervenção redefine a orla, estabelecendo uma identidade arquitectónica coesa que respeita a autenticidade bruta do local. Um sistema de estacionamento cuidadosamente projectado melhora a funcionalidade e a continuidade da paisagem, oferecendo espaços adaptáveis para interacção cultural e social”.

O projecto prioriza a sustentabilidade, incorporando “energia solar, estratégias de conservação de água e a preservação da flora nativa”, alinhando-o com as necessidades contemporâneas do ecoturismo e o desenvolvimento de baixo impacto, como forma de preservar o frágil ecossistema da Riviera Albanesa. “A topografia ousada e escultural exige uma arquitectura que seja ao mesmo tempo adaptável e respeitosa. Ecoturismo, desenvolvimento de baixo impacto e uma profunda imersão na paisagem definem a abordagem de design aqui. Em vez de dominar a cena, a arquitectura a enquadra e amplifica”, defende o gabinete português.

A 5ª fachada

Neste exercício de integração, a assunção do telhado é feita como se de uma quinta fachada se tratasse. Uma opção explicada pelo facto do hotel e seu plano director serem vistos inicialmente de cima. “Assim, o telhado torna-se a quinta fachada, onde a arquitectura se dissolve no terreno. Essa perspectiva aérea guia as escolhas de materiais e a composição volumétrica, assegurando uma integração total com a paisagem”.

O projecto dialoga com as várias camadas de história que caracterizam o local – desde fortificações venezianas, relíquias otomanas e intervenções moderna – sem, todavia, as replicar propondo uma narrativa contemporânea que respeita o passado, mas olha para o futuro.

Ficha técnica

  • Data: 2025
  • Localização: Llaman Beach, Albania
  • Área: 5.832 m2
  • Arquitectura: OODA
  • Engenharia: LA-III

 

Sobre o autorManuela Sousa Guerreiro

Manuela Sousa Guerreiro

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Muitos chavões, poucas medidas. Programas eleitorais para todos os gostos

A habitação domina or programas eleitorais, como seria de esperar, mas estranhamente não há muitos números para apresentar, com metas e orçamentos estimados. A simplificação administrativa também domina os programas para as legislativas de 202

Ricardo Batista

Duas moções de censura rejeitadas, o sinal de desconfiança numa moção de confiança, os avanços e recuos em torno dos esclarecimentos sobre a Spinumviva e voilá. Estão reunidos os ingredientes perfeitos para as terceiras eleições legislativas no espaço de três anos. Nesta fase, pouco caberá discutir se havia ou não razões para chegarmos a este ponto. As eleições estão agendadas e os partidos com assento parlamentar apresentaram os programas eleitorais que vão sujeitar ao escrutínio dos portugueses no próximo dia 18 de Maio. Pelo meio, os entraves próprios de um executivo em gestão e a forma como lida com investimento publico que fica congelado e com a execução do Plano de Recuperação e Resiliência que, antes da queda do Governo já estava com os prazos esmagados e melhor não ficou com a dissolução da Assembleia.

AD
PSD e CDS voltam a concorrer coligados, agora sem a companhia do Partido Popular Monárquico e, no essencial, mantêm a linha que vinham seguindo e que já tinham proposto nas últimas eleições. Desde logo a aposta num país mais competitivo, moderno e atractivo, apostando “na construção de mais habitação, flexibilizando regras e incentivando a reabilitação urbana, com mais casas públicas e financiamento municipal”. “Investi¬mos em infraestruturas estratégicas, como o grande programa de gestão de água, essencial para o consumo, agricultura e indústria”, pode ler-se. A Aliança Democrática propõe-se execu¬tar 59 mil casas públicas a preços acessíveis e disponibilizar financiamento para mais projectos municipais, num universo global não quantificado. O programa eleitoral da AD tem a particularidade de reassumir algumas das linhas que o Governo vinha assumindo, não sendo por isso de estranhar que, em muitas das alíneas que constam no documento, o tempo verbal usado seja o pretérito perfeito e não o futuro. Falamos, nomeadamente, da “flexibilização das limitações de ocupação dos solos, densidades urbanísticas (incluin¬do construção em altura) e exigências e requisitos construtivos, bem como a possi¬bilidade de aumento dos perímetros urbanos, garantindo uma utilização do território de forma sustentável e socialmente coesa e harmoniosa para garantir acesso à ha¬bitação” ou mesmo na área da coesão do território, onde a AD recorda que “assinámos contratos para construção de 124 novos centros de saúde e requalificá¬mos 347 unidades já existentes, com investimentos de 272,8M€ e de 274,9M€, respe¬ctivamente” ou as “26 escolas no Norte e Algarve através do PRR”. Pelo meio, a AD reitera a importância da “aplicação de IVA à taxa mínima de 6% nas obras e serviços de construção e reabilitação, com limite de incidência no valor final dos imóveis, e alargamento da dedutibilidade. Na agenda, consta também “continuar o investimento público directo na criação e requalificação de alojamento para os estudantes do Ensino Superior, através da construção de novas residências (utilizando o Plano de Recuperação e Resiliência e o PT 2030), bem como realocando e recuperando para esta função edifícios devolutos do Estado” ou “contratualizar com autarquias locais, instituições sociais e investidores privados a construção de residências estudantis, com custos acessíveis para os Estudantes”.

PS
Em relação ao Partido Socialista, o contexto em que decorrem estas eleições tem a particularidade de colocar os partidos a apresentar medidas ou a inaugurar obras propostas pelo executivo anterior. Veja-se, por exemplo, a área dos transportes, onde o PS propõe “o planeamento de longo prazo nas infraestruturas de transportes como essencial, desde logo, pelo tempo que demora entre o momento da decisão e a conclusão das obras, e pelos avultados investimentos que lhes estão associados. Além da rede ferroviária pesada, os sistemas de transporte metropolitano, os Metros, integram o primeiro nível de estruturação da rede de transportes nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto (AML) e (AMP). Tanto o Metropolitano de Lisboa como o Metro do Porto têm em curso obras de construção de novas linhas ou prolongamento das existentes. Em Lisboa, o Metro vai chegar à Estrela, a Santos, a Campo de Ourique e a Alcântara. Para Odivelas e Loures, está prevista uma nova linha de Metro Ligeiro. A sul do Tejo, planeia-se o alargamento do Metro Ligeiro até à Costa da Caparica e Trafaria. Todas estas linhas e prolongamentos têm sido, no entanto, planeadas de forma isolada, sem uma visão de rede para a AML. “Isto contrasta com o que se passa na AMP. No caso do Metro do Porto, estão em construção novas linhas na Baixa do Porto e entre o Porto e Gaia que estavam planeadas desde o início do sistema, que incluía também os outros prolongamentos que já estão em estudo”, lê-se. A habitação é também uma das prioridades do Partido Socialista, que se propõe a “criar instrumentos permanentes de financiamento da construção de habitação pública, especialmente dirigida à classe média, jovens, trabalhadores deslocados e estudantes do ensino superior, ampliando as soluções já postas em prática pelo Partido Socialista, criando uma dotação anual, financiada por parte dos dividendos da CGD, destinada à promoção e manutenção de habitação pelas autarquias”. “Não há soluções únicas nem milagrosas para responder à crise da habitação, mas há um caminho claro: assumir a habitação como desígnio colectivo, com contributo do Estado, sector privado e cooperativo; assumir que é um direito de todos – não só dos mais carenciados, mas também da classe média, hoje igualmente excluída. Cabe ao Estado agir com coragem, escala e visão de futuro para responder àquele que é hoje o maior desafio nacional”, pode ler-se no documento que propõe “o reforço do parque habitacional público é a medida mais importante para ultrapassar a crise da habitação, não só para assegurar respostas acessíveis, mas também para, no conjunto da oferta, contribuir para a regulação dos preços”. Neste domínio, o PS propõe igualmente promover “a reorientação das entidades promotoras de políticas de habitação, nomeadamente o IHRU e a Construção Pública, no que respeita à respectiva autonomia e à valorização dos recursos humanos”. “O País já construiu mais de 120 mil casas por ano”, recorda o partido liderado por Pedro Nuno Santos, que sublinha, de igual modo que “actualmente, constrói cerca de 30 mil. Portugal tem capacidade para fazer mais apostando também na industrialização e em métodos construtivos mais rápidos e sustentáveis. Para reforçar o sector da construção, o PS vai assegurar a integração de soluções de habitação acessível no licenciamento de novos projectos, nomeadamente através do aumento da capacidade construtiva e da introdução, em articulação com as autarquias, de uma quota mínima de fogos a afectar a arrendamento habitacional a custos acessíveis ou habitação a custos controlados nos novos projectos. O PS propõe também promover a industrialização do sector da construção e a construção verde, sustentável e projectos de eco-design, através de um quadro legal e concursal capaz de dinamizar o sector; estimular a digitalização dos sectores da Arquitectura, Engenharia, Construção e de Gestão ao longo do ciclo de vida de um Projecto ou, com data definida, concretizar até 2026 o Código da Construção.

Chega
Dos últimos a apresentar ao seu programa eleitoral, o Chega mantém incontornável a orientação em torno da habitação, defendendo a adaptação do Programa Nacional de acesso à primeira Habitação Jovem, ultrapassando as actuais limitações tais como: que sejam elegíveis ao apoio casais com um adulto com mais de 35 anos, que seja financiada a aquisição de terrenos mistos (urbano e rústico) e contemplado o investimento extra para requalificação de imóveis devolutos. O partido de André Ventura propõe Incentivar a construção e reforma urbana, promovendo-se o aumento significativo da oferta, que passa não só pela construção de novos imóveis e reabilitação do edificado existente, mas também pela resolução de desafios estruturais como a falta de mão-de-obra qualificada e a elevada burocracia nos processos de licenciamento e urbanismo, do mesmo modo que pretende proceder a uma reforma legislativa que assegure estabilidade e segurança jurídica, garantindo um quadro normativo claro e coerente, que permita uma resposta eficiente às necessidades habitacionais do país, nomeadamente, a implementação de políticas consistentes e de longo prazo para atrair capital nacional e estrangeiro, essencial para dinamizar o sector e aumentar a oferta habitacional. Não é, igualmente, de estranhar que a questão imigratória tenha uma linha no capítulo da habitação, naquela que é uma tónica da acção ideológica do Chega. Segundo o partido de André Ventura, “a política de imigração descontrolada agravou significativamente a crise habitacional, contribuiu para um aumento exponencial da procura, para a sobrelotação de habitações e consequentemente para o aumento desproporcional dos custos no mercado”. Pelo meio, o Chega propõe “estimular e incentivar a construção de habitação acessível por meio de parcerias entre o sector público e privado, utilizando terrenos públicos com concessão de 90 anos e estabelecendo rendas a custos controlados”.

IL
Tirando raras excepções, o que em muitos casos sobra em ideias genéricas falta em medidas mais concretas. É, de certa forma, o caso da Iniciativa Liberal que, no programa que preparou para as legislativas de 2025, espera “recuperar a confiança no mercado de arrendamento” e “aumentar a oferta de construção”. Para isso, o partido liderado por Rui Rocha defende que para aumentar a oferta de habitação, “é essencial disponibilizar mais terrenos para construção e maximizar a sua utilização, nomeadamente através da construção em altura, sempre em respeito pelos Planos Directores Municipais (PDM). Esta abordagem deve não só ser contemplada, como também incentivada na redacção deste Código”, sendo que para isso é importante promover “parcerias público-privadas com projectos habitacionais mistos (arrendamento acessível e mercado livre)”. A Iniciativa Liberal, ao contrário daquelas que têm sido as posições assumidas pelos Governos nos últimos anos, acredita que o mercado de arrendamento impulsiona-se com medidas de índole positiva e incentivadoras da disponibilização do património e não com medidas impositivas ou castradoras de oferta nas suas diferentes gamas. De resto, a IL pretende criar um regime de pré-licenciamento urbanístico automático para projectos de construção em áreas de elevada procura definidas no PDM, com requisitos pré-definidos e fiscalização rigorosa, simplificar a legislação de arrendamento e os processos de licenciamentos municipais e simplificar o quadro regulamentar e eliminar normas desnecessárias que encarecem a construção e facilitam a corrupção. O partido de Rui Rocha propõe igualmente Reformar a Agência Portuguesa do Ambiente e o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, assim como “adoptar um modelo digital de submissão e avaliação de pedidos, com prazos vinculativos para resposta, para evitar atrasos injustificados”.

Bloco de Esquerda
Invariavelmente, o Bloco de Esquerda também aponta baterias à questão da habitação, mas numa perspectiva algo distinta. Para este colectivo, tão importante quanto a construção de habitação pública é o limite de rendas no património que existe. “Temos sido o país da zona euro com maior aumento de preços da habitação e somos um dos países do mundo onde as casas são mais caras. O preço da habitação é uma condenação dos jovens e uma angús¬tia para os mais velhos e está a empobrecer a maioria”, pode ler-se no programa do Bloco, para quem “mudar de vida é ter uma casa decente e que o salário a possa pagar. Vamos estabelecer um tecto nas rendas, ou seja, valores máximos de acordo com a localização e as características dos imóveis; parar a construção de hotéis; reduzir o alojamento local onde o turismo é excessivo; acabar com os vistos gold e construir casas públicas para baixar os preços”. “O Bloco luta para garantir serviços públicos de qualidade na habitação, saúde, educação, transportes, transição energética e combate à poluição fóssil”, pode ler-se no programa do Bloco que será sufragado a 18 de Maio.

PCP
O caminho da alternativa que é definido pelo PCP traça-se não apenas ao nível da primeira habitação como para o alojamento. No programa pode ler-se que “no Ensino Superior e na Ciência é decisivo garantir o acesso de todos os estudantes, eliminando as propinas de todos os ciclos e reforçando a acção social escolar, designadamente no alojamento, concretizando, a partir de edifícios públicos já existentes e de construção nova, a abertura de 30 mil novas camas públicas nos próximos 3 anos. Para os comunistas, o direito à habitação está hoje comprometido. A resposta a esta necessidade exige um forte e permanente investimento em habitação pública, concretizado com a mobilização de fundos públicos, com o valor anual de 1% do PIB, canalizado para as necessidades de construção, reabilitação e manutenção a concretizar no quadro de um Programa Nacional de Habitação, a criar, que contribua para alargar o arrendamento de carácter social e a custos acessíveis dirigido a diversas camadas da população. Entretanto são necessárias medidas imediatas para fazer baixar o valor das rendas – com a fixação de valores máximos das rendas em contratos em vigor e novos contratos, a revogação da “Lei dos Despejos”, a estabilidade dos contratos fixando em 10 anos o período mínimo para a sua duração. Os comunistas procuram alargar a oferta de habitação pública e de habitação a custos controlados mobilizando património público para fins habitacionais, apoiando o movimento cooperativo; criando programas de residências universitárias com construção a custos controlados de acesso gratuito, dotar o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) de meios necessários e equipas técnicas, bem como requalificar o parque habitacional que é sua propriedade. A questão do modelo em que a construção deve ser desenvolvida está também nas linhas programáticas do PCP, nomeadamente ao nível das grandes infraestruturas, que para os comunistas “têm de ser integradas, garantindo a sua natureza e gestão públicas, numa visão de médio e longo prazo do desenvolvimento e incorporação de produção nacional. O Plano Nacional de Investimentos PNI2030 deve ser redefinido para dele excluir em definitivo o recurso ao modelo das PPP”

Livre
Do lado do Livre, liderado por Rui Tavares, surge a intenção de garantir o direito à habitação (prioridade à publica e cooperativa), criando o serviço nacional de habitação, estipulando o objectivo de alcançar 10% de habitação pública até 2040, constituindo um fundo para as políticas para a habitação pública (atribuir 1.000 milhões de euros anuais para a habitação pública para alcançar 600 mil fogos de habitação social e arrendamento acessível), implementando e alargando a Nova Geração de Cooperativismo para a Promoção de Habitação Acessível, reabilitando o parque imobiliário público, aumentando as vagas em residências de estudantes, criando o Balcão da Habitação e reforçando o IHRU. O Livre defende igualmente o combate à especulação imobiliária, revogando as alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT) – a chamada lei dos solos-, implementando uma política fiscal na habitação (através do aumento do imposto sobre mais-valias considerando 100% do valor para englobamento para venda de segundas habitações por mais de 250 mil euros e ainda através da proibição de compra de casas de férias por cidadãos não residentes em Portugal durante cinco anos). Neste ponto, o Livre quer ainda restringir e limitar a renovação de licenças de Alojamento Local (AL) em áreas com forte pressão turística, rever o estatuto de benefícios fiscais para imóveis e reformular o cálculo do IMI reduzindo para habitação permanente e aumentando para imóveis devolutos;

Sobre o autorRicardo Batista

Ricardo Batista

Director Editorial
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Percorremos milhares de páginas em torno das medidas mais concretas que os partidos, pelo menos aqueles com assento parlamentar na última legislatura, defendem na área do investimento público. A habitação domina, como seria de esperar, mas estranhamente não há muitos números para apresentar, com metas e orçamentos estimados. A simplificação administrativa também domina os programas para as legislativas de 2025

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AD
PSD e CDS voltam a concorrer coligados, agora sem a companhia do Partido Popular Monárquico e, no essencial, mantêm a linha que vinham seguindo e que já tinham proposto nas últimas eleições. Desde logo a aposta num país mais competitivo, moderno e atractivo, apostando “na construção de mais habitação, flexibilizando regras e incentivando a reabilitação urbana, com mais casas públicas e financiamento municipal”. “Investi¬mos em infraestruturas estratégicas, como o grande programa de gestão de água, essencial para o consumo, agricultura e indústria”, pode ler-se. A Aliança Democrática propõe-se execu¬tar 59 mil casas públicas a preços acessíveis e disponibilizar financiamento para mais projectos municipais, num universo global não quantificado. O programa eleitoral da AD tem a particularidade de reassumir algumas das linhas que o Governo vinha assumindo, não sendo por isso de estranhar que, em muitas das alíneas que constam no documento, o tempo verbal usado seja o pretérito perfeito e não o futuro. Falamos, nomeadamente, da “flexibilização das limitações de ocupação dos solos, densidades urbanísticas (incluin¬do construção em altura) e exigências e requisitos construtivos, bem como a possi¬bilidade de aumento dos perímetros urbanos, garantindo uma utilização do território de forma sustentável e socialmente coesa e harmoniosa para garantir acesso à ha¬bitação” ou mesmo na área da coesão do território, onde a AD recorda que “assinámos contratos para construção de 124 novos centros de saúde e requalificá¬mos 347 unidades já existentes, com investimentos de 272,8M€ e de 274,9M€, respe¬ctivamente” ou as “26 escolas no Norte e Algarve através do PRR”. Pelo meio, a AD reitera a importância da “aplicação de IVA à taxa mínima de 6% nas obras e serviços de construção e reabilitação, com limite de incidência no valor final dos imóveis, e alargamento da dedutibilidade. Na agenda, consta também “continuar o investimento público directo na criação e requalificação de alojamento para os estudantes do Ensino Superior, através da construção de novas residências (utilizando o Plano de Recuperação e Resiliência e o PT 2030), bem como realocando e recuperando para esta função edifícios devolutos do Estado” ou “contratualizar com autarquias locais, instituições sociais e investidores privados a construção de residências estudantis, com custos acessíveis para os Estudantes”.

PS
Em relação ao Partido Socialista, o contexto em que decorrem estas eleições tem a particularidade de colocar os partidos a apresentar medidas ou a inaugurar obras propostas pelo executivo anterior. Veja-se, por exemplo, a área dos transportes, onde o PS propõe “o planeamento de longo prazo nas infraestruturas de transportes como essencial, desde logo, pelo tempo que demora entre o momento da decisão e a conclusão das obras, e pelos avultados investimentos que lhes estão associados. Além da rede ferroviária pesada, os sistemas de transporte metropolitano, os Metros, integram o primeiro nível de estruturação da rede de transportes nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto (AML) e (AMP). Tanto o Metropolitano de Lisboa como o Metro do Porto têm em curso obras de construção de novas linhas ou prolongamento das existentes. Em Lisboa, o Metro vai chegar à Estrela, a Santos, a Campo de Ourique e a Alcântara. Para Odivelas e Loures, está prevista uma nova linha de Metro Ligeiro. A sul do Tejo, planeia-se o alargamento do Metro Ligeiro até à Costa da Caparica e Trafaria. Todas estas linhas e prolongamentos têm sido, no entanto, planeadas de forma isolada, sem uma visão de rede para a AML. “Isto contrasta com o que se passa na AMP. No caso do Metro do Porto, estão em construção novas linhas na Baixa do Porto e entre o Porto e Gaia que estavam planeadas desde o início do sistema, que incluía também os outros prolongamentos que já estão em estudo”, lê-se. A habitação é também uma das prioridades do Partido Socialista, que se propõe a “criar instrumentos permanentes de financiamento da construção de habitação pública, especialmente dirigida à classe média, jovens, trabalhadores deslocados e estudantes do ensino superior, ampliando as soluções já postas em prática pelo Partido Socialista, criando uma dotação anual, financiada por parte dos dividendos da CGD, destinada à promoção e manutenção de habitação pelas autarquias”. “Não há soluções únicas nem milagrosas para responder à crise da habitação, mas há um caminho claro: assumir a habitação como desígnio colectivo, com contributo do Estado, sector privado e cooperativo; assumir que é um direito de todos – não só dos mais carenciados, mas também da classe média, hoje igualmente excluída. Cabe ao Estado agir com coragem, escala e visão de futuro para responder àquele que é hoje o maior desafio nacional”, pode ler-se no documento que propõe “o reforço do parque habitacional público é a medida mais importante para ultrapassar a crise da habitação, não só para assegurar respostas acessíveis, mas também para, no conjunto da oferta, contribuir para a regulação dos preços”. Neste domínio, o PS propõe igualmente promover “a reorientação das entidades promotoras de políticas de habitação, nomeadamente o IHRU e a Construção Pública, no que respeita à respectiva autonomia e à valorização dos recursos humanos”. “O País já construiu mais de 120 mil casas por ano”, recorda o partido liderado por Pedro Nuno Santos, que sublinha, de igual modo que “actualmente, constrói cerca de 30 mil. Portugal tem capacidade para fazer mais apostando também na industrialização e em métodos construtivos mais rápidos e sustentáveis. Para reforçar o sector da construção, o PS vai assegurar a integração de soluções de habitação acessível no licenciamento de novos projectos, nomeadamente através do aumento da capacidade construtiva e da introdução, em articulação com as autarquias, de uma quota mínima de fogos a afectar a arrendamento habitacional a custos acessíveis ou habitação a custos controlados nos novos projectos. O PS propõe também promover a industrialização do sector da construção e a construção verde, sustentável e projectos de eco-design, através de um quadro legal e concursal capaz de dinamizar o sector; estimular a digitalização dos sectores da Arquitectura, Engenharia, Construção e de Gestão ao longo do ciclo de vida de um Projecto ou, com data definida, concretizar até 2026 o Código da Construção.

Chega
Dos últimos a apresentar ao seu programa eleitoral, o Chega mantém incontornável a orientação em torno da habitação, defendendo a adaptação do Programa Nacional de acesso à primeira Habitação Jovem, ultrapassando as actuais limitações tais como: que sejam elegíveis ao apoio casais com um adulto com mais de 35 anos, que seja financiada a aquisição de terrenos mistos (urbano e rústico) e contemplado o investimento extra para requalificação de imóveis devolutos. O partido de André Ventura propõe Incentivar a construção e reforma urbana, promovendo-se o aumento significativo da oferta, que passa não só pela construção de novos imóveis e reabilitação do edificado existente, mas também pela resolução de desafios estruturais como a falta de mão-de-obra qualificada e a elevada burocracia nos processos de licenciamento e urbanismo, do mesmo modo que pretende proceder a uma reforma legislativa que assegure estabilidade e segurança jurídica, garantindo um quadro normativo claro e coerente, que permita uma resposta eficiente às necessidades habitacionais do país, nomeadamente, a implementação de políticas consistentes e de longo prazo para atrair capital nacional e estrangeiro, essencial para dinamizar o sector e aumentar a oferta habitacional. Não é, igualmente, de estranhar que a questão imigratória tenha uma linha no capítulo da habitação, naquela que é uma tónica da acção ideológica do Chega. Segundo o partido de André Ventura, “a política de imigração descontrolada agravou significativamente a crise habitacional, contribuiu para um aumento exponencial da procura, para a sobrelotação de habitações e consequentemente para o aumento desproporcional dos custos no mercado”. Pelo meio, o Chega propõe “estimular e incentivar a construção de habitação acessível por meio de parcerias entre o sector público e privado, utilizando terrenos públicos com concessão de 90 anos e estabelecendo rendas a custos controlados”.

IL
Tirando raras excepções, o que em muitos casos sobra em ideias genéricas falta em medidas mais concretas. É, de certa forma, o caso da Iniciativa Liberal que, no programa que preparou para as legislativas de 2025, espera “recuperar a confiança no mercado de arrendamento” e “aumentar a oferta de construção”. Para isso, o partido liderado por Rui Rocha defende que para aumentar a oferta de habitação, “é essencial disponibilizar mais terrenos para construção e maximizar a sua utilização, nomeadamente através da construção em altura, sempre em respeito pelos Planos Directores Municipais (PDM). Esta abordagem deve não só ser contemplada, como também incentivada na redacção deste Código”, sendo que para isso é importante promover “parcerias público-privadas com projectos habitacionais mistos (arrendamento acessível e mercado livre)”. A Iniciativa Liberal, ao contrário daquelas que têm sido as posições assumidas pelos Governos nos últimos anos, acredita que o mercado de arrendamento impulsiona-se com medidas de índole positiva e incentivadoras da disponibilização do património e não com medidas impositivas ou castradoras de oferta nas suas diferentes gamas. De resto, a IL pretende criar um regime de pré-licenciamento urbanístico automático para projectos de construção em áreas de elevada procura definidas no PDM, com requisitos pré-definidos e fiscalização rigorosa, simplificar a legislação de arrendamento e os processos de licenciamentos municipais e simplificar o quadro regulamentar e eliminar normas desnecessárias que encarecem a construção e facilitam a corrupção. O partido de Rui Rocha propõe igualmente Reformar a Agência Portuguesa do Ambiente e o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, assim como “adoptar um modelo digital de submissão e avaliação de pedidos, com prazos vinculativos para resposta, para evitar atrasos injustificados”.

Bloco de Esquerda
Invariavelmente, o Bloco de Esquerda também aponta baterias à questão da habitação, mas numa perspectiva algo distinta. Para este colectivo, tão importante quanto a construção de habitação pública é o limite de rendas no património que existe. “Temos sido o país da zona euro com maior aumento de preços da habitação e somos um dos países do mundo onde as casas são mais caras. O preço da habitação é uma condenação dos jovens e uma angús¬tia para os mais velhos e está a empobrecer a maioria”, pode ler-se no programa do Bloco, para quem “mudar de vida é ter uma casa decente e que o salário a possa pagar. Vamos estabelecer um tecto nas rendas, ou seja, valores máximos de acordo com a localização e as características dos imóveis; parar a construção de hotéis; reduzir o alojamento local onde o turismo é excessivo; acabar com os vistos gold e construir casas públicas para baixar os preços”. “O Bloco luta para garantir serviços públicos de qualidade na habitação, saúde, educação, transportes, transição energética e combate à poluição fóssil”, pode ler-se no programa do Bloco que será sufragado a 18 de Maio.

PCP
O caminho da alternativa que é definido pelo PCP traça-se não apenas ao nível da primeira habitação como para o alojamento. No programa pode ler-se que “no Ensino Superior e na Ciência é decisivo garantir o acesso de todos os estudantes, eliminando as propinas de todos os ciclos e reforçando a acção social escolar, designadamente no alojamento, concretizando, a partir de edifícios públicos já existentes e de construção nova, a abertura de 30 mil novas camas públicas nos próximos 3 anos. Para os comunistas, o direito à habitação está hoje comprometido. A resposta a esta necessidade exige um forte e permanente investimento em habitação pública, concretizado com a mobilização de fundos públicos, com o valor anual de 1% do PIB, canalizado para as necessidades de construção, reabilitação e manutenção a concretizar no quadro de um Programa Nacional de Habitação, a criar, que contribua para alargar o arrendamento de carácter social e a custos acessíveis dirigido a diversas camadas da população. Entretanto são necessárias medidas imediatas para fazer baixar o valor das rendas – com a fixação de valores máximos das rendas em contratos em vigor e novos contratos, a revogação da “Lei dos Despejos”, a estabilidade dos contratos fixando em 10 anos o período mínimo para a sua duração. Os comunistas procuram alargar a oferta de habitação pública e de habitação a custos controlados mobilizando património público para fins habitacionais, apoiando o movimento cooperativo; criando programas de residências universitárias com construção a custos controlados de acesso gratuito, dotar o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) de meios necessários e equipas técnicas, bem como requalificar o parque habitacional que é sua propriedade. A questão do modelo em que a construção deve ser desenvolvida está também nas linhas programáticas do PCP, nomeadamente ao nível das grandes infraestruturas, que para os comunistas “têm de ser integradas, garantindo a sua natureza e gestão públicas, numa visão de médio e longo prazo do desenvolvimento e incorporação de produção nacional. O Plano Nacional de Investimentos PNI2030 deve ser redefinido para dele excluir em definitivo o recurso ao modelo das PPP”

Livre
Do lado do Livre, liderado por Rui Tavares, surge a intenção de garantir o direito à habitação (prioridade à publica e cooperativa), criando o serviço nacional de habitação, estipulando o objectivo de alcançar 10% de habitação pública até 2040, constituindo um fundo para as políticas para a habitação pública (atribuir 1.000 milhões de euros anuais para a habitação pública para alcançar 600 mil fogos de habitação social e arrendamento acessível), implementando e alargando a Nova Geração de Cooperativismo para a Promoção de Habitação Acessível, reabilitando o parque imobiliário público, aumentando as vagas em residências de estudantes, criando o Balcão da Habitação e reforçando o IHRU. O Livre defende igualmente o combate à especulação imobiliária, revogando as alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT) – a chamada lei dos solos-, implementando uma política fiscal na habitação (através do aumento do imposto sobre mais-valias considerando 100% do valor para englobamento para venda de segundas habitações por mais de 250 mil euros e ainda através da proibição de compra de casas de férias por cidadãos não residentes em Portugal durante cinco anos). Neste ponto, o Livre quer ainda restringir e limitar a renovação de licenças de Alojamento Local (AL) em áreas com forte pressão turística, rever o estatuto de benefícios fiscais para imóveis e reformular o cálculo do IMI reduzindo para habitação permanente e aumentando para imóveis devolutos.

Sobre o autorRicardo Batista

Ricardo Batista

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Construção

Quatro cenários para o BRT da A5

As autarquias de Cascais e Oeiras querem criar um Bus Rapid Transit (BRT) que ligue ambas as autarquias ao centro de Lisboa. A ideia não é nova, mas o primeiro estudo está concluído apontando quatro opções de percurso

Ao longo dos últimos meses a hipótese de construção de um Bus Rapid Transit, ou BRT, que ligue os municípios de Cascais e Oeiras ao centro da cidade de Lisboa, tem sido apontado como uma solução para contornar os problemas de tráfego que milhares de pessoas sofrem diariamente sem outra solução que não seja a A5, a marginal ou a linha de caminho de ferro da CP.

Mais do que uma ideia, a infraestrutura integra as diferentes estratégias de mobilidade urbana de ambos os concelhos da área metropolitana de Lisboa. De acordo com uma publicação do município de Cascais “os estudos já realizados, enquanto solução de transporte mais próximo das residências dos cidadãos e com um acesso directo ao centro de Lisboa, a criação dos BRT seria uma forma de responder às necessidades proporcionando um aumento da oferta do transporte público e, ao mesmo tempo retirando pressão às actuais ligações a Lisboa (A5, marginal e linha de comboio)”.

Numa conferência sobre mobilidade realizada no final de Abril o presidente do munício de Cascais, Carlos Carreiras, sublinhou que “Cascais e Oeiras estão alinhados numa estratégia comum, que é a solução BRT na A5”, sublinhando que a solução iria resolver o problema de coesão do território e os congestionamentos na A5, principal acesso rodoviário que mantém as características iniciais, não obstante o crescimento da população nos dois concelhos. Por dia perto de 100 mil veículos usam esta via, sendo uma das que regista maior tráfego a nível nacional.

As vias para chegar a Lisboa
Um estudo de viabilidade preliminar para introduzir um corredor de BRT entre Cascais e Lisboa, atravessando o município de Oeiras, considerou quatro cenários, os quais acompanham os dois traçados já existentes e que fazem a ligação a Lisboa: a A5 e a linha de caminho de ferro, junto à costa.

O primeiro cenário proposto não é bem um BRT mas considera “a oferta de transporte público rodoviário em torno do corredor da Linha de Cascais, com paragens junto às estações de comboio”. Num segundo cenário, foi estudada a viabilidade de criação de um canal BRT a terminar em Sete Rios, acompanhando a A5 e IC15 de Cascais até Lisboa, passando por Oeiras. Neste caso, e de acordo com a notícia do jornal municipal de Cascais, o estudo considera a manutenção da Linha de Cascais com o reforço da sua vocação turística.

A terceira hipótese estudada propõe a criação de um BRT até à Gare do Oriente que, à semelhança da anterior utiliza o corredor A5/IC15 de Cascais, passando por Oeiras, até Lisboa, “sendo que os serviços com origem em Cascais passam a ter acesso directo ao Colégio Militar / CC do Colombo, Campo Grande, Aeroporto e Gare do Oriente”. Tal como no outro cenário a Linha de Cascais viria reforçada a sua vocação turística.

Por último, foi considerada também de criação de um BRT no espaço da Linha de Cascais, em substituição do serviço ferroviário.

Segundo a mesma notícia entre as opções mais viáveis em termos de custo/benefício estará a opção de criação de BRT até à Gare do Oriente, desde que o novo corredor inclua a oferta de um “bom” serviço de transporte público aos parques empresariais de ambos os concelhos. Este cenário iria ainda beneficiar “do corredor de transporte público em sítio próprio que está a ser pensado pela câmara municipal de Lisboa para a 2.ª Circular. Este cenário é o que apresenta um maior potencial de procura, estimando-se que possa vir a transportar cerca de 23,9 mil passageiros por dia.

 

Sobre o autorManuela Sousa Guerreiro

Manuela Sousa Guerreiro

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Metropolitan Living
Imobiliário

Alcácer do Sal tem a vantagem de “conseguir disponibilizar oferta para diferentes segmentos”

Nos próximos anos, a Metropolitan Living prevê investir perto de 80 milhões de euros, repartidos pelo pipeline de 200 apartamentos para Lisboa e dois novos projectos de turismo residencial em Alcácer do Sal. Uma nova aposta da empresa e cuja localização, Ricardo Kendall, CEO Metropolitan Living, acredita ter “potencial” e com valores mais adequados ao perfil nacional

Cidália Lopes

Ricardo Kendall e Vera Kendall são o rosto da Metropolitan Living. Depois do sucesso das residências de estudantes Smart Studios e da alienação dos seus activos, estudos e análises de mercado levaram-nos para o mercado turístico. Alguns dos edifícios que já vinham da anterior empresa foram adaptados a este novo negócio.

Depois da venda da Smart Studios centraram a vossa actuação em apartamentos turísticos com a Metropolitan Living, inclusive mantendo alguns dos activos que já vinham da empresa anterior. Qual o motivo para esta mudança de estratégia?

Existe uma série de estudos, sobretudo da consultora McKinsey, altamente especializada em turismo, que mostram que nos próximos 10 a 15 anos vai existir um grande boom no turismo a nível mundial. Países como a India, a China, a Indonésia, que representam mais de 50% da população mundial, vão registar um amento significativo da sua classe média. Esta classe média vai viajar mais, e por isso acreditamos que Portugal estará no radar destas pessoas como um dos destinos turísticos mais procurados na Europa, prevendo-se que o sector do turismo ganhe assim ainda mais robustez do que a tem hoje, em Portugal.

O turismo tem vindo a ganhar grande destaque nas últimas décadas, impulsionado pela diversidade e a oferta de qualidade, faz, por isso, todo o sentido apostar no sector, e os apartamentos turísticos são uma parte importante da indústria de turismo e hospitalidade. A Metropoltan Living dispõe de vários apartamentos, para estadias temporárias ou de longa duração, e têm-se revelado a alternativa de excelência aos hotéis tradicionais. Os turistas procuram nesta solução ter mais conforto, privacidade e flexibilidade, muitas vezes esta é também a resposta mais adequada para turistas que viajem em grupos. Termos mais pessoas e por mais tempo em virtude da oferta e da experiência que conseguimos proporcionar será a tendência.

A Metropoltan Living dispõe de vários apartamentos, para estadias temporárias ou de longa duração e os turistas procuram nesta solução ter mais conforto, privacidade e flexibilidade ou é também a resposta mais adequada para turistas que viajem em grupos

Como olham para o sector e quais as principais tendências que antecipam?

A Metropolitan Living entrou num segmento muito específico com os apartamentos turísticos. A estratégia foi retirar da equação as três áreas onde, se perde mais dinheiro num formato de hotel e que são, tradicionalmente, o restaurante, o bar e a recepção. É tudo feito através das OTA’s, plataformas digitais que ligam os viajantes aos diversos serviços de viagem, como o booking ou o airbnb, e através do seu smartphone têm acesso ao edifício e ao seu apartamento. Outra mudança que adoptámos foi equipar todos os quartos com kitchenette, transformando todas as unidades em formato de apartamento, versátil e prático. Assim, também asseguramos, por exemplo, situações inesperadas, como uma eventual segunda pandemia, ou um downturn na economia em que o turismo estagna, e desta forma é possível alugar estes apartamentos a médio e longo prazo, e não ter um embate tão negativo, como teve a hotelaria tradicional durante o período da pandemia.

Esta tendência que estamos a criar, de apartamentos turísticos, com registo destes edifícios em modelo H1, modelo que não tem, por exemplo, obrigatoriedade de ter garagem ou elevador, e que são condições que a generalidade destes edifícios mais antigos da capital não tem, e que são o nosso mercado, para comprar e reformular na totalidade, e depois a superação de expectativas e o pricing são a nossa grande aposta.

Esta tendência que estamos a criar, de apartamentos turísticos, com registo destes edifícios em modelo H1, modelo que não tem, por exemplo, obrigatoriedade de ter garagem ou elevador, e que são condições que a generalidade destes edifícios mais antigos da capital não tem, e que são o nosso mercado, para comprar e reformular na totalidade, e depois a superação de expectativas e o pricing são a nossa grande aposta.

O “potencial” do Alentejo

O Olive Green é o vosso primeiro projecto fora de Lisboa. Apesar de ser também um produto turístico, este apresenta características distintas e um público-alvo diferenciado. Quais as principais diferenças?

O Olive Green é um projecto que se distingue desde logo pela sua essência, por ser uma oportunidade de escolher um estilo de vida equilibrado, consciente e cuidado, num local calmo e envolto na natureza, para tirar proveito das experiências e do momento, e também pela arquitectura, desenhada para se harmonizar e integrar com o ambiente.

Apresenta-se, por isso, como uma escolha ideal tanto para residência permanente como para segunda habitação. Os preços também se distinguem, começam nos 168 mil euros, sendo por isso uma oferta apelativa, acessível e direccionada para o público nacional. O metro quadrado aqui ronda os cerca de 4.700 euros, em contraponto com os cerca de 10 mil a 15 mil euros praticados na vizinha Comporta, preços incomportáveis para a generalidade dos portugueses.

Fruto desta diferenciação, preço, proximidade e qualidade, são já 24 os apartamentos vendidos em planta, ainda sem terem arrancado as obras de construção no terreno. É também um projecto diferenciador que redefine o conceito de habitação sustentável e moderna e se destaca da oferta imobiliária local, como um conceito apelativo para as famílias, com um conjunto de espaços comuns que permitem realizar diversas actividades.

Não sendo um formato turístico puro, a sua génese é residencial, haverá com certeza compradores investidores que poderão desejar rentabilizar o seu investimento, até porque Alcácer do Sal não tem, ainda, restrições para o alojamento local, e neste sentido, se assim houver interesse, a Metropolitan Living assegurará esse serviço aos seus clientes.

Porquê a escolha de Alcácer do Sal?

Alcácer do Sal é uma das cidades mais antigas da Europa, com mais de 3000 anos, uma cidade bonita, com rio, a 85 km de Lisboa, a pouca distância do futuro aeroporto e a cerca de 23 km das praias e da Comporta. A vantagem desta localização privilegiada são também as infraestruturas da cidade, nomeadamente acessos, centro de saúde, escolas, espaços de lazer e cultura e espaços comerciais, e com a chegada de novas famílias jovens haverá lugar para novos negócios e empreendedorismo na cidade, criando também novas oportunidades e um novo mercado, além das inúmeras actividades de lazer que se pode fazer desde canoagem, stand up paddle, golfe,  passeios de barco na Reserva Natural do Estuário do Sado, percorrer os trilhos de bicicleta ou pela ciclovia que liga a cidade às praias.

Por isso, Alcácer do Sal tem muito potencial, com a vantagem de conseguirmos disponibilizar oferta residencial e turística para diferentes segmentos o que, naturalmente, terá maior abrangência em termos de alcance e diversidade dos interessados, quer de nacionais quer de estrangeiros.

O próximo grande investimento será também em Alcácer do Sal, onde comprámos recentemente mais um terreno, e onde vai nascer um segundo projecto na região, o Salt Residences, com características mais exclusivas, mais direccionado para o segmento de luxo

Que outras localizações estão, também, no vosso radar? Que características procuram?

O próximo grande investimento será também em Alcácer do Sal, onde comprámos recentemente mais um terreno, e onde vai nascer um segundo projecto na região, o Salt Residences, com características mais exclusivas, mais direccionado para o segmento de luxo. Nós acreditamos e estamos a apostar muito nesta localização e nesta região porque reconhecemos o seu potencial.

Neste caso será um projecto diferente, composto por 25 moradias/vilas, com um pricing bem distinto, com valores acima de um milhão de euros. Localizado junto à estrada da Comporta, num terreno mais nobre em termos de privacidade e iniciámos agora o processo de licenciamento. Estes dois projectos em Alcácer do Sal, Olive Green Residences e Salt Residences, envolvem um investimento bastante avultado, na ordem dos 60 milhões de euros, por isso, sim, apostamos e acreditamos no potencial da região. Alcácer do Sal vai tornar-se num sítio com muita vida, aprazível e que os portugueses vão conseguir alcançar e onde vão querer estar.

Depois, estamos também a investir em Lisboa, através da Metropolitan Living, com características mais citadinas. Neste momento temos cerca de 80 apartamentos em Lisboa já em operação e mais três prédios, em obras e em licenciamento, o que perfaz um pipeline de 200 apartamentos. A ambição é chegar aos 500 apartamentos, mas há o obstáculo dos preços, que estão demasiado elevados, e por isso esta ambição poderá não ser alcançada já, mas acredito que chegaremos aos 300/350 apartamentos.

Qual a estratégia de crescimento da Metropolitan Living para os próximos anos? Que investimento está previsto?

A estratégia mantém-se no aumento do número de apartamentos turísticos em Lisboa, através da compra de edifícios mais antigos e com boa localização. Como já referi, estamos com um pipeline de 200 apartamentos na capital, há negociações a decorrer para outros prédios, e estamos com uma oferta recente para um prédio com 25 apartamentos no centro da cidade. Acreditamos que a ambição de alcançar as 500 unidades será num horizonte, talvez, a 10 anos, mas nesta fase estamos compradores de mais prédios em Lisboa, embora neste momento os valores estejam tão elevados que está a ser difícil comprar. O investimento envolvido nesta fase para a concluir o pipeline dos 200 apartamentos chega aos 20 milhões de euros.

Sobre o autorCidália Lopes

Cidália Lopes

Jornalista
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André Caiado, arquitecto e fundador da Contacto Atlântico
Arquitectura

O caminho do Simplex é “dar-nos liberdade, com responsabilidade”

Fundou a Contacto Atlântico há quase 30 anos e orgulha-se por ser um dos ateliers com mais “caminho” feito no mundo da arquitectura e com um conjunto de trabalhos assinados que vão desde a loja, ao escritório, à reabilitação de edifícios icónicos como o Quarteirão do Rossio ou o antigo edifício sede do Diário de Notícias. Acredita que o Simplex veio para ajudar e não complicar e com uma maior “liberdade, vem, também, uma maior responsabilidade”

Cidália Lopes

O arquitecto André Caiado é o rosto à frente do atelier. O antigo espaço do estirador deu lugar a ecrãs onde se imaginam e desenham, tecla a tecla, os “sonhos” dos clientes. E não há mal nisso. A tecnologia está aí e é preciso aproveitar e tirar o melhor partido desta. “O arquitecto adapta-se a tudo”, diz e avança, mesmo que para isso tenha que, por vezes, recuar e relembrar que é no esquiço que nasce a ideia

Que balanço faz do vosso percurso?

Ao longo de 29 anos, quase 30, a Contacto Atlântico tem trazido imensa satisfação e eu diria quase felicidade durante o seu desenvolvimento como gabinete de arquitectura. Os projectos são entidades autónomas e são todas diferentes.

Portanto, o que acontece é que a probabilidade de termos projectos repetitivos é muito reduzida porque ou muda o cliente, ou muda o local, ou muda a condição da envolvente e, portanto, é um trabalho que é sempre novo. É um trabalho que se reinventa diariamente.

Ou seja, não há rotinas na vida de um arquitecto…

Sim, por outro lado as interacções entre as várias pessoas envolvidas também são diferentes porque um projecto, actualmente, é conciliar muitos interesses, entre o interesse do promotor que procura criar algo que lhe traga satisfação e o seu resultado económico.

O arquitecto acaba por ser um coordenador de vários intervenientes importantes durante o seu ciclo, entre o primeiro acto criativo de representação da intenção do cliente e a ter que um bocadinho de muitas coisas, a relacionar-se com conjuntos de realidades muito diversas ao longo do qual.

“O que o Simplex vem dizer é que, em determinadas situações, podes começar a construir desde que te responsabilizes por aquilo que estás a fazer. Acho que isso é importantíssimo numa sociedade onde o tempo de contexto representa mais de 30% do custo de um novo apartamento”

De que forma tem o atelier conseguido inovar e crescer? Qual o factor distintivo do vosso trabalho?

Há sempre um conjunto de pessoas que trazem consigo uma atitude muito curiosa. E, portanto, sempre que aparece qualquer coisa diferente, nós vamos tentar experimentar. Há uma vontade de experimentar o diferente e, quando ela é executada, há vezes que esse diferente é irrazoável e irrealista, mas há muitas vezes que esse diferente de facto tem uma componente de novidade, mas também de tecnologia e também de sucesso.

Eu lembro-me que começámos a trabalhar com um estirador e com tinta da China. Hoje não há estiradores, há computadores e há ferramentas tridimensionais fabulosas. Mas, por outro lado, não se perdeu o bloco com o papel vegetal, com o esquiço, para representar à mão as primeiras ideias do projecto.

Neste aspecto, a Contacto Atlântico foi-se adaptando aos tempos, sempre com a perspectiva de utilizar as últimas ferramentas tecnológicas, mas sem deixar de parte o traço criativo. Portanto, a primeira ideia, o primeiro esboço, o gabinete trabalha em todas as áreas de projecto e procura atribuir ao cliente o melhor que o cliente possa esperar em termos de soluções para o desafio que nos é apresentado.

Por outro lado, o facto de trabalharmos em todas as áreas da arquitetura, desde a industrial, a logística, a hospitais, restaurantes, de habitação a escritórios, de lojas, hotéis de luxo, permite-nos encaixar os diferentes ciclos do mercado. Se tivermos 15% de uma coisa, 20% de outra, 9% de outra, 14% de outra, as coisas conseguem acontecer de uma forma muito suave, é muito perigoso e às vezes é fácil deixar a empresa ir por um caminho, digamos, de monoproduto.

Acredito que esta é a aposta que leva a que o atelier tenha uma longevidade não muito comum neste tipo de negócio que é, pura e simplesmente, ser muito cuidadoso, dar os passos correctos, mas perceber, acima de tudo, que o objectivo é a satisfação do cliente e o sucesso do cliente, quer seja um sucesso emocional, como uma casa para um casal, quer seja um sucesso económico, como um promotor que pretende vender apartamentos ou explorar um hospital ou um restaurante.

Quais os principais desafios?

Acho que o desafio mais divertido é manter sempre na memória as palavras do Charles Darwin na evolução das espécies, quando ele escreve: “O mundo não é dos mais fortes. O mundo é daqueles que se adaptam mais depressa às alterações”. Nós fomos das primeiras equipas a adoptar o BIM em Portugal, há já uma década, e hoje acompanhamos as ferramentas de inteligência artificial todas que vão aparecendo e fomentamos na equipa esse acompanhamento e o aprofundar desses conhecimentos, nomeadamente, nos mais novos.

E depois é proporcionar à equipa a oportunidade de testar tudo. Nós estamos num momento onde, e eu já defini isto há algum tempo, onde eu começo a ver que começar a ter situações onde vamos ter um sistema automático com incorporação de inteligência artificial a aprovar projectos. É uma questão de tempo. É introduzir um conjunto de regras ao sistema, associar um modelo BIM e deixá-lo decidir se estão a ser respeitadas todas as regras. Em vez de termos um colega, um humano com uma lista, a fazer uma checklist a verificar se respeitámos todas as regras.

“Hoje com a IA a criação projectual representada verbalmente é, depois, representada não pelo esquiço, resultado do desenho manual ou da maqueta, mas pela imagem produzida por uma máquina que responde ao meu texto. Houve uma altura que eu pensei que isto podia destruir a profissão, mas hoje está claríssimo que não vai acontecer. Isto porque cada humano tem uma percepção da realidade envolvente de uma determinada maneira e vai deixar características suas no objecto criativo”

Estamos num caminho em que vimos a evolução da tecnologia em cada década, não é?

Absolutamente. Em cada década os saltos são gigantes, multiplicam-se várias vezes. O multiplicador é do para a tecnologia. Portanto, eu acho que não abraçar a tecnologia é suicido. Eu não diria o princípio do fim. É o fim do fim. É o suicídio directo. Já não há espaço para pôr as mãos nos olhos e não querer ver.

Que projectos foram mais marcantes?

É muito complicado conseguir escolher um projecto, mas há um que eu gosto especialmente, por ter sido um dos nossos primeiros projectos, que é o Clube Naval em Cascais, um projecto em betão branco onde nós desenhámos ao detalhe até os caixilhos das janelas. O betão branco requer que toda a infraestrutura seja desenhada e localizada dentro da laje, depois quando a laje é betonada, tudo o que não está feito já não se pode fazer porque o betão não é nem rebocado, nem pintado, como é descofrado, é como fica. Mas, também, porque naquele caso tratava-se de um equipamento público e, portanto, não era necessário ir ao encontro dos objectivos económicos de um cliente.

Um trabalho público, principalmente em termos de equipamentos e situações de concurso, é um trabalho onde a liberdade criativa é muito grande porque a conta é paga pelos impostos de todos e não há ninguém a dizer ao arquitecto que matéria deve ou não utilizar.

Estes projectos são interessantes por essa razão. E, depois, neste caso concreto, o uso do betão branco tornou o projecto extremamente desafiante em termos de metodologia construtiva.

Onde fica hoje o esquiço, o traço à mão? Ainda é valorizado?

Não há ainda outra opção, ou de outra maneira. O arquitecto é alguém que deve ter visto muito dos quatro cantos do Mundo. É importante é criar um universo de conhecimento na cabeça de cada um dos arquitectos. Por isso é que se diz, com uma certa graça, que o arquitecto é o homem velho. Não por ter 99 anos, mas por ter visto tudo. Por ter conhecimento. O arquitecto deve ter conhecido tudo. E, portanto, o arquitecto tem o projecto na cabeça. Como tirar o projecto da cabeça para explicar aos outros? Há dois caminhos. Um, que é perigosíssimo, eu conto uma história, que é a história do projecto. Só que o problema é que quando eu conto uma história, eu vou representar o imaginário e do outro lado as pessoas vão apreender dessa história aquilo que lhes interessa baseada na sua estratégia cultural. A outra alternativa é a passagem do cérebro para uma imagem através de uma representação do desenho.

Portanto, o famosíssimo esquiço do arquitecto, que tem a capacidade única de transmitir o meu sonho de uma forma realista, com menos filtros. Mas o grau de liberdade é muito menor do que uma descrição verbal e ao ser menor não temos o desencanto mais à frente e, portanto, ainda não há outra ferramenta que consiga ter a função do esquiço na representação. E quem diz o esquiço diz uma maqueta.

Portanto, a outra alternativa, para quem não tem jeito para desenhar, é fazer um pequeno modelo do edifício ou do objecto arquitectónico. Agora, no último ano, as coisas modificaram-se brutalmente outra vez e apareceu uma coisa que se chama Prompt. Portanto, há uma quantidade de ferramentas da inteligência artificial que cada dia melhoram, à qual o arquitecto descreve um determinado objectivo e a produção

é uma imagem. E, depois, eu vou produzindo uma nova descrição verbal, neste caso uma descrição escrita, e a ferramenta produz novamente uma imagem melhorada, e uma imagem melhorada, e uma imagem mais afinada, até o momento em que eu digo, ok, é mesmo isto. Isto é o meu objectivo. E nesse momento estou a tratar a IA como se fosse outro humano. Não deixa de ser assustador.

É engraçado termos chegado aqui a este paradigma, onde a criação projectual representada verbalmente é representada não pelo esquiço, resultado do desenho manual ou da maqueta, mas pela imagem produzida por uma máquina que responde ao meu texto. Vale a pena perceber que houve uma altura que eu pensei que isto podia destruir a profissão.

E actualmente já não está convencido disso?

Está claríssimo que não vai acontecer. Isto porque cada humano tem uma percepção da realidade envolvente de uma determinada maneira e vai deixar características suas no objecto criativo. O que nos salva é a nossa subjectividade e a IA poderá fazer sozinho milhares de soluções, mas só uma delas é que será apropriada para cada humano.

Então, face às reivindicações da profissão, umas mais antigas, outras mais recentes, como vê o papel da arquitetura na sociedade e junto de quem quer fazer cidade?

A arquitectura deve ser uma profissão de extrema humildade, porque tem um impacto brutal na cidadania. Quando no universo universitário eu pergunto aos alunos quem foi o maior ditador, normalmente os europeus todos respondem Hitler. O maior ditador para mim é o arquitecto que fez o apartamento onde eu vivo porque ele dita o percurso que eu faço entre a minha cama e a casa de banho todos os dias quando acordo. Por isso, a profissão deve ser olhada com extrema humildade, perceber o impacto da má decisão na vida das pessoas. Se eu fizer um degrau sozinho no meio de uma sala, eu tenho uma probabilidade imensa de provocar contínuas quedas de pessoas que não vêm o degrau.

De facto, a arquitectura é uma profissão que as pessoas abraçam por amor à arquitectura, não é? Aliás, eu acho que o arquitecto não é quem estuda arquitectura. O arquitecto é quem gosta de arquitectura. Eu posso dizer que alguns dos mais famosos arquitectos de sempre não estudaram arquitectura de início. É o caso da Zahid, que era Matemática, ou o mais famoso arquitecto holandês, Ren Koolhaas, que era jornalista ou até o Ricardo Bofill que nunca concluiu o curso de arquitectura.

E digo isto mesmo tendo sido professor catedrático de arquitectura de projectos durante 20 anos, mas acho mesmo que, mais do ter a formação de arquitetura, a chave é querer ser arquitecto.

“O facto de trabalharmos em todas as áreas da arquitetura, desde a industrial, a logística, a hospitais, restaurantes, de habitação a escritórios, de lojas, hotéis de luxo, permite-nos encaixar os diferentes ciclos do mercado”

Na prática, de que forma tem sido aplicado o Simplex e de que forma o arquitecto pode utilizar as novas regras também para se salvaguardar?

O Simplex faz todo o sentido na medida em que eu defendo a responsabilização dos profissionais. O que o Simplex vem dizer é que, em determinadas situações, podes começar a construir desde que responsabilizes por aquilo que estás a fazer. Acho que isso é importantíssimo numa sociedade onde o tempo de contexto representa mais de 30% do custo de um novo apartamento.

Na Contacto Atlântico, utilizamos todas as semanas projectos em modo de comunicação prévia para zonas consolidadas dos centros das cidades que não estão protegidas pelo património. Portanto, sim, é uma vantagem brutal. Por outro lado, cria uma muito saudável questão de responsabilidade em que o arquitecto já não vai tentar ver se dá para pôr mais um andar em cima daquilo, porque se correr mal, corre muito mal para ele próprio, por causa da maior responsabilização. Eu sou favorável a que, quando eu cometer o erro crasso de pôr seis pisos, quando o loteamento diz cinco, que venham buscar-me ao escritório e me levem de braço dado com o promotor e com o construtor para a prisão e que haja condenação de quem incumprir brutalmente de uma forma mais do que óbvia com aquilo que são as suas obrigações profissionais. Portanto, eu penso que é altamente positivo. Eu libertaria ainda mais as responsabilidades dos municípios e responsabilizaria ainda mais os engenheiros, os arquitectos, os construtores e os promotores.

Que conselhos daria aos jovens arquitectos que estão a iniciar? 

O conselho é nunca desistir. Never, ever, ever, ever give up. O Mundo é daqueles que não desistem. A pessoa, the only ones that wins, the only one that never gets portanto, quer continuar a insistir no seu sonho. Eu acho que isto acontece em todas as áreas, em todos os assuntos quem nunca desiste acaba por ser bem-sucedido e acaba por chegar a qualquer lado.

Sobre o autorCidália Lopes

Cidália Lopes

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“Estamos totalmente comprometidos com a transição para uma economia de baixo carbono”

Ao CONSTRUIR, o CCO da Cimpor, Ignácio Gómez, explica as transformações que estão a ser adoptadas numa das empresas europeias de referência na indústria cimenteira

Ricardo Batista

Para o Chief Comercial Officer (CCO) da CIMPOR, a previsibilidade é fundamental para as empresas, pelo que a instabilidade governativa não pode ser encarada como positiva. Ainda assim, Ignácio Goméz explica ao CONSTRUIR a estratégia da empresa para uma operação mais sustentável e que passa por um investimento estimado em 1,4 mil milhões de euros, a aplicar na modernização das fábricas do grupo e na eficiência das operações

A CIMPOR acaba de assinalar 130 anos. Muito se conhece a propósito do passado da empresa em Portugal. E o futuro? Por onde passa o futuro?
O futuro da CIMPOR está alicerçado em três grandes pilares: inovação, sustentabilidade e transformação digital. No próximo ano, a CIMPOR celebra 50 anos de existência, enquanto o seu Centro de Produção de Alhandra assinalou recentemente 130 anos, sendo a fábrica de cimento mais antiga do mundo a operar continuamente no mesmo local. Com tantos anos de história, a empresa continua a dar passos decisivos para consolidar a sua liderança no sector cimenteiro, com investimentos em tecnologia e modernização. A rede privada 5G Standalone instalada nas nossas fábricas permite uma digitalização das operações, tornando os processos mais ágeis e eficientes. Ao mesmo tempo, apostamos em soluções inovadoras para aumentar a competitividade e optimizar a utilização dos recursos.

A CIMPOR está também a modernizar as suas fábricas de Alhandra, Souselas e Loulé com projectos que envolvem um investimento total de 360 milhões de euros em tecnologias de eficiência operacional e energética para responder aos desafios do sector. A CIMPOR, portanto, projecta o futuro com a mesma visão de sempre: inovar para crescer, com um forte compromisso com a criação de valor para as comunidades e para o mercado.

A CIMPOR prevê investir 1,4 mil milhões de euros em Portugal até 2030. Quais vão ser as prioridades deste investimento e, no plano prático, como é que o mercado vai percepcionar os resultados desse investimento?
O nosso investimento de 1,4 mil milhões de euros em Portugal até 2030, que já está em curso desde a aquisição da CIMPOR por parte da TCC Group Holdings em Março do ano passado, espelha o compromisso da CIMPOR com a inovação e o reforço da sua competitividade no sector. A grande prioridade deste investimento é a modernização das infraestruturas e a implementação de novas tecnologias, garantindo operações mais eficientes e preparadas para o futuro. Parte significativa desse montante será alocada à modernização das infraestruturas, ao desenvolvimento de novas tecnologias e à introdução de novos produtos que não só atendem aos requisitos ambientais mais exigentes, mas também asseguram a nossa competitividade no mercado global.
Além disso, a aposta na digitalização e na automação permitirá ganhos significativos de eficiência e tornará as operações mais ágeis e competitivas. A modernização das fábricas, a implementação de novas soluções tecnológicas e o reforço da capacidade produtiva vão traduzir-se numa oferta mais diferenciada e numa resposta mais eficaz às necessidades dos clientes.
O mercado vai perceber os resultados desse investimento através de uma maior eficiência na produção, de produtos mais inovadores e da capacidade da CIMPOR em antecipar tendências e responder aos desafios da indústria, garantindo a sua posição de referência no sector cimenteiro.

Disse, em Dezembro último, que “o investimento é grande e se o Governo não está no mesmo ritmo, teremos um problema no futuro”. A instabilidade que se tem vivido em Portugal, do ponto de vista político, pode comportar riscos para a iniciativa privada? Em que medida?
A instabilidade política nunca é positiva para a iniciativa privada, pois significa que processos ficam parados e que decisões estratégicas podem sofrer atrasos. Para empresas como a CIMPOR, que fazem investimentos de grande escala e longo prazo, a previsibilidade é fundamental. Sempre que há incerteza no panorama político, existe o risco de desaceleração nos projectos e nos investimentos planeados. É importante que, independentemente do contexto político, os processos administrativos e regulatórios continuem a avançar a um ritmo que permita às empresas concretizar os seus planos sem entraves desnecessários.

Muito se discute em torno da sustentabilidade e da pegada carbónica na indústria da Construção de um modo transversal. De que modo está a CIMPOR a responder aos desafios que existem pela frente neste domínio e o que está a ser feito para ir ao encontro do que se espera que seja a neutralidade carbónica?
A abordagem da CIMPOR, no que diz respeito à sustentabilidade e à redução da pegada carbónica, é clara e proactiva, especialmente porque reconhecemos o impacto que a nossa indústria tem nas emissões de CO2. Estamos totalmente comprometidos com a transição para uma economia de baixo carbono e a net zero, um objectivo que nos orienta e que estabelece o horizonte de 2050.
No presente, temos em curso um plano estratégico de descarbonização que envolve várias iniciativas e investimentos. Estas incluem, por exemplo, a substituição de combustíveis fósseis por alternativas mais ecológicas, ou o investimento em infraestruturas de energias renováveis, como as UPACs (Unidades de Produção para Autoconsumo) que já estão operacionais. Estamos também a trabalhar em tecnologias de recuperação de calor residual que visam converter o calor gerado no processo de produção de clínquer em energia eléctrica.

Outra grande aposta da CIMPOR é a produção de materiais com menor pegada de carbono, como as argilas calcinadas, que podem substituir parcialmente o clínquer. Além disso, estamos a investir na inovação e no desenvolvimento de novos produtos que atendam às exigências ambientais do mercado, como o cimento de baixo carbono, e estamos a trabalhar em estreita colaboração com as autoridades e as comunidades locais para garantir que todos os processos de descarbonização sejam implementados de forma eficaz e inclusiva.

A CIMPOR compromete-se a alcançar emissões líquidas zero de gases com efeito de estufa ao longo de toda a cadeia de valor até 2050. Como vai ser feito este percurso até à meta traçada?
A CIMPOR tem um compromisso firme de alcançar a net zero até 2050, e este objectivo, que foi validado pela Science Based Targets initiative (SBTi), será alcançado através de uma combinação de iniciativas estratégicas, investimentos em tecnologias inovadoras e colaboração estreita com toda a nossa cadeia de fornecimento.
A descarbonização da produção é uma das nossas prioridades, com investimentos na substituição de combustíveis fósseis por alternativas mais sustentáveis e na eficiência energética das nossas fábricas. Também estamos a desenvolver produtos de menor pegada carbónica, como os cimentos com materiais alternativos, garantindo soluções mais sustentáveis para o sector da construção, sem comprometer a performance dos nossos materiais.

A transição energética será outro factor essencial, com um aumento significativo da incorporação de energia renovável e de combustíveis alternativos, reduzindo as nossas emissões ao longo da próxima década. Ao longo do percurso, também estamos a trabalhar de forma activa com os nossos fornecedores e parceiros para garantir que toda a nossa cadeia de valor contribua para a meta estipulada. A colaboração com os nossos clientes também será um pilar importante, com o desenvolvimento de soluções de construção sustentáveis que permitam a redução das emissões ao longo do ciclo de vida dos edifícios.

Anunciaram, recentemente, uma parceria com a FIZIX, empresa especializada em soluções que combinam sensores inteligentes e software baseado em inteligência artificial, para a adopção de um sistema de monitorização apoiado em IA que possibilitará detectar falhas nas instalações de produção de cimento antes que estas ocorram. Que necessidades identificaram para avançar com esta parceria? Na prática o que vai ser feito?
A parceria com a FIZIX surge como parte da nossa estratégia contínua de inovação e melhoria das nossas operações. A necessidade que identificámos para avançar com esta colaboração está directamente relacionada com o nosso compromisso em aumentar a eficiência operacional, reduzir o risco de falhas inesperadas nas nossas instalações e, consequentemente, optimizar a produção de cimento de forma mais eficiente.

As nossas fábricas estão sujeitas a uma complexa rede de processos e equipamentos que, se não monitorizados de forma contínua e eficaz, podem levar a interrupções ou falhas que impactam a produção. Sabemos que a manutenção preventiva e a detecção precoce de falhas são cruciais para garantir a continuidade da produção e a redução de custos operacionais. Foi neste contexto que identificámos a FIZIX como um parceiro estratégico, dada a sua expertise em soluções baseadas em inteligência artificial (IA) e sensores inteligentes.
Na prática, o que vamos fazer é implementar um sistema de monitorização avançado que utiliza sensores inteligentes para monitorizar em tempo real o desempenho das nossas instalações e equipamentos. Este sistema, alimentado por IA, será capaz de analisar grandes volumes de dados de forma eficiente, identificar padrões e, o mais importante, prever falhas antes que estas ocorram. Em vez de depender apenas da manutenção reactiva, que é mais custosa e disruptiva, passamos a contar com uma abordagem proactiva, que permite antecipar problemas e agir antes que afectem a produção.

Com esta parceria, vamos equipar as nossas instalações com sensores que irão medir variáveis críticas, como temperatura, pressão e vibração dos equipamentos, e enviar esses dados para uma plataforma centralizada. A inteligência artificial será responsável por analisar esses dados em tempo real, identificando potenciais falhas e notificando os responsáveis antes que estas se tornem um problema sério. Isso não só vai aumentar a confiabilidade dos nossos processos, mas também contribuirá para uma gestão mais eficiente da manutenção, permitindo que as equipas operacionais tomem decisões informadas com base em dados em tempo real.

Este sistema não se limita apenas à detecção de falhas, mas também permitirá uma optimização contínua dos processos. Ao perceber melhor o comportamento dos equipamentos, podemos identificar áreas de melhoria e ajustar os parâmetros operacionais para aumentar a eficiência e reduzir o desperdício.
Além disso, a integração de IA na nossa operação permitirá que a CIMPOR se mantenha na vanguarda da transformação digital na indústria cimenteira, alinhando-se com as melhores práticas de Indústria 4.0, onde a automação, a análise de dados e a inteligência artificial desempenham um papel central.

Uma empresa marcadamente cimenteira, como olha para a industrialização dos processos construtivos e para a “desejada” evolução dos processos de fabrico mais tradicionais?
A CIMPOR olha para a industrialização dos processos construtivos com grande interesse e atenção, pois acreditamos que esta tendência representa uma oportunidade significativa para o sector da construção e para a indústria cimenteira como um todo. A industrialização, nomeadamente a utilização de tecnologias avançadas e a automação, pode trazer uma série de benefícios, como a melhoria da eficiência, redução dos custos de produção e, acima de tudo, a garantia de maior qualidade e previsibilidade nos projectos de construção.
No entanto, para a CIMPOR, a industrialização não é apenas uma tendência passageira, mas uma realidade que já está a moldar o futuro da construção. A utilização de métodos mais modernos de fabrico, como a impressão 3D, o pré-fabricado e a construção modular, está a ser cada vez mais adoptada no sector da construção e irá, sem dúvida, transformar a forma como as obras são realizadas, criando novas exigências para os materiais e soluções que oferecemos. O cimento, como matéria-prima central na construção, precisa de acompanhar esta evolução, com produtos inovadores e mais adaptados aos novos métodos de construção.

A “desejada” evolução dos processos de fabrico mais tradicionais não significa que vamos abandonar a produção de cimento convencional, mas sim que devemos integrar novas tecnologias e processos mais eficientes, como os que estamos a implementar no âmbito da digitalização e da descarbonização. Este processo de evolução passa, por exemplo, pela melhoria das técnicas de produção, pela optimização da utilização de recursos e pela aposta na inovação, como já estamos a fazer.
Além disso, os avanços nos processos construtivos industriais exigem uma estreita colaboração entre a indústria do cimento e o sector da construção, pois as soluções mais inovadoras precisam de ser pensadas e adaptadas em conjunto. A CIMPOR, com a sua longa experiência e presença no mercado, tem um papel fundamental em fornecer produtos e soluções mais adaptáveis às necessidades da indústria da construção no futuro.

Do ponto de vista da industrialização, o cimento continuará a ser a base para as grandes obras de infraestrutura, mas com o avanço das novas tecnologias, estamos a trabalhar para que o cimento também seja mais eficiente e mais bem adaptado às exigências dos métodos de construção mais modernos. O nosso compromisso com a inovação vai ao encontro dessa necessidade de adaptação dos processos construtivos, tornando-os mais industriais e mais eficientes.
Olhamos para a industrialização dos processos construtivos não como uma ameaça, mas como uma evolução natural do sector, na qual a CIMPOR está activamente envolvida, com o objectivo de estar alinhada com as novas necessidades da indústria da construção.

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O projecto de cidade que transformará a AML

Com o executivo em gestão, fruto da dissolução do Parlamento e do agendamento das Legislativas antecipadas, Montenegro apresenta projecto “que pretende transformar o arco ribeirinho numa grande metrópole, em que o rio funciona como elo de ligação dos territórios em vez de os separar”, contempla cerca de 4500 hectares de área de intervenção urbanística e infraestruturas. Operação está avaliada em 15 mil milhões de euros

Ricardo Batista

Pouco mais se sabe do que o conceito teórico, mas os dados conhecidos até agora do designado Parque Cidades do Tejo representam, seguramente, uma das maiores operações urbanísticas dos tempos modernos. Maior que o Eixo do Arco Ribeirinho Sul que António Costa, então primeiro-ministro, apresentou há aproximadamente dois anos.
Desta feita, numa sessão presidida por Luís Montenegro, o Governo apresentou aos presidentes dos 18 municípios da Área Metropolitana de Lisboa (AML) – e ao presidente da Câmara de Benavente-, o Parque Cidades do Tejo, um projecto que, segundo o executivo, “pretende transformar o arco ribeirinho numa grande metrópole em que o rio funciona como elo de ligação dos territórios em vez de os separar”.

De acordo com a proposta agora apresentada, falamos de duas margens centradas no Tejo e quatro projectos de âmbito nacional que se traduzirão numa operação única, de coordenação centralizada, em cooperação com o Estado Central e os Municípios directamente envolvidos. Ao todo, são 4 500 hectares de área de intervenção urbanística e infraestruturas, o equivalente a 55 vezes a Parque Expo, onde se prevê a construção de mais de 25 mil habitações.

Requalificação e regeneração
Nos quatro eixos – Arco Ribeirinho Sul, Ocean Campus, Aeroporto Humberto Delgado e Cidade Aeroportuária – “requalificam-se e regeneram-se territórios, fomenta-se cidades em rede e promove-se a economia circular, a habitação, o emprego e o aumento dos transportes públicos através do reforço das infraestruturas”. Na apresentação, o Governo explica que os novos equipamentos “darão uso, vida e futuro a terrenos públicos nas margens do Tejo que há muitos anos estão totalmente desaproveitados”. O Parque Cidades do Tejo integra também espaços habitacionais, de lazer, de investigação e de cultura, como a Ópera Tejo, um Centro de Congressos Internacional e a Cidade Aeroportuária. Ao nível de infraestruturas, estão previstas duas novas travessias do Tejo: a Terceira Travessia do Tejo (TTT) e o túnel Algés-Trafaria; um aeroporto único de cariz expansível, com capacidade para mais de 100 milhões de passageiros e investimento na ferrovia de alta velocidade. Estima-se que estes investimentos criem mais de 200 mil postos de trabalho. O projecto contempla 1 10 000 m2 destinados a equipamentos e 2 500 000 m2 a actividades económicas, sem ter em conta o espaço da Cidade Aeroportuária. Pretende-se aumentar a quota modal de transporte público de 24% para 35%, e para isso, será importante o reforço do investimento de mais 3,8 mil milhões de euros – sendo que o apoio ao transporte público e à política tarifária se prevê de 328 milhões de euros/ano. Na AML vive mais de um quarto da população total do País – 28% da população nacional e 48% da população activa. É também aqui que se prevê um aumento de 7% de habitantes até 2080. Além da reabilitação de terrenos, de criar soluções de mobilidade – tendo em conta, nomeadamente a construção da nova cidade aeroportuária (Benavente e Montijo) – é necessário criar ofertas habitacionais que respondam às necessidades da população. A Parque Cidades do Tejo – interligada em quatro eixos – pretende assim equilibrar a densidade urbana e concretizar políticas públicas de habitação. Ao mesmo tempo, reduz o tempo gasto entre casa e o trabalho e cria emprego qualificado com o reforço de infraestruturas, aumenta rede de transportes e promove a transferência modal, beneficiando a qualidade de vida de quem habita ou trabalha nesta região.

A proposta agora conhecida nasce depois de uma miríade de outros (inúmeros) projectos desenhados ou, pelo menos, pensados, sobretudo para a baía do Tejo. Em Março de 2023, o primeiro-ministro António Costa apresentava, no final do Conselho de Ministros, os trabalhos da regeneração e selagem de solos contaminados, da infraestruturação do território com a expansão do transporte público, em especial do metro do sul do Tejo, da instalação de um novo terminal fluvial na Moita e da construção do passeio ribeirinho de 38 quilómetros entre Alcochete e Almada. O líder do executivo acrescentou, na altura, que era fundamental que a região voltasse “a ser uma fortíssima área de actividade económica, geradora de emprego qualificado, já não com as indústrias do passado mas com as do futuro, com os serviços do presente e do futuro”. “Às vezes os projectos levam tempo, mas o mais importante de tudo na política é sermos persistentes», afirmou, elogiando os presidentes de câmaras da margem sul do Tejo «por se terem unido e desbloqueado» vários projectos”, referiu António Costa. Mas não foi o único. Em 2019 era apresentada a “Cidade da Água”. O projecto de requalificação da Margueira, onde funcionaram os antigos estaleiros navais da Lisnave, naquela que era, então, “a maior intervenção de requalificação urbana em Portugal após a Expo-98”. A ‘Cidade da Água’ tinha prevista uma área de construção de 630.000 m2 e, além do parque habitacional, estava prevista a instalação de um hotel, uma marina, um terminal fluvial de passageiros, um museu e um centro de congressos, ligados entre si por praças e canais, dando origem a um conjunto de espaços públicos únicos.

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“Devemos assumir a Habitação como uma absoluta prioridade nacional. Esta é a nossa ‘guerra’”

A afirmação é de Álvaro Santos que, em conjunto com Miguel Branco-Teixeira, é o autor do livro “Políticas de Habitação Acessível”. Um livro que procura soluções para o problema da falta de habitações a preços acessíveis, um problema que não é exclusivamente português

O livro “Políticas de Habitação Acessível” nasce de uma viagem a Viena e de um desafio: perceber como a Europa responde à falta de habitação a preços acessíveis e que lições pode Portugal pode tirar destes exemplos. Álvaro Santos e Miguel Branco-Teixeira, analisam cidades como Amesterdão, Barcelona, Berlim, Helsínquia, Paris e Viena, e cruzam essas lições com as cinco capitais de distrito do Norte de Portugal. O resultado? Um retracto de soluções diversas e a certeza de que, em Portugal, não obstante os programas em curso, é preciso mais escala, maturidade e colaboração entre Estado, privados e municípios. Em entrevista ao CONSTRUIR, Álvaro Santos aponta a necessidade de se reduzirem burocracias, de aumentar recursos e a necessidade de integrar habitação com urbanismo e inovação na construção. Este é, sobretudo, um convite à acção: é preciso equilibrar oferta e procura, simplificar processos e mobilizar todos para uma prioridade nacional que não pode esperar.

Como surgiu este livro? Sendo certo que este é um momento oportuno para o seu lançamento.
A ideia de escrever este livro resultou de uma viagem que fiz a Viena, há cerca de um ano atrás. Sabendo que a crise habitacional que vivemos em Portugal é comum a toda a Europa, gostava de perceber como é que a Áustria, e em particular Viena, estavam a reagir a essa crise? E quais as soluções que estavam a adoptar para combater a falta de habitação a preços acessíveis, principalmente, para a população de rendimentos intermédios?
Foi deste modo que lancei o desafio ao meu colega Miguel Branco-Teixeira para estudarmos, com algum grau de profundidade, este caso de Viena e, por que não, estendê-lo também a outras cidades europeias.
Curiosamente, o presidente da Ordem dos Engenheiros da Região Norte, Bento Aires, também já tinha lançado o desafio de partilharmos o nosso conhecimento, e a experiência do trabalho prático junto dos municípios portugueses, através de uma publicação sobre o tema da habitação.
Foi assim que decidimos juntar aos casos de estudo europeus, a análise às cinco capitais de distrito do Norte de Portugal, indo plenamente ao encontro da pretensão da Ordem dos Engenheiros da Região Norte que assim carimbou esta publicação com a sua chancela.

Que lições principais podemos retirar dessa análise comparativa?
O nosso livro procura extrair conclusões e recomendações para o contexto português, a partir de uma análise de boas práticas nacionais e internacionais no domínio das políticas de habitação.
Os estudos de caso internacionais abordados (Amesterdão, Barcelona, Berlim, Helsínquia, Paris e Viena) evidenciam a diversidade de abordagens destinadas a debelar estes problemas. Por exemplo, em Amesterdão, os recursos públicos aliam-se aos privados e ao terceiro sector no fomento da habitação a preços acessíveis. Recorrendo a parcerias público-privadas.
Em Barcelona, foi criado um observatório de âmbito metropolitano mandatado para o recenseamento exaustivo de fogos devolutos e do parque habitacional do Estado, além de promover mecanismos de intermediação entre inquilinos e proprietários.
Em Berlim, há uma aposta deliberada no estímulo a cooperativas de habitação que beneficiam do direito de preferência em áreas previamente definidas. Além da criativa reabilitação de edifícios, o que permite ampliar o número de alojamentos reduzindo a dimensão média de cada um.
Em Helsínquia, existe um inovador “direito à ocupação”, a meio caminho entre a propriedade e o arrendamento: a casa pertence ao município ou a associações sem fins lucrativos, mas o arrendatário pode vender o seu direito àquela habitação.
Em Paris, escritórios considerados obsoletos são transformados em residências. E há a figura do Fundo Fundiário e Cooperativo, para apoiar construção a custos controlados. Coexistindo com experiências socialmente inovadoras, como a co-habitação, as eco-habitações ou as habitações modulares.
Em Viena, mais de metade dos fogos insere-se em modelos de habitação social ou acessível, correspondendo à forte tradição que há muito ali vigora. São prioritários os apoios dirigidos à oferta, não à procura. Começando por uma política fundiária eficaz, baseada numa elevada dotação de solo público.

E porquê o foco na comparação das soluções de Habitação Acessível desta seleção de países europeus?
Fundamentalmente, porque os desafios enfrentados pela generalidade dos países europeus são comuns à realidade nacional e são por demais conhecidos.
Um crescente desequilíbrio entre a oferta e a procura de habitação, com origem em factores económicos, financeiros e demográficos diversificados, tem exacerbado os custos associados à aquisição e ao arrendamento de habitação condigna, tornando-a cada vez mais inacessível para uma parcela crescente da população. O ritmo de construção de novos alojamentos tem-se revelado insuficiente para acompanhar esta tendência, tornando o stock de habitação disponível a um preço acessível cada vez mais limitado, facto que agrava ainda mais o problema. Como consequência, aumentam as situações extremas de vulnerabilidade, incluindo a sobreocupação de alojamentos, a degradação do parque, despejos motivados pela incapacidade de pagar a renda ou a prestação da casa e um incremento considerável do número de pessoas em situação de sem-abrigo.

Em Portugal não faltam medidas, mas é preciso acelerar o seu impacto

Que políticas ou estratégias de outros países europeus destacadas no livro poderiam ser adaptadas com sucesso ao contexto português?
Os estudos de caso internacionais analisados evidenciam uma diversidade de soluções que podem ser agrupadas em três conjuntos distintos.
No primeiro conjunto, destacam-se as iniciativas destinadas a erradicar as situações de maior vulnerabilidade. Estas apresentam-se extremamente diversificadas, verificando-se que as soluções clássicas de construção de habitação pública municipal com rendas fortemente subsidiadas, presentes em maior ou menor escala na generalidade das cidades europeias, têm vindo a revelar-se insuficientes face ao avolumar dos problemas e à escassez de recursos disponíveis.
O segundo conjunto de soluções relaciona-se com a promoção de habitação acessível, tanto para aquisição como para arrendamento. Este tipo de habitação destina-se aos estratos de rendimentos intermédios, superiores aos valores elegíveis para habitação social, mas inferiores aos necessários para arrendar ou adquirir casa numa lógica de mercado, sem que tal comprometa seriamente a qualidade de vida dos residentes.
O terceiro conjunto de propostas consiste no estímulo à construção de novos alojamentos, de modo a acompanhar a evolução da procura e assim manter os preços em valores aceitáveis. Algumas das medidas referidas no livro inscrevem-se neste objectivo, em particular a cedência de terrenos públicos e as deduções fiscais, subvenções e apoios ao financiamento.

Quais considera serem os maiores obstáculos para implementar políticas de habitação acessível eficazes em Portugal?
A análise que fazemos no nosso livro revela que, apesar de não faltarem em Portugal soluções semelhantes às analisadas nos estudos de caso internacionais, estas medidas foram geralmente introduzidas há relativamente pouco tempo. Como consequência, apresentam-se mais frágeis do ponto de vista da escala de intervenção e grau de maturidade, pelo que diversas medidas poderão ser tomadas no sentido de acelerar o seu impacto.

Tais como?
Em primeiro lugar, o papel dos municípios na definição e operacionalização das políticas de habitação deverá ser reforçado. Até há relativamente pouco tempo, apenas as autarquias de maior dimensão desenvolviam uma intervenção significativa no sector da habitação, geralmente concentrada na gestão do parque público, por vezes integrada em direcções de serviços de acção social mais abrangentes.
Em segundo lugar, é hoje consensual que os recursos públicos disponíveis para a habitação, tradicionalmente concentrados nas situações de maior vulnerabilidade, revelam-se insuficientes face aos desafios surgidos ao longo da última década. Tais desafios afectam directamente segmentos alargados da sociedade, pelo que requerem, não apenas abordagens diversificadas quanto às modalidades de intervenção e às fontes de financiamento, como um contributo cada vez mais activo dos actores não-públicos, nomeadamente do sector privado, na definição e execução das políticas de habitação.
Um terceiro aspecto relevante para a superação dos problemas associados à acessibilidade da habitação relaciona-se com a articulação entre as políticas de habitação e outras dimensões da intervenção pública, com destaque para o urbanismo e ordenamento do território, a política de solos e a reabilitação urbana. As Cartas Municipais de Habitação, instrumento criado ao abrigo da Lei de Bases da Habitação, poderão constituir o catalisador desta mudança.
Um quarto aspecto fundamental relaciona-se com a transformação da indústria da construção, que deverá introduzir elementos de inovação nos seus produtos, processos produtivos e modalidades de gestão, de modo a superar os actuais desafios colocados pela inflação, pela reduzida disponibilidade de profissionais qualificados e pelas exigências de eficiência energética e combate à pobreza energética.

Exemplos a Norte para replicar a nível nacional

Há algum caso de sucesso nestes cinco municípios portugueses analisados que possa servir de modelo para outras regiões?
O nosso livro demonstra que o poder local ampliou consideravelmente o conjunto de instrumentos dedicados à habitação, seja através do alargamento dos seus objectivos às necessidades dos estratos intermédios (por via do arrendamento acessível), seja enquadrando as políticas de habitação em estratégias mais amplas, frequentemente centradas na reabilitação urbana.
Por outro lado, a centralidade da habitação nas políticas autárquicas é hoje visível para além das duas áreas metropolitanas, encontrando-se cada vez mais presente nas estratégias das cidades médias, e mesmo de concelhos de menor dimensão.
Mas, para além das opções que concretizam ou reproduzem modelos de âmbito nacional, é possível encontrar exemplos de inovação social e institucional, incluindo as centradas no papel das populações no desenho das soluções mais adequadas (“Assembleias de moradores”, em Braga). Outras propostas procuram articular instrumento de natureza diferente, como habitação e ordenamento do território (perequações e “zonamento inclusivo”, no Porto), ou fiscalidade e reabilitação urbana (ORU e “zonas de pressão urbanística”, em Bragança, Vila Real e Viana do Castelo).
Contudo, uma das principais conclusões a retirar deste livro é que existe ainda um longo caminho a percorrer em direcção a um modelo de provisão da habitação mais acessível para a generalidade da população. Este percurso é particularmente exigente no segmento de arrendamento, facto que provavelmente implicará medidas mais ambiciosas do que as tomadas até ao momento.

Qual deveria ser o equilíbrio entre a intervenção do Estado e a iniciativa privada na resolução da crise de habitação acessível? Colocamos mais a óptica, e os apoios, do lado da “procura” ou deveríamos olhar mais para os apoios do lado da “oferta”?
Eu diria que a resolução do problema da habitação não pode ser apenas acometida à intervenção pública, sendo fulcral integrar o sector privado e cooperativo neste propósito.
Num quadro de reconhecimento e assunção de que os recursos financeiros públicos são finitos e que devem ser geridos com transparência e equidade, as entidades públicas e privadas, o 3º Sector (IPSS, Misericórdias, associações, cooperativas, etc.) e os cidadãos em geral, devem ser convocados para esta mobilização de interesses e de vontades na partilha de informação, na análise e discussão dos problemas comuns e na identificação e execução das melhores soluções habitacionais que possam ser exequíveis no nosso País.
Para isso, considero ser fundamental actuar em duas dimensões absolutamente impactantes: Simplificar e reduzir a excessiva morosidade dos processos de licenciamento e, segundo, promover uma política fiscal justa, equilibrada e competitiva no domínio da habitação.

Como avalia os programas actuais do governo português, como o “Programa de Arrendamento Acessível” ou o “Primeiro Direito”, quanto ao seu ritmo de implementação, bem como ao impacto esperado?
O “Programa de Arrendamento Acessível” e o “Primeiro Direito” foram já lançados em 2018, no âmbito da então designada Nova Geração de Políticas de Habitação, portanto ainda com os governos anteriores.
Os resultados do “Programa de Arrendamento Acessível” foram, infelizmente, muito reduzidos, com cerca de 2 mil contratados, ao longo de 5 anos de existência. Entretanto, já foi rebaptizado para Programa de Apoio ao Arrendamento, mas desconhecem-se resultados concretos.
Quanto ao “Programa 1º Direito” tem sido levado a cabo pelos Municípios portugueses que, num primeiro momento, elaboraram as suas Estratégias Locais de Habitação, culminando na apresentação de candidaturas para construção ou reabilitação de 59 mil habitações. Essas operações estão em curso, embora ainda com uma taxa de execução muito baixa.
Devo sublinhar que a resposta dos municípios portugueses que, para além das 26 mil soluções previstas no PRR, apresentaram 59 mil candidaturas, releva bem a sua ambição e vontade de contribuir para a resolução da crise habitacional em Portugal.
Contudo, e apesar dos Municípios estarem a fazer um trabalho incrível, a elevada burocracia imposta e os timings muito curtos para a sua concretização estão a criar muitas dificuldades que, sinceramente, espero que possam ser ultrapassadas para não termos de devolver dinheiro a Bruxelas.
Por outro lado, se o PRR financia 26 mil habitações, o actual Governo já garantiu o financiamento das 33 mil candidaturas restantes, com um reforço de 2,8 mil milhões de euros através do Orçamento de Estado, até 2030. Trata-se do maior investimento público em Habitação dos últimos 50 anos em Portugal.

Olhando para uma perspectiva de 10 anos, que mudanças prevê no panorama da habitação acessível?
Temos de ter consciência de que o problema da habitação não se vai resolver de um dia para o outro, infelizmente. Por isso, devemos assumir a Habitação como uma absoluta prioridade nacional. Esta é a nossa “guerra”. E para problemas excepcionais, precisamos de soluções excepcionais. O nosso País precisa de produzir cerca de 50 a 60 mil fogos por ano. Só assim será possível combater eficazmente a crise habitacional. Não tenhamos dúvidas disso! Este é um desafio que nos deve mobilizar a todos, não apenas governantes, não apenas políticos, mas entidades públicas, empresas privadas e a própria sociedade civil.

 

Sobre o autorManuela Sousa Guerreiro

Manuela Sousa Guerreiro

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Engenharia

“Ainda nos falta definir uma estratégia consolidada de País”

Ao CONSTRUIR, o recém-(re)eleito presidente da secção Norte da Ordem dos Engenheiros, Bento Aires, fala do significado da expressiva votação, do papel dos engenheiros na necessária transformação da produção na Construção e os efeito da instabilidade política no calendário de investimentos estratégicos que o País tem pela frente

Ricardo Batista

Recém-empossado presidente da secção regional do Norte da Ordem dos Engenheiros, onde cumprirá um segundo mandato, Bento Aires explica ao CONSTRUIR por onde passa a estratégia daquele organismo para o próximo triénio, numa altura em que o Sector enfrenta grandes desafios que passam, em parte, pelo reforço da industrialização

O senhor foi eleito com 89% dos votos. Que significado tem esta expressividade para si, por muito que tenha sido uma lista única sujeita a sufrágio?
Representa exatamente o mesmo que representou a primeira eleição. Uma enorme responsabilidade, vontade e motivação para continuar o trabalho que fizemos até aqui.
Interpreto o resultado como uma validação expressiva da vontade dos Engenheiros da Região do nosso projecto, apesar da eleição ter sido em lista única, a participação dos membros no acto eleitoral foi das mais elevadas em eleições similares.
No fundo, vamos continuar o futuro, um futuro com mais engenheiros/as activos/as no desenvolvimento económico, social e sustentável.
Conseguimos nos últimos três anos envolver muitos mais Engenheiros na nossa acção, sobretudo por via da sua capacitação, do desenvolvimento de acções de formação e de partilha de conhecimento.
Hoje, os nossos membros reconhecem a força e actividade da OERN enquanto plataforma de valorização e qualificação do seu trabalho.

Quais são as principais prioridades da Ordem dos Engenheiros – REGIÃO NORTE para este novo mandato?
Temos duas novas prioridades: a Indústria e a Administração Pública. A Região Norte tem uma forte componente industrial, onde trabalham centenas de engenheiros, para quem vamos querer orientar o nosso trabalho, com acção de capacitação, discussão, permitindo que a partir dos Engenheiros se contribua para a re-industrialização da região e do País.
O mesmo acontece com a administração pública, onde temos muitos engenheiros a trabalhar, e de quem vamos querer estar mais próximos.
Depois estaremos atentos a temas transversais e sectoriais, com o impacto da inteligência artificial, da sustentabilidade na prática profissional.
Neste caso, queremos que os nossos engenheiros liderem a transformação que o sector da construção está a viver, acelerando-a e melhorando os seus resultados, apostando na qualidade e valorização do trabalho dos engenheiros.
Dando, obviamente, continuidade ao trabalho que temos feito até aqui, envolver os Engenheiros na vida ativa da sociedade, aumentado o seu reconhecimento.

Que medidas concretas serão tomadas para fortalecer a profissão e a sua representatividade na sociedade?
Digo recorrentemente que a sociedade não tem cultura de engenharia, para não dizer que é inculta de Engenharia, e só alteramos este estado com proximidade e difusão de conhecimento, acentuando o fosso da qualidade e alcance dos objetivos, em matéria de engenharia, entre a presença de um Engenheiro e de um não engenheiro, ou qualquer outro profissional que não domine o conhecimento e evolução tecnológica.
Só assim, conseguimos fortalecer a profissão na sociedade. A capacidade está cá dentro, o reconhecimento vem de fora. Temos de aproveitar o momento, vivemos tempos de engenharia, o que significa uma oportunidade única para conseguirmos esse fortalecimento.

A expressividade da votação aumenta o grau de exigência sobre o papel da Ordem?
Claro, essa é a missão da Ordem, contribuir para separar o trigo do joio, garantindo que a sociedade, sobretudo os mais frágeis, estão protegidos.

Praticamente um ano se passou sobre a adopção do pacto para a qualidade e valorização do trabalho dos engenheiros. Que balanço faz desta medida?
O Pacto OERN é uma das nossas marcas, quisemos juntar empresas, que se comprometem com a Ordem profissional a serem exemplo de políticas laborais e a prosseguirem os objectivos colectivos que temos de vencer.
É de adesão voluntária, mas permite-nos medir e dar a conhecer e evolução do valor trabalho, assente na remuneração, qualidade dos contratos de trabalhos, desenvolvimento de competências, igualdade de género, contratação de recém-licenciados e regressos de engenheiros portugueses a trabalhar no estrangeiro, por exemplo.
Hoje, sabemos que no primeiro semestre de 2024 os salários subiram, as empresas aderentes conseguiram trazer mais de 50 engenheiros portugueses que estavam fora do país para trabalhar em Portugal, que melhoramos a qualidade dos contratos, que muitos dos recém-formados ficaram em Portugal ao revés que de os perdermos enquanto motores da nossa competitividade.
E em breve teremos os indicadores do segundo semestre de 2024.

Qual será o sentido de evolução deste pacto, além de, naturalmente, um aumento das empresas aderentes?
O caminho natural é esse, apenas de aumento do número de empresas aderentes, hoje já contamos com 36 empresas e com mais manifestações de interesse na subscrição. Mas vamos querer dar mais um passo.
Vamos, em conjunto com as empresas, preparar um Pacto OERN 2.0, em que a OERN vai abrir mais as suas portas, responder a requisitos de formação, acesso a canais específicos de comunicação com os membros, e trabalharmos com as empresas objectivos mais concretos na qualidade e valorização do trabalho, por exemplo.
Haverá também o tempo dos engenheiros a quem queremos incentivar a lançarem os seus próprios projectos empresariais.

De que forma a instabilidade política pode impactar o sector da engenharia e a sua evolução?
Não antevejo consequências graves no sector da engenharia, nem na sua evolução. No País sim, haverá consequências, atrasos, menos tempo para se executarem os projetos críticos para o país, e por vezes, menos tempo pode significar menos qualidade, ou seja, quem irá perder somos todos coletivamente.
A Engenharia vive um momento único de afirmação da sua capacidade e conhecimento, e precisa de consumidores finais, ou clientes, que se comprometam com a qualidade e não com a busca do valor mais baixo de compra dos serviços.

Há preocupações sobre possíveis atrasos ou cortes em investimentos estratégicos para o país?
Devemos todos estar preocupados com os atrasos, cortes, ou reprogramações dos investimentos estratégicos. O País vive uma crise profunda em matérias de engenharia: habitação, mobilidade urbana, mobilidade interurbana, digitalização, gestão da água, dos resíduos, por exemplo, e o denominador comum são os Engenheiros.
E estas crises acontecem porque nos últimos anos estas matérias foram esquecidas e foram o parente pobre das decisões políticas.

Como a Ordem pode influenciar a criação de políticas públicas que garantam estabilidade e previsibilidade para os engenheiros?
Com Engenheiros nas decisões. Recomendando que as decisões políticas sejam revestidas de dimensão técnica, desde o processo de identificação da necessidade e solução até à execução.
O nosso grande activo é o território, onde todas as decisões devem ser ponderadas, reflectidas, decididas e executadas e ainda nos falta definirmos uma estratégia consolidada de país, que se desagregue nas suas várias dimensões (regiões, municípios, bairro, rua) e especialidades.
Nos últimos anos temos assistido a sobressaltos sobre a necessidade de simplificação e agilização de alteração nas regras territoriais, o acontecerem é um sinal da não concretização e da imaturidade do nosso sistema de gestão territorial.
Na região Norte vamos aproveitar as eleições autárquicas para discutir os vários programas eleitorais nas matérias que nos dizem respeito, envolvendo os próprios candidatos e os engenheiros da região e de cada cidade. Manifestando já a nossa disponibilidade para sermos um stakeholder activo, mas também para reforçar a democracia com a engenharia.

Como explica o aumento do número de concursos públicos vazios na área da engenharia?
Pelo contexto que vivemos, vontade de se executar associada ao desinvestimento nos últimos anos de reforço destas competências a nível nacional, o que faz com que os concorrentes escolham, e bem, os concursos a que concorrem.
Deixando para trás os menos exigentes, os que valorizam a decisão com base no preço, ou que por si partam com requisitos e pressupostos onde o compromisso não é a qualidade e o rigor.

O que pode ser feito para garantir que os cadernos de encargos sejam mais realistas e atractivos para os profissionais, neste caso ao nível da engenharia?
A Ordem dos Engenheiros já há muito que defende novas especialidades no processo construtivo, sobretudo ao nível da definição de custos, quase como se de um projecto integrador se tratasse. Para que o dono de obra tenha uma definição rigorosa dos custos do seu projecto, ou na definição do modelo de valor das prestações de serviço.
Por outro lado, devemos ser exigentes com a qualificação dos profissionais garantindo que em função da complexidade dos projectos, sejam exigidos técnicos com as competências adequadas para garantir o rigor da execução.
Temos procurado incentivar esta cultura da exigência com entidades públicas que recorrem à Ordem dos Engenheiros – Região Norte, não só nos processos de elaboração dos cadernos de encargos, mas também nas acções de recrutamento dos Engenheiros. C

Sobre o autorRicardo Batista

Ricardo Batista

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