Conhecer para Proteger: A Importância da Avaliação da Vulnerabilidade Sísmica das Construções
Ao definir requisitos claros para a avaliação da vulnerabilidade sísmica, esta legislação torna obrigatória a caracterização estrutural com base na inspeção e o diagnóstico de edifícios, promovendo uma abordagem preventiva. A implementação da portaria trouxe também como um impacto indireto a necessidade de formação de técnicos mais especializados com competências na área da engenharia sísmica
A vulnerabilidade sísmica de edifícios é um tema muito atual e crítico para Portugal, onde o potencial de abalos sísmicos é considerável, especialmente em zonas como Lisboa, Algarve ou Açores. No entanto, nem sempre se dá a devida atenção à segurança estrutural, apesar do impacto devastador que um sismo de elevada magnitude pode ter na vida das pessoas, economia e sociedade. Neste contexto, a Portaria 302/2019, de 12 de setembro, surge como um passo essencial para a promoção de uma cultura de segurança em edifícios existentes, ao estabelecer os requisitos para a elaboração do Relatório de Avaliação da Vulnerabilidade Sísmica (RAVS).
Sem dúvida que se tornou a oportunidade de melhorar a segurança sísmica das nossos edifícios e cidades, onde a inspeção e diagnóstico estrutural é fundamental para dar as ferramentas corretas para a definição de uma intervenção proporcionada às reais necessidades de reforço sísmico de um parque edificado.
A Inspeção e Diagnóstico: O Primeiro Passo para a Avaliação da Vulnerabilidade Sísmica
A inspeção e diagnóstico estrutural é um processo detalhado e rigoroso que permite reunir informações sobre as características estruturais e construtivas da construção, a sua localização, os materiais utilizados e a sua capacidade de suportar ações sísmicas. Na prática, esta fase inclui uma análise visual da estrutura, a recolha de dados sobre a sua evolução histórica do edifício e intervenções passadas, bem como a identificação de eventuais anomalias que possam comprometer a segurança e identificação das potenciais causas que originaram essas anomalias.
São avaliados e caracterizados diferentes componentes estruturais do edifício (paredes, pilares, vigas, pavimentos, fundações, etc…). As ações realizadas no local podem incluir ensaios tendencialmente não destrutivos, que permitem obter informações sem danificar a estrutura, aumentando a confiança no edifício e na análise estrutural do comportamento sísmico. Quanto mais completa for esta informação, menores serão as incertezas sobre a estrutura e seu comportamento, tendo a qualidade dos resultados um impacto direto nos resultados obtidos na fase seguinte.
Toda esta informação é depois analisada em fase de avaliação da vulnerabilidade sísmica, um trabalho muito especializado, especialmente no caso de estruturas existentes de alvenaria e madeira onde a utilização das ferramentas e meios técnicos adequados possibilitam explorar ao máximo a capacidade das construções.
Em vários casos em que estivemos envolvidos, identificou-se que uma maior dedicação nesta fase inicial de inspeção e diagnóstico, com a recolha de informação de diversas fontes (históricas, documentais, in-situ) e análises detalhadas, se poderá refletir em intervenções de reforço sísmico mais minimalistas.
Com base na avaliação de vulnerabilidade sísmica, é possível até categorizar os edifícios de acordo com o seu nível de vulnerabilidade e criar um plano de intervenção, que pode incluir reforços estruturais, substituição de materiais degradados, ou até a demolição e reconstrução de partes da estrutura.
Também é possível através de algumas medidas pontuais nos edifícios prolongar a vida útil dos mesmos, preparando-os para se comportarem de uma forma mais satisfatória para sismos de moderada intensidade, diminuindo os possíveis custos de reparação e tornando-os operacionais mais rapidamente num cenário pós-sismo.
O objetivo deverá ser sempre reduzir o risco para níveis aceitáveis, assegurando que o edifício possa resistir a uma ação sísmica de uma determinada intensidade, o que feito numa fase inicial após aquisição de um edifício pode otimizar a intervenção de reabilitação.
Necessidade do RAVS: Fomentar uma Cultura de Prevenção e Segurança
A apresentação do RAVS (através da portaria 302/2019) veio formalizar um processo que é essencial para a segurança sísmica dos edifícios em Portugal. Ao definir requisitos claros para a avaliação da vulnerabilidade sísmica, esta legislação torna obrigatória a caracterização estrutural com base na inspeção e o diagnóstico de edifícios, promovendo uma abordagem preventiva. A implementação da portaria trouxe também como um impacto indireto a necessidade de formação de técnicos mais especializados com competências na área da engenharia sísmica.
Neste âmbito, o NCREP tem contribuído de diversas formas, como em ações de formação nesta temática (quer junto das ordens profissionais, quer no âmbito do programa ReSist da C.M.Lisboa onde é membro do conselho técnico-científico), ou realizando consultoria especializada em avaliação da vulnerabilidade sísmica de estruturas existentes a várias entidades ou mesmo a empresas de projeto.
É premente a mobilização e motivação para esta temática de todas as partes envolvidas num processo de reabilitação, onde a importância de sensibilizar também proprietários e gestores de edifícios para a necessidade de investir em intervenções preventivas é fundamental. Uma cultura de segurança sísmica requer um esforço coletivo, onde cada interveniente – Estado, autarquias, técnicos e cidadãos – compreenda e valorize a importância da avaliação de vulnerabilidade sísmica e o reforço sísmico das nossas construções.
A Necessidade de um Compromisso Nacional para Edifícios Mais Seguros
Apesar do avanço importante com a implementação da fase do RAVS, é essencial que o compromisso com a segurança sísmica vá além da legislação, envolvendo também políticas de incentivo e programas de apoio que facilitem a implementação de melhorias estruturais que permitam responder às necessidades dos edifícios.
Num país onde os sismos fazem parte da nossa história, um compromisso nacional para a prevenção, mitigação e garantia de segurança sísmica é essencial. Só assim será possível reduzir o risco sísmico e criar cidades mais resilientes, capazes de suportar os desafios que a natureza nos coloca.
NOTA: O autor escreve segundo o Novo Acordo Ortográfico