Imobiliário: 2024 traz mais incerteza
2023 foi um ano de abrandamento no investimento imobiliário nacional, influenciado pelas incertezas políticas, económicas e de estabilidade. Assistimos a quedas acentuadas no segmento de Escritórios, com o Retalho e a Hotelaria a salvarem o ano. Com 11 meses e meio pela frente, será 2024 diferente? A visão das consultoras imobiliárias varia entre o optimismo moderado e o ligeiro pessimismo, deixando antever um 2024 cauteloso, pelo menos na primeira metade do ano, surpresas só mais lá para a frente
Manuela Sousa Guerreiro
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2023 foi um ano desafiante para o imobiliário nacional, com forte quebra na actividade de investimento. As várias consultoras imobiliárias já publicaram os números finais do ano que, no geral, não diferem muito nas suas conclusões. Segundo a Cushman&Wakfield a actividade de investimento imobiliário comercial, incluindo o comercial acabado e de rendimento, “registou um abrandamento ao longo de 2023, com as previsões de fecho de ano a situarem-se nos 1.730 milhões de euros, representando uma quebra homóloga expressiva de 42% face ao ano anterior”. As previsões da JLL não estão muito longe, apontando para valores entre os 1.800 e os 2.000 milhões de euros transaccionados, traduzindo-se numa quebra anual de 45%.
“Os últimos três anos mostraram-nos que não há dados adquiridos. Depois de uma pandemia inédita e do começo de um novo conflito armado na Europa, 2023 foi um ano de grandes desafios a todos os níveis. As economias abrandaram, a instabilidade política é hoje um risco generalizado e, tudo isso se desenvolveu tendo como pano de fundo uma inflação que não foi controlada como se previa e taxas de juro que cresceram além do que era expectável”, comenta Patrícia Barão, head of residential da JLL.
Ambas as consultoras imobiliárias destacam, pela positiva, o crescimento da quota de mercado dos investidores nacionais, dada a menor disponibilidade do capital estrangeiro, que, refere a Cushman, situa-se nos 31% do volume total de investido em 2023.
Na repartição geográfica do investimento “Lisboa captou 26% do investimento, Porto 17% e o Algarve 20%, muito devido ao enorme dinamismo do sector hoteleiro”, segundo os números da CBRE.
Escritórios com pior performance, Hotelaria e Retalho em crescimento
Entre os segmentos com pior performance o destaque vai desde logo para os Escritórios, que comparam com “um extraordinário 2022”. Na grande Lisboa foram transaccionados perto de 88 000 m2, o segundo valor mais baixo da última década, registando-se, de acordo com a Cushman&Wakefield, uma quebra homóloga de 66% de ocupação (os números apresentados pela JLL apontam para 100 000m2 de ocupação e uma redução de 60% face ao ano transacto). Vários factores contribuíram para esta queda, com o abrandamento da procura, por conta da conjuntura económica, e o impacto do trabalho híbrido no top da lista.
O mercado do Grande Porto mostrou ser mais resiliente tendo registado até Novembro uma ligeira quebra homóloga da absorção de 6%.
Pelo lado positivo destacam-se a Hotelaria e o Retalho “os sectores estrela”, em 2023, assim nomeados pela CBRE. Em 2023 Portugal viu consolidada a recuperação da actividade turística com um aumento transversal de todos os indicadores, inclusive para valores superiores ao verificados em 2019. Em termos de oferta Hoteleira, segundo os dados apresentados pela Cushman&Wakefield, o ano passado foram inauguradas mais de 50 novas unidades com 3300 quartos, (a JLL contabilizou 61 novas aberturas) encontrando-se em fase de projecto e/ou construção mais de 100 novos projectos hoteleiros, que totalizam 10.200 quartos, que deverão inaugurar ao longo dos próximos 3 anos.
Segundo a JLL a “recuperação do turismo e o aumento do consumo privado teve um impacto positivo quer na ocupação quer no investimento em imobiliário de retalho”, com todos segmentos de retalho a evidenciarem um forte dinamismo.
2023 também foi um ano positivo para a Indústria & Logística, graças aos diversos negócios de grande dimensão, mas a forte perspectiva de crescimento continuou condicionada pela falta de oferta adequada.
Na Habitação, não obstante o aumento dos custos de financiamento, continua a persistir um forte desequilíbrio entre a procura, que permanece alta, e a falta de oferta. Com uma média anual de 13500 fogos concluídos na última década a comparar com vendas médias anuais na ordem das 104500 unidades, significa que são vendidas 8 casas por cada 1 que é construída. Assim, em 2023 a JLL estima que as vendas de habitação devam ficar na ordem dos 27.000 milhões de euros, montante que decresce 16% face a 2022.
E agora o que poderemos esperar de 2024?
Colocámos a questão às várias consultoras e as respostas foram, de certa forma, unanimes em especial no que que diz respeito à manutenção de um quadro de incerteza e à cautela que investidores terão, pelo menos durante a primeira metade do ano. “2024 será, tal como 2023, um ano desafiante embora se preveja uma melhoria das condições macroeconómicas na segunda metade do ano o que poderá trazer investimento institucional cativo para o mercado assim como o maior alinhamento das expectativas entre vendedores e compradores”, resume ao CONSTRUIR Gonçalo Santos, head of Capital Markets na JLL Portugal.
A perspectiva que o aumento das taxas de referência dos bancos centrais tenha atingido o seu pico em 2023, contribui para uma expectativa mais optimista, ainda que os seus efeitos não sejam sentidos nos primeiros meses de 2024, o que se poderá traduzir “em comportamentos distintos durante este ano, com o primeiro semestre a reflectir ainda contracção em alguns indicadores, particularmente nos sectores mais afectados em 2023, seguido de uma segunda metade do ano com uma retoma gradual generalizada”, comenta Eric van Leuven o director geral da Cushman&Wakefield.
Neste contexto, continuará Portugal a ter a mesma atractividade para os investidores estrangeiros? O responsável da Cushman&Wakefield é peremptório: “Infelizmente Portugal está a caminho de perder atractividade para os investidores internacionais, não pelos indicadores do imobiliário propriamente dito (a qualidade dos edifícios é boa, as rentabilidades são atractivas e não existe excesso de oferta nem falta de procura por parte das empresas), mas pelo contexto político e regulatório”. Segundo Eric van Leuven “as constantes alterações fiscais e legais, quase sempre no sentido oposto dos interesses dos investidores, bem como os sucessivos casos e casinhos que levaram à actual crise política, e com grande incógnita sobre o resultado das eleições de 10 de Março, fazem com que o investidor institucional, que preza a estabilidade e a previsibilidade acima de tudo, olhe para o nosso país com mais desconfiança”, defende.
Os restantes especialistas ouvidos pelo CONSTRUIR preferem centrar a sua análise antes nos “argumentos” ditados pelo mercado imobiliário e estão, no que se refere à atractividade do país, mais optimistas. “Portugal não perdeu atractividade em termos internacionais uma vez que é país, pela sua performance e oportunidades, bem posicionado no radar do investimento estrangeiro. Se virmos os dados históricos o investimento internacional nos últimos 10 anos em Portugal tem sido de cerca de 80% tendo em 2023 sido de cerca de 70% resultante da contracção do investimento em termos globais e da ausência de grandes transacções (usualmente protagonizadas por capital estrangeiro)”, defende Gonçalo Santos. Para Nuno Nunes senior director de capital markets da CBRE Portugal, “continua a existir a percepção que os fundamentais do mercado são muito fortes, nomeadamente o nível de robustez da procura de inquilinos/take-up e o desequilíbrio entre a procura de imóveis modernos e a capacidade do mercado para os produzir, tornando o mercado português muito atractivo”, inúmera.
Os segmentos “estrelas” de 2024
“Em 2024 as estratégias dos investidores passarão, certamente, pela diversificação das suas carteiras de forma a equilibrar o seu nível de exposição”, adianta Alexandra Gomes. Para a head of research da Savills Portugal, “o sector residencial continuará a assumir um papel preponderante em termos de opções de investimento ao qual se juntam segmentos alternativos como sejam as residências de estudantes e o senior living acompanhando desta forma as tendências demográficas que se verificam no país e que abrem caminho ao desenvolvimento deste tipo de activos em Portugal”.
Nota positiva na avaliação das consultoras recebem os segmentos da Hotelaria e do Retalho, este último impulsionado pelo interesse renovado por parte dos investidores. “Ambos os sectores têm conjugado uma boa performance operacional e uma elevada liquidez no mercado de investimento. Existem já mais de 1 bilião de euros de operações no pipeline de investimento, no conjunto destes sectores, que estão já ou irão estar no mercado durante o primeiro trimestre”, justifica o senior director de capital markets da CBRE Portugal.
Em alta nas expectativas dos consultores está também o segmento de Indústria & Logística “com potencial para ser um sector estrela uma vez que estão a vir a mercado activos logísticos de elevada qualidade e elegíveis enquanto produto de investimento”, sublinha por sua vez Gonçalo Santos, head of Capital Markets na JLL Portugal
Já para os Escritórios, um segmento fortemente penalizado em 2023, a incerteza mantém-se não se prevendo o regresso dos escritórios como sector privilegiado de investimento durante 2024, ainda que este possa a voltar a estar na mira dos investidores “quando realizarem que o ‘regresso ao escritório’ é um problema muito menos gravoso em Portugal do que em países anglo-saxónicos, e que existem boas oportunidades de compra a preços mais atractivos do que nos últimos anos”, defende Eric van Leuven. O responsável da Cushman&Wakefield em Portugal considera ainda que “devemos assistir em 2024 a investimentos importantes no sector de centros de dados”.