“Um escritório novo, feito de coisas velhas”
Localizado nuns antigos armazéns da Cooperativa de Palmela, os Escritórios Zircom configuram um projecto de reabilitação de património industrial e um projecto de reutilização de materiais provenientes de demolições
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Economia Circular e reutilização de materiais são conceitos que têm sido amplamente falados no sector da construção e que começam a dar os primeiros passos, mostrando que a ideia, para além de muito válida ao nível patrimonial, ambiental, cultural e social, pode ser o ponto de partida para soluções que se distinguem. Reutilizar materiais, numa sociedade em que se observa uma cultura de desperdício, integrando-os em novos projectos de arquitectura, foi o conceito que norteou o gabinete de arquitectura de Pedro Marques Alves no desenvolvimento do projecto para os Escritórios Zircom, uma empresa de demolições, que tem armazenado um conjunto de materiais recolhidos dessa mesma actividade – não fosse o sector da construção um dos grandes responsáveis pela produção de resíduos.
Localizado nuns antigos armazéns da Cooperativa de Palmela, os Escritórios Zircom configuram um projecto de reabilitação de património industrial e um projecto-piloto de teste de reutilização de materiais provenientes de demolições, tais como madeiras, portas, elementos metálicos (escadas e guardas) e tijolos, entre outros. Segundo Pedro Marques Alves, “a introdução de novos materiais foi feita em contraste com os materiais existentes, e, os elementos estruturais e infra-estruturas foram mantidos à vista para reforçar o carácter industrial do edifício”.
“Evidência incontornável”
Para Pedro Marques Alves, assim que conheceu o cliente (Zircom), a disponibilidade destes materiais foi uma “evidência incontrolável”. “Se da parte da Zircom havia, e há, um desejo de lhes dar um futuro com valor acrescentado, da nossa parte houve desde logo uma empatia com esse princípio e com o potencial decorrente da qualidade destes materiais”, conta Pedro Alves ao CONSTRUIR. “Tratam-se de materiais que apesar das décadas (em alguns casos séculos) ao serviço de outros edifícios, e apesar das marcas superficiais (riscos, buracos de pregos, etc.) mantêm uma excelente qualidade estrutural”, sublinha.
Pedro Alves acrescenta ainda que “no essencial, o edifício e os materiais disponíveis constituíam ‘ingredientes’ interessantes para o projecto, e coube ao projecto e ao processo de obra testar e garantir que a sua aplicação servia a qualidade e a organização espacial pretendida”.
O “projecto-piloto”, como Pedro Alves o denominou, levou a que a equipa assumisse que “os desenhos não estavam fechados, mas sim em constante evolução”. Isto porque, explica, “perante a disponibilidade e escolha dos materiais, pequenas alterações iam tendo lugar e oportunidade de serem testadas”. “Foi possível testar as vantagens das diferentes formas de armazenamento, as diferentes formas de tratar os elementos recuperados antes da aplicação, as diferentes aplicações e fixações, a incorporação de outros elementos, e, o potencial das soluções. Neste projecto foi possível testar e até ‘errar’. Quer dos sucessos, quer dos ‘erros’, decorre a noção de que o potencial de reutilização destes materiais é enorme e tem um enorme número de possíveis aplicações”.
Naturalmente, os grandes desafios do projecto estiveram relacionados com o uso de materiais que já tiveram um primeiro ciclo de vida, nomeadamente a madeira, o principal “ingrediente usado”. Mas esse foi também o aspecto inovador, uma vez que “o efeito da sua história [do material] – como buracos de pregos, riscos, entalhes ou tratamentos químicos -, faz parte da sua imagem” e importou “o recurso a uma paleta de materiais sóbria na qual a madeira pôde assumir o destaque”, bem como “um desenho capaz de incorporar as particularidades de cada peça de madeira sem deixar de assumir a contemporaneidade da intervenção”.
Medidas e preocupações ecológicas
As preocupações ao nível ambiental não se esgotaram na reutilização de materiais e na adopção de uma Economia Circular. Pedro Alves explica que, “para melhorar passivamente o comportamento térmico do edifício, ao nível da fachada foram aplicados novos caixilhos e, os elementos de betão revestidos a cortiça”.
O arquitecto refere também que, outro aspecto deste conjunto de preocupações prende-se com a construção de um escritório “aberto” a diferentes ocupações. “Onde o acesso directo às infra-estruturas e uma organização espacial ‘desierarquizada’ permite a sua rápida adaptação a diferentes tipos e ritmos de trabalho, reduzindo potenciais esforços e desperdícios numa futura nova transformação”.
“Os clientes foram parte integrante das soluções”
Pedro Alves confidencia ao CONSTRUIR que, os clientes foram “igualmente responsáveis pela execução da obra”, uma vez que, “conhecendo na íntegra todo o processo, do esquisso à construção, são também parte integrante das soluções que se foram moldando”. Rita Moura, engenheira e administradora da Zircom, confirma o sucesso do resultado final: “Mais que um conjunto de adjectivos, há que referir o conforto de trabalhar num espaço singular. Conforto que advém de uma envolvente com presença, onde uma porta ou o revestimento de uma parede são mais do que isso, têm o carácter próprio de materiais que já foram vividos. A cumplicidade com o espaço é grande, não só por estarmos presentes em todo o processo, mas também porque reflecte o orgulho numa concretização: ‘finalmente, e sim, é possível fazer desta forma!’, mais, todos os que aqui habitam gostam do espaço e sentem-se bem por aqui”.