Marcelo Rebelo de Sousa promulgou o Diploma que permite a alguns engenheiros assinar projectos de arquitectura, alegando que, “o novo diploma restringe substancialmente o âmbito de aplicação da excepção transitória”, limitando-a aos engenheiros que “tenham subscrito projectos que tenham merecido aprovação municipal” antes de 01/11/2017.
Dias antes desta promulgação, e após a Assembleia da República ter voltado a votar a favor da mesma, o CONSTRUIR foi ouvir do presidente da Ordem dos Arquitectos, José Manuel Pedreirinho, que estratégias foram delineadas para que o fim não tivesse sido este
O que é que correu mal nesta última votação? Que informação não está a passar para que exista um entendimento político?
José Manuel Pedreirinho: Há uma pressão junto da Assembleia da República, por parte de grupos, que faz com que haja este tipo de resultados entre os deputados.
Repare, a grande diferença entre a primeira e a segunda votação na Assembleia da República teve que ver com a posição do Partido Comunista – que se tinha abstido na primeira. De resto, a primeira votação tinha um partido que vota em uníssono, que era o partido que tinha apresentado a proposta, o PSD, e que voltou a votar com disciplina de voto. Todos os outros partidos se dividiram, o que mostra que este é, de facto, um tema fracturante.
Também sabemos que grande parte dos engenheiros que fizeram maior pressão estão, na grande maioria, localizados no Interior do País ou estão ligados a pequenas empresas que fazem topografia, construção, projecto de arquitectura, de engenharia, de instalações eléctricas…fazem tudo.
Partindo do princípio que esta falta de entendimento político parte de um lobby, como é que se dá a volta a isso? Que estratégias tem a Ordem dos Arquitectos pensadas para o efeito?
Aquilo que temos delineado e pensado é que deveria haver uma razoabilidade na forma de tratar e pensar este assunto.
A estratégia da Ordem dos Arquitectos assenta então na esperança de que Marcelo Rebelo de Sousa volte a vetar a alteração à lei?
Não, mas achamos que não vale a pena pressionarmos novamente. Sabemos que o Presidente da República está informado e perfeitamente dentro do assunto, embora não saibamos qual vai ser a sua posição perante esta proposta, mas também não nos parece que vá transformar isto numa guerra de resultados mais graves do que o próprio caso representa.
Existem duas situações que podem parecer contraditórias: é evidente que não vamos aceitar isto passivamente, até porque é claro para nós que o que existe é uma questão de interesses de um grupo restrito de pessoas que está a prejudicar um grupo grande de pessoas que somos todos nós, mas, embora isso choque muitas pessoas, neste momento estamos confrontados com um Órgão soberano como a Assembleia da República…
Na reacção à votação, houve quem tivesse apontado o dedo à Ordem dos Arquitectos. Sente que a Ordem falhou em algum momento?
Há sempre grupos de reacção e nós sabemos que há um grupo de colegas que gosta de dizer que a Ordem falhou. Estão no direito de o dizer e eu percebo que as pessoas, os colegas e todos nós se sintam incomodados e aborrecidos por achar que isto tudo é um disparate sem pés nem cabeça, agora, era bom que tentássemos, nós arquitectos – que achamos que há uma falta de razoabilidade por parte de outros – manter alguma dignidade. Tenho imensa pena de ainda não ter ouvido uma única proposta sobre o que deveríamos fazer, já que há gente a referir o que é que não fizemos, ou o que acham que não fizemos, porque não divulgámos todos os procedimentos por razões de estratégia ou por opção. Mas posso-lhe garantir que será difícil dizerem alguma coisa que nós não tenhamos feito.
Falta corporativismo nos arquitectos?
Prefiro colocar as reacções ao nível do desabafo. Temos Assembleias Gerais, Assembleias de Delegados, temos todos os Órgãos que devíamos ter a funcionar, portanto, as pessoas têm muitas maneiras de se manifestarem dentro dos Órgãos da Ordem. Não temos ouvido grandes protestos, temos ouvido muitos desabafos e sobretudo não temos ouvido propostas alternativas.
Há alguma mensagem que queira deixar aos arquitectos que nos leem e que neste momento aguardam com expectativa os próximos passos?
O Peter Zumthor disse recentemente em entrevista que sobre o futuro sabia muito pouco. Eu sobre o futuro também não sei muita coisa. Contudo, é evidente que não vamos descurar este assunto, mas também é evidente que temos noção que a relação de forças políticas passa por termos perdido esta batalha, embora não tenhamos perdido a guerra. Vamos continuar activos, mas custa-me ver neste momento muitas saídas para a não promulgação deste Diploma, embora achemos que há aspectos que são inconstitucionais e estamos a estudar de que forma podemos usar esses argumentos.