O engenho que poderá revolucionar a construção de pontes de betão
Desenvolvido na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), por Pedro Pacheco, professor de Pontes e Estruturas desta instituição de ensino e presidente do BERD, o OPS é um sistema no qual as forças aplicadas são automaticamente ajustada
Pedro Cristino
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Desenvolvido na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), por Pedro Pacheco, professor de Pontes e Estruturas desta instituição de ensino e presidente do BERD, o OPS é um sistema no qual as forças aplicadas são automaticamente ajustadas às cargas actuantes, através de um sistema de controlo, de forma a reduzir deformações e minimizar tensões. “O sistema OPS é um músculo artificial. É um sistema de cabos, ligados a macacos hidráulicos e a um sistema de controlo activo computorizado, que, exactamente como os músculos do corpo humano, reage a estímulos, mediante as informações que recebe”, referiu Pedro Pacheco ao Construir. Como são recolhidas então essas informações que levam o sistema a reagir? “Há sensores no cimbre, que medem a flecha, a deformação vertical a meio vão, e, quando existe um pouco de flecha, estes sensores detectam-na, passam a informação ao computador que faz os macacos esticarem os cabos de forma a compensar a deformação”, explica o engenheiro. A implementação do sistema de controlo compreende a integração da viga de lançamento, da extremidade passiva, dos sensores, dos cabos não aderentes, do actuador e do quadro principal e da ancoragem orgânica.
Cabos de pré-esforço
Em cada viga estão instalados dois cabos de pré-esforço, localizados em planos verticais exteriores às vigas caixão. O pré-esforço, com uma configuração tri-linear é ancorado junto às secções de apoio, sendo desviado por duas “escoras de desvio” nos terços do vão. Cada cabo de pré-esforço é materializado por um conjunto de 12 monocordões.
A peça de extremidade activa é uma viga que permite que, com apenas um cilindro hidráulico (actuador), se tensione simultaneamente os dois conjuntos de cordões de pré-esforço. A ancoragem dos cabos é realizada por intermédio de “cabeças de ancoragem” que recebem as extrusões colocadas nas extremidades dos monocordões. A extremidade passiva é também uma viga metálica, fixa à estrutura, que permite a ancoragem dos cabos de pré-esforço através da utilização de “cabeças de ancoragem”.
Escoras e selas de desvio
As escoras de desvio são perfis tubulares rectangulares, cuja finalidade consiste em desviar os cabos de pré-esforço e na transmissão da força de desvio para a estrutura metálica. As selas de desvio são peças que se localizam na parte inferior das escoras de desvio e visam desviar o cabo de pré-esforço, sem ferir as bainhas dos cordões. Para atender a este efeito, as superfícies de contacto das selas com os monocordões encontram-se revestidas com politetrafluoretileno (PTFE). Para permitir a recolha dos cabos, as selas encontram-se dotadas de um sistema de abertura que possibilita uma constante adaptação da sua posição e, deste modo, um funcionamento compatível com a rigidez dos cordões.
Actuadores OPS
Os actuadores, ou seja, cilindros hidráulicos, são semelhantes aos utilizados noutras aplicações de engenharia civil. Por questões de segurança, o seu curso está limitado fisicamente, através de válvulas de pressão e o software de controlo bloqueia actuações ascendentes. No caso de avaria do actuador, na fase de carga, dois fusos e respectivas fêmeas retêm fisicamente a viga de ancoragem, impedindo a diminuição da força dos cabos de pré-esforço.
Sistema de sensorização
A flecha a meio vão é medida por transdutores de pressão. Para esse efeito é colocado um reservatório num ponto fixo, próximo de um pilar, e colocados sensores de pressão, distribuídos ao longo do cimbre, ligados por um circuito de fluído. Através de alterações da pressão hidrostática determina-se a variação da flecha do cimbre.
Sistema de automação e controlo
O software de controlo é operado em PLC, existindo consolas de interface, com as quais o operador do sistema escolhe o modo operacional pretendido em função da fase da obra. Na consola táctil, o operador é constantemente informado do estado do sistema, mostrando-se, entre outras grandezas, a flecha de cada viga e também avisos ou alarmes, caso existam.
A FEUP na génese
O sistema começou a ser desenvolvido na FEUP, como conceito teórico, passando depois para um conceito numérico. Nesse âmbito, foram feitas simulações a computador para apurar os resultados. Daí, passou a modelo laboratorial. “Fizemos um modelo reduzido de um cimbre com 14 metros na faculdade”, declara Pedro Pacheco revelando que foi esta a primeira vez em que viram este sistema a trabalhar. “Foi engraçado, porque carregámos a estrutura e ela ficou toda deformada, e voltámos a carregar a mesma estrutura com o OPS e ela ficou na mesma”. Os resultados foram, segundo este professor universitário, “perceptíveis a olho nu”. Mais tarde foi feita uma aplicação piloto na faculdade. “Um produto destes continua com uma margem de progressão enorme”, afirma, adiantando que a primeira aplicação teve lugar há cinco anos. “Neste momento estamos a fazer as primeiras aplicações em países nórdicos, com características térmicas muito diferentes”, o que influencia o comportamento do sistema, na medida em que algumas das suas componentes poderão ficar congeladas. Nesse sentido, torna-se necessário desenvolver sistemas para “compensar as temperaturas muito baixas”.
O estudo da anatomia
A primeira inspiração para esta ideia surgiu a Pedro Pacheco aquando da última aula do professor Joaquim Sarmento, galardoado com o prémio Leonardo da Vinci, “um engenheiro notável”, ressalva. “A última aula que deu, referiu-se ao funcionamento das palmeiras em termos estruturais”, e fez um estudo sobre esse tema que fascinou Pedro Pacheco e inspirou-o para a sua tese de mestrado intitulada “Soluções da Natureza para Problemas Estruturais”, para a qual fez um estudo “generalista, pouco profundo”, sobre conchas, teias de aranha, ossos e músculos. “Isto é a solução de vanguarda da engenharia de estruturas”, afirmou Pedro Pacheco, ao deparar-se com o músculo. Esta revelação levou o actual presidente do BERD a focar-se nos músculos para desenvolver a sua tese de doutoramento, “Pré-esforço Orgânico: um Exemplo de Sistema Efector, o que, no fundo, quer dizer músculo artifical”. Para tal, este engenheiro estudou anatomia durante mais de um ano e também biomecânica. “Estive no Teatro Anatómico a ver cadáveres, estive a observar profundamente como o músculo funcionava, e reparei que era espectacular, incrível”, confessa Pedro Pacheco, que, a partir daí, tirou “ilações para a engenharia de pontes”, tendo começado a fazer modelos numéricos para avaliar a possibilidade da aplicação destes elementos “em várias estruturas de engenharia civil”, o que levou a “resultados interessantes”. “Em algumas estruturas é impressionantemente vantajoso”, esclarece, revelando que a “aplicação em cimbres” foi uma das que se apresentou como solução mais interessante.
Distinção
Esta ideia começou a ser apresentada em congressos, onde eram expressas reacções “muito diferentes”. Apesar de alguns detractores – “a primeira vez que apareci com slides do corpo humano num congresso de estruturas, houve gargalhadas na sala” – houve pessoas “que demonstraram um grande interesse” e incentivaram “imenso” o trabalho deste engenheiro. Pelo meio, esta investigação valeu o prémio da Federação Internacional do Betão (FIB) a Pedro Pacheco, o que “foi muito importante, porque, nós, os portugueses, temos muitos complexos e dificuldade de afirmação”. “Nesse sentido, estou convencido que, para conseguir meios para levar a investigação adiante, para conseguir fazer modelos e arranjar apoio privado, este prémio internacional, que deve ser das maiores distinções existentes para doutoramentos a nível da engenharia de estruturas, ajudou muito, alavancou todo o processo”, esclarece este responsável.