Fotografia: Tiago Casanova
“Por vezes a nossa função enquanto arquitectos não é inventar, mas reinventar”
Em entrevista ao CONSTRUIR, Samuel Gonçalves e Bruno Teixeira explicam as especificidades do Sistema Gomos
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Distinguido recentemente com o Prémio Internacional Red Dot: Design Concept, na categoria “Habitat”, a Summary soma e segue na missão de mostrar que qualidade e pré-fabricação andam de mãos dadas e que respondem aos desafios actuais da sociedade contemporânea. Em entrevista ao CONSTRUIR, Samuel Gonçalves, fundador da Summary e Bruno Teixeira, administrador da FARCIMAR – empresa que está responsável pela produção, comercialização e engenharia do Sistema Gomos –
falam sobre as particularidades dos sistemas que desenvolvem. Samuel Gonçalves revela ainda que, entre os projectos que o gabinete está a trabalhar, se encontram um novo sistema construtivo baseado em estruturas de andaime e um projecto para a recuperação duma floresta ardida em Arouca, que incorpora “estratégias de desenho defensivo” de forma a reduzir a probabilidade de novos incêndios.
Como se encontra o equilíbrio entre o pragmatismo e o experimentalismo?
Samuel Gonçalves: Esse equilíbrio não é propriamente uma escolha, é o que, querendo ou não, define o nosso trabalho no dia a dia. Por um lado assumimos uma atitude experimental, marcada por uma vontade de criar soluções novas, mas ao mesmo tempo fazemo-lo com um pragmatismo brutal. Todos os dias levamos o “soco” da realidade, todos os dias trabalhamos com contenção de custos, com optimização de recursos e com prazos apertados. Ou seja, o nosso experimentalismo está ligado directamente a uma abordagem muito realista e nada utópica.
Existe ainda outro elemento que contribuiu para este equilíbrio: o facto dos nossos projectos serem acompanhados por equipas de especialistas em diferentes áreas desde o primeiro momento e o facto de trabalharmos em parceria com empresas muito experientes, que nos ajudam a passar da ideia à realidade, do desenho à prototipagem. No caso do projecto premiado, “Gomos Building System”, trabalhamos em parceria com a FARCIMAR S.A., que tem o seu departamento de inovação constantemente focado no melhoramento deste sistema e na validação técnica das nossas ideias.
Referem no vosso website que, um dos desafios que a sociedade contemporânea coloca à arquitectura é a necessidade de processos de construção mais simples e céleres. Que outros desafios encontram que as soluções Summary consigam responder?
Samuel Gonçalves: Para além desses, outro desafio que está constantemente presente nos nossos trabalhos é a optimização de recursos físicos. Preocupamo-nos com a redução de custos associados aos nossos projectos, assim como com a utilização de recursos locais, que reduzam desperdícios (de materiais, de transportes e de energia a utilizar nos processos construtivos).
Na Bienal de Veneza, a vossa proposta utilizava infra-estruturas de serviços básicos para uma estrutura de arquitectura aberta. Este “reinventar” é uma necessidade da arquitectura contemporânea?
Samuel Gonçalves: Sim, sem dúvida. A exposição que levamos à Bienal de Veneza mostra isso mesmo – por vezes a nossa função enquanto arquitectos não é inventar, mas antes reinventar, reinterpretar soluções já existentes. O Sistema Gomos é uma reinterpretação do típico sistema de manilhas de betão, tradicionalmente usado nas redes de drenagem de esgotos. Claro que os Gomos têm tudo o que é necessário para fazer dele um sistema habitável (isolamento térmico, acabamentos e instalações de electricidade e de água). Mas em termos construtivos, o tipo de encaixe e o tipo de montagem é semelhante aos sistemas de canalizações em betão. Esta abordagem – não desenvolver do zero mas sim partindo de sistemas já existentes e adaptando-os – permite acelerar os processos de desenvolvimento e de prototipagem e passar as soluções do papel para o terreno com mais rapidez.
O Sistema Gomos recebeu recentemente um Prémio Internacional – o Red Dot -, o que é que o diferencia?
Samuel Gonçalves: Acredito que o motivo que levou à atribuição do prémio se centra no facto deste sistema construtivo ter um enquadramento num contexto de “emergência arquitectónica” que se faz sentir à escala global. Quando falo em “emergência arquitectónica” refiro-me a dois níveis diferentes: 1- emergência extrema: nos próximos 15 anos, a população mundial a que vive em cidades aumentará em cerca de 70%, de 3 biliões para 5 biliões de pessoas. Esta é a primeira vez que um crescimento populacional desta escala vai ocorrer num intervalo temporal tão curto. Trata-se, portanto, de um momento histórico sem precedentes. Neste contexto, é essencial que a arquitectura desenvolva soluções capazes de dar resposta à necessidade de construir com a rapidez que esta situação exige. 2 – emergência induzida: existe uma crescente necessidade de imediatismo por parte de uma sociedade global e acelerada, habituada à eficiência de produtos e serviços que encontra em marcas como IKEA, UBER ou AirBNB.
Estes dois novos cenários, aparentemente sem relação, têm um factor em comum. Ambos apelam a um crescente pragmatismo e ambos colocam o mesmo desafio à arquitectura: optimização de tempo e de recursos físicos. Estes são os pontos-chave do Sistema Gomos e de todo o trabalho que desenvolvemos na SUMMARY.
Como é a aceitação da construção pré-fabricada em Portugal?
Samuel Gonçalves: Está em crescendo, embora exista ainda algum preconceito ligado à pré-fabricação. É curioso perceber que estas soluções são produzidas em fábrica, sob condições altamente controladas, em que a probabilidade de erro é infinitamente menor quando comparadas com a construção tradicional e, ainda assim, muitas pessoas associam os pré-fabricados a soluções pouco duráveis, fracas tecnicamente. Factualmente, esta percepção não corresponde à verdade. Julgo que isto não é mais que uma questão cultural. Contudo, é um problema com décadas, que se discute já desde a primeira grande guerra, em que a necessidade de reerguer rapidamente cidades europeias estava dependente de soluções pré-fabricadas. Mesmo aí, nesse contexto de emergência, houve movimentos de grupos alargados de população que diziam que a pré-fabricação colocava em causa a sua identidade ou o seu ideal de casa.
Quais os grandes desafios e por onde passa o futuro da pré-fabricação?
Samuel Gonçalves: Apontaria três pontos essenciais: Um deles será certamente aquele que apontámos anteriormente – conseguir conviver bem com o grande público, conseguir gerar uma aceitação generalizada e reduzir o preconceito associado a este tipo de soluções; Outro será o equilíbrio entre standardização e customização, ou seja, teremos de desenvolver soluções que sejam suficientemente standard para que as suas linhas de produção possam ser seriadas, mas ao mesmo tempo suficientemente flexíveis para que os utilizadores possam fazer alterações tipológicas e adaptadas às suas necessidades específicas; E apontaria ainda a compatibilização entre estes sistemas pré-fabricados e os métodos tradicionais de construção; julgo que estes dois universos não têm de representar pólos opostos e devem encontrar formas de trabalhar de forma complementar. Se por um lado é importante uma reposta à rapidez de construção que é necessária à escala global, que só os sistemas pré-fabricados e modulares podem dar, também é importante preservar alguns métodos de construção tradicional, cuja eliminação representaria uma catástrofe para pequenas economias locais que estão muito dependentes da construção.
Em Vale de Cambra, criaram um programa que inclui unidades de habitação. O que vos foi pedido e de que forma a vossas soluções responderam aos problemas?
Samuel Gonçalves: O programa deste edifício inclui várias unidades de habitação colectiva e espaços de serviço multifuncionais. As exigências por parte do cliente eram claras e estavam definidas desde o primeiro momento: a construção teria de ser rápida, económica e modificável ao logo do tempo, consoante as diferentes necessidades que pudessem surgir.
A estratégia de projecto é bastante simples: 2 programas diferentes são colocados em 2 pisos diferentes. O rés-do-chão é ocupado com os espaços de serviço multifuncionais, em contacto directo com a via pública; o piso superior destina-se às unidades de habitação. Cria-se um acesso independente para cada um destes programas tendo em conta os usos diversos colocados a níveis diferentes, tirando partido da inclinação natural do terreno.
O rés-do-chão é composto por painéis estruturais pré-fabricados em todo o seu perímetro. Tendo em consideração as exigências da encomenda, os espaços de serviço multifuncionais são concebidos de forma absolutamente flexível, sendo possível adicionar futuramente novos compartimentos ou fazer com que todo o piso funcione como um grande open-space. Os utilizadores farão o seu próprio espaço, de acordo com o programa a desempenhar no momento.
O piso superior é integralmente composto por módulos do Sistema Gomos. Considerando que a área máxima a construir legalmente permitida era muito limitada, o espaço vazio exigido é utilizado como separador das várias unidades de habitação. Concebido e licenciado como um projecto de habitação colectiva, com estas separações o projecto incorpora as principais vantagens da habitação individualizada: entradas claramente individualizadas e uma completa separação acústica entre as diferentes unidades.
Em que projectos estão actualmente a trabalhar?
Samuel Gonçalves: Neste momento estamos a desenvolver um novo sistema construtivo baseado em estruturas de andaime. Temos ainda em curso vários projectos que têm como base o Sistema Gomos, como um centro de incubação e inovação industrial e um projecto que mistura turismo e habitação. Mais recentemente iniciámos um novo projecto para a recuperação duma floresta ardida em Arouca, incorporando “estratégias de desenho defensivo” de forma a reduzir a probabilidade de novos incêndios naquela área e a garantir uma intervenção rápida e eficaz caso estes aconteçam.
Quais os grandes desafios técnicos que o materializar de um sistema como o Gomos trouxe à Farcimar?
Bruno Teixeira: O Sistema Gomos é o resultado de um projecto de I&D cujos objectivos eram a obtenção de um sistema de construção modular diferenciador, de rápida execução e onde o betão fosse o material base. Este processo foi assim uma oportunidade para a Farcimar desenvolver um produto / solução dirigido à construção de Edifícios (residenciais ou não residenciais) partindo dos seus mais de 25 anos de experiência na área dos pré-fabricados de betão, até então com uma gama de produtos e soluções dirigidas especialmente para as obras de engenharia e de Infra-estruturas.
O Sistema Gomos foi o primeiro produto / solução que a Farcimar lançou cujo projecto de I&D, além de uma forte componente técnica na área da Engenharia Civil, teve também a Arquitectura e o Design como especialidades centrais.
Embora o Sistema Gomos tenha desafiado e alargado mesmo os limites do conhecimento técnico da Farcimar nesta sua área de especialização, dos pré-fabricados de betão, consideramos que os maiores desafios técnicos ainda estão para chegar por via das exigências dos projectos e solicitações futuras.
Na sua opinião, que mais-valias os sistemas pré-fabricados aportam quando comparados com a construção tradicional?
Bruno Teixeira: As mais-valias reconhecidas aos sistemas pré-fabricados e referindo-me em particular aos sistemas / soluções pré-fabricados em betão são, e destacaria como principais, a maior qualidade e por conseguinte maior durabilidade, que advém do maior controlo associado à sua produção em fábrica; maior rapidez de execução e de entrada em serviço, logo redução de custos; melhoria das condições de trabalho e de segurança em obra face à rapidez e simplicidade dos processos de montagem. Pré-fabricados de Betão versus construção tradicional: Melhor, mais rápido e seguro.
Ao nível da inovação técnica, por onde passa o futuro da pré-fabricação de betão?
Bruno Teixeira: O futuro da pré-fabricação em betão é algo em que acreditamos muito e isso não só pelo que de inovador se venha a desenvolver nesta área, mas muito pela crescente valorização por parte do mercado, das características que já são hoje reconhecidas ao betão e que fazem dele o produto de construção número um no mundo.
Mas ao nível da inovação técnica o futuro da pré-fabricação de betão passará, do nosso ponto de vista, por exemplo, pela redução de espessuras dos elementos pré-fabricados através da utilização de betões de alta resistência reforçados com materiais alternativos ao aço.
Além disso é evidente que todas as inovações ao nível da melhoria das características do betão sejam do seu comportamento mecânico, térmico, acústico ou outro, vão influenciar muito a evolução do sector dos pré-fabricados de betão, pois alargarão significativamente o leque de utilizações dos produtos e soluções em pré-fabricados de betão.
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