“Há um conjunto vasto de projectos estratégicos para Angola”
Ao Construir, o presidente da APPC, Vítor Carneiro, realça que é “consensual que a dependência de mercados externos únicos, ou quase únicos, é contraproducente” e é para “evitar ou reverter essa situação” que as empresas têm trabalhado
Pedro Cristino
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Para o presidente da Associação Portuguesa de Projectistas e Consultores, a situação a economia angolana actualmente vive não deverá ser particularizada. “O problema é bem mais abrangente”, sublinha Vítor Carneiro, referindo que esta situação afecta os países dependentes da exploração de recursos energéticos, como petróleo ou carvão. Todavia, relativamente ao mercado de Angola, o responsável da APPC frisa que, para as empresas ligadas à consultoria em engenharia e arquitectura, “a situação é particularmente complexa”
Ao Construir, o presidente da APPC, Vítor Carneiro, realça que é “consensual que a dependência de mercados externos únicos, ou quase únicos, é contraproducente” e é para “evitar ou reverter essa situação” que as empresas têm trabalhado.
Quais são os principais desafios que os associados da APPC enfrentam, de momento, no mercado angolano?
Não desvalorizando a delicadeza da situação, entendemos não dever particularizar o mercado angolano. O problema é bem mais abrangente, afetando os países cuja capacidade de financiamento depende da exploração de recursos energéticos, como sejam o petróleo, gás e carvão. Trata-se de Angola, mas também da Argélia, do Brasil, de Moçambique, da Venezuela e de alguns outros países para os quais as empresas do setor exportam e que se incluem na mesma categoria de dependência das cotações das matérias-primas energéticas.
A verdade é que a drástica e repentina redução das cotações destas matérias-primas vieram colocar um novo padrão na economia mundial e tem-se vindo a observar sucessivas reduções em baixa das expectativas de crescimento dos países em desenvolvimento. Compare-se as projeções atuais com as de há 2 anos e veja-se a enorme diferença.
Para as empresas portuguesas do setor da consultoria, em particular as ligadas à consultoria em engenharia e arquitetura, a situação é particularmente complexa. Após uma redução do mercado interno superior a 50% ocorrida entre 2010 e 2015, com a inerente degradação das condições de contratação, as empresas orientaram-se para o mercado internacional, exportando mais de 60% da sua atividade. Naturalmente que Angola é o principal mercado, mercê da sua própria dinâmica de investimento e capacidade de financiamento das operações. Alterando-se esta situação, evidentemente que as empresas vão ter de se adaptar, por forma a não ficarem tão dependentes do mercado angolano e de outros mercados com idênticas características.
Que medidas poderão adotar as empresas deste sector de forma a minimizarem os impactos negativos da crise angolana?
É consensual que a dependência de mercados externos únicos ou quase únicos é contraproducente e as empresas trabalham para evitar ou reverter essa situação. A APPC sabe que têm tentado entrar, ou reforçar presença, em novas geografias, sendo que a dúvida reside em saber se esse processo de diversificação já se traduz em volume de atividade. A APPC não consegue, por ora, ter dados relevantes a esse propósito.
Tenhamos também noção de que o investimento em Angola não parou. Há um conjunto vasto de projetos considerados estratégicos pelo Governo de Angola, sobretudo em infraestruturas de diversa índole, que não pararam e tudo indica que não vão parar.
Por outro lado, as empresas conhecem bem os mecanismos de suporte ao investimento e ao desenvolvimento com apoio internacional, sobretudo das multilaterais financeiras como o Banco Mundial e o Banco Africano de Desenvolvimento e as associadas à cooperação com a União Europeia (Fundo Europeu para o Desenvolvimento), bem como algumas cooperações bilaterais particularmente ativas, como por exemplo a cooperação dos EUA, da Alemanha e da França.
As empresas associadas na APPC conhecem bem estes mecanismos de financiamento, muitas delas acompanham este mercado das multilaterais desde há pelo menos 30 anos e sabem que este é um “mercado” que não é afetado pela emergência de crises de pagamentos dos países. Trata-se de um mercado porventura menos rentável mas mais seguro, e que apresenta oportunidades interessantes também noutras geografias.
Claro está que a minimização dos impactos negativos também dependerá muito da estratégia e posicionamento das empresas, não sendo irrelevante os seus projetos de localização nos mercados.
Como vêem o pedido de ajuda ao FMI? Poderá a entrada do FMI significar um impulso à diversificação da economia do país?
Em primeiro lugar, é importante realçar que se trata de um assunto da esfera de competência do Governo de Angola. A decisão de acionar o pedido de ajuda está seguramente baseada numa cuidada avaliação da situação e manifesta certamente uma vontade de maior controlo sobre as finanças públicas e a determinação de empreender reformas económicas. O desígnio de diversificação da economia, vem sendo perseguido desde há muito, embora com resultados insuficientes já que, como se vê, a economia continua muito dependente do petróleo.
Em termos gerais, dir-se-á que a intervenção do FMI acabará por racionalizar o investimento público, dando segurança às operações que prosseguirem.
A eventual diversificação da economia de Angola poderá originar mais oportunidades para os vossos associados?
A prazo, sem dúvida que a diversificação da economia, na aceção de melhoria da qualidade de vida das populações e de crescimento económico, reduzindo a dependência do setor petrolífero, ampliará e diversificará as oportunidades no país.
Trata-se portanto de uma inevitável e boa aposta do país.
Tudo tem os seus tempos, sendo que a atual dinâmica de investimento tem estado muito centrada na construção e reconstrução de infraestruturas, cujas necessidades tenderão a reduzir-se a prazo.
Mesmo perante o cenário de crise, em Angola, dados os problemas com divisas e cancelamento de projetos, existem oportunidades para a fileira da construção no país, atualmente?
Certamente que existem essas oportunidades, sendo certo que as empresas têm de olhar para todo o ciclo do projeto, incluindo portanto a necessidade de assegurar que há condições para serem pagas nos momentos corretos.
Aguardemos pela racionalização do investimento público que o Governo terá de fazer. A partir daí será mais fácil (re)definir a estratégia de abordagem do mercado.
Preocupante é também o elevado montante de serviços já prestados e que permanecem por liquidar. Esperemos que seja dada prioridade à regularização dessas operações.